Logo chegaremos ao final do primeiro trimestre de 2016 e, com mais um passo, a política nacional será tomada pelos acordos entre as legendas e o lançamento de candidaturas às prefeituras de todo o país. Sobretudo nas capitais, a disputa visará o crescimento partidário, bem como servirá de alavanca para 2018, novas pautas no cenário que se arrasta, de investigações sobre corrupção na Petrobras e sonegação fiscal contra a Receita Federal, queda acentuada da economia e inflação acima da meta estabelecida.
Dispersa nesse cenário, a maioria dos partidos pouco produzirá, certamente, para um olhar crítico acerca da reforma urbana, das contradições do modelo econômico vigente, seu desenho fiscal, suas linhas industriais e a sustentabilidade das cidades, seja do ponto de vista ambiental ou da mobilidade urbana. Invadidas por uma massa cada vez maior de carros novos, desde a farra da redução do IPI para os automóveis e o financiamento facilitado aos consumidores, as capitais e cidades metropolitanas estão hoje literalmente atropeladas. Tanto pelos veículos privados sobre quatro rodas quanto pela praga dos gafanhotos de duas rodas, motocicletas de baixa cilindrada, as nefastas “cinquentinhas”, tão irresponsavelmente incentivadas em suas linhas de montagem, com renúncias fiscais estaduais e municipais, quanto cada dia mais letais e onerosas aos dispêndios do SUS nas emergências hospitalares, com os acidentes que provocam em todo o país.
Apesar disso, não se redireciona o modelo de transporte e mobilidade para as cidades. O que se vê é a legalização pura e simples daqueles veículos, como se um mal menor (vê-los rodando, emplacados, com motoristas habilitados e com equipamentos de proteção) fosse o bastante para que evitássemos o mal maior (supremacia do privado nos modais de transporte urbanos, esgotamento progressivo da mobilidade e elevada taxa de mutilações e mortes provocadas por esses veículos nas vias públicas).
Vejo, apesar disso, ainda assim, que a centralidade da disputa eleitoral municipal certamente ampliará o desfoque, aos olhos da sociedade, do universo maior da economia, das estratégias de “ajuste” das contas públicas, defendidas para que o velho modelo permaneça como guardião dos ganhos dos “investidores”, blindados de todo tipo de risco pelo superávit primário eterno, ainda que menor que aquele aplicado após a posse de Lula em 2003 (4,25% do PIB). Inquieta-nos até quando haverá nuvens espessas e escuras sobre essa questão. Até quando as respostas às mobilizações em defesa de um mandato legitimamente eleito virão empacotadas por mais austeridade fiscal? Até quando conviveremos com tímidos apelos de membros da própria base do governo no Congresso Nacional pela redução da taxa de juros?
O ajuste de mais longo prazo ora anunciado atrasará, ainda mais, a ruptura com o atual modelo, prejudicando a implantação dos novos pilares macroeconômicos e um equilíbrio das contas públicas de outro sentido, a favor das reformas estruturais – como a tributária, progressiva e direta, a reforma do sistema financeiro, sanguessuga da poupança da sociedade com os juros comerciais, de cartões e cheques especiais, além da reforma urbana, entre outras. Por isso, não haverá caminhos para assegurarmos a supremacia do interesse público na economia e nas finanças nacionais se persistir a contradição entre a defesa democrática de um mandato e de um projeto e a negação desse projeto, na prática, pelos caminhos e respostas econômicas escolhidos pelo governo.
Quando será iniciada a reconstrução de toda a arquitetura da política monetária, o desmonte da farsa do IPCA cheio na análise da inflação, a implosão da Pesquisa Focus, ração de expectativas do mercado para a dieta do Banco Central? Quando tudo isso será anunciado transparentemente, às claras, com todas as letras e números, além do fim da ditadura que impõe a concepção da inflação de demanda, contra a qual só haveria redução com altas taxas de juros? Por isso se impõe transparência no que se disser à sociedade, coragem no chamamento à mobilização, tal e qual se fez para assegurar a vitória de Dilma em 2014. Por que não? Antes que seja tarde.
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