Marcos Magalhães*
Poucos dias antes da troca de comando no Ministério de Minas e Energia, uma estranha preocupação crescia no Palácio do Planalto. Apesar de freqüentes advertências sobre os riscos de desabastecimento de energia elétrica nos próximos anos, ninguém ali parecia ver com bons olhos o lançamento de uma ampla campanha nacional pela redução do consumo de energia. E por quê? Para evitar quaisquer comparações com o apagão de 2001, quando o PSDB estava no poder e o PT fez a festa na oposição.
O Brasil tem ainda um enorme potencial de energia hidrelétrica a explorar. Limpa e renovável. Dispõe de regiões onde os ventos são fartos e constantes. Conta também com uma posição singular no mundo no que diz respeito à possibilidade de geração da chamada bioenergia, ou seja, energia produzida a partir de insumos como palha e bagaço de cana. Sem falar nas promessas de grandes campos de gás natural situados na plataforma continental, próximas do recém-anunciado megacampo de petróleo Tupi, na bacia de Santos.
A natureza, como demonstram todas essas promessas, tem sido generosa com o Brasil. Mas todas essas fontes potenciais de energia para o futuro próximo do país têm algo em comum: demandam tempo e grandes investimentos. Além de toda uma tramitação legal e burocrática para o licenciamento de novos empreendimentos, como se pode verificar nos recentes episódios de construção de novas hidrelétricas.
O atual governo até pode dar sorte. As chuvas podem se tornar mais freqüentes neste início de 2008, ajudando a encher os reservatórios das usinas espalhadas pelo país e a esvaziar os riscos de um novo apagão. Pode ainda haver um bom entendimento com a Bolívia, que evite novos riscos de redução do suprimento de gás natural ao Brasil – gás que seria necessário no caso de menor produção de energia hidrelétrica. Pode até conseguir reduzir o prazo para o início da produção de gás em novas áreas da plataforma continental.
Mesmo que tudo dê certo, e é mesmo possível que ocorra isso, o país permanecerá em uma espécie de fronteira entre o abastecimento e o desabastecimento. Até porque a economia tende a continuar crescendo, apesar da crise nos Estados Unidos. E novos investimentos na produção terão de ser acompanhados pela ampliação da oferta de energia. Ou seja, um novo apagão pode mesmo não acontecer nos próximos três anos, como tem repetido o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas será que seu sucessor poderá dizer o mesmo?
É cada vez mais freqüente no cenário internacional o comentário de que acabou o tempo da energia farta e barata. O Brasil tem grandes vantagens comparativas, tanto por suas recém-descobertas reservas de petróleo e gás quanto, principalmente, pelo vasto potencial de energia renovável. Mesmo assim, o momento exige cautela. Vários países do mundo têm apostado em programas de redução do uso de energia. O Brasil deveria fazer o mesmo. Deixar de lado esse esforço apenas por temor de que uma campanha pela redução do consumo levantaria a suspeita de um novo apagão – com as conseqüências políticas dessa suspeita – seria uma enorme prova de imaturidade política.
No tempo do apagão, as famílias e as empresas perceberam que podiam, sim, economizar energia. O simples gesto de trocar lâmpadas tradicionais por lâmpadas fluorescentes, como todos vimos, tem reflexo imediato na conta de luz. Um consumidor consciente pode, sim, prestar mais atenção aos selos do Procel, que classificam diversos produtos eletrodomésticos segundo o consumo de energia.
Se os produtos mais econômicos ainda são mais caros, mesmo assim há o que fazer. O governo poderia submeter ao Congresso Nacional uma proposta de redução dos impostos sobre produtos que comprovadamente utilizem menos energia. Assim como poderia ampliar os estímulos fiscais a fontes alternativas de energia, como a eólica e a solar. Aquecedores solares mais baratos poderiam estimular milhões de consumidores a deixar desligados seus chuveiros elétricos, responsáveis por boa parte do consumo doméstico de energia.
Medidas como essas teriam chance de receber o apoio do governo e da oposição. A permanente disputa política entre PT e PSDB poderia abrir espaço, como ocorre nos Estados Unidos, a iniciativas pontuais e consensuais de interesse de todo o país. Deixar de lançar uma campanha de redução do uso de energia, por outro lado, soa como uma demonstração de subdesenvolvimento político.
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