A discussão da reforma política vem sendo travada no Brasil há mais de 20 anos. O tema apareceu e desapareceu do noticiário e dos debates parlamentares nos mandatos dos últimos cinco presidentes (Sarney, Collor, Itamar, FHC e Lula). Na verdade, os ciclos de maior visibilidade desse debate costumaram coincidir com os momentos de crise vividos pelos diferentes governos.
A reforma política é normalmente entendida como a revisão da legislação sobre o sistema de governo, o sistema eleitoral e o sistema partidário. Os seus defensores costumam descrevê-la como “a mãe de todas as reformas”, uma espécie de pré-requisito para a necessária modernização institucional do país. Por seu turno, os seus críticos têm por hábito denunciá-la como uma estéril “cortina de fumaça”, que desperdiçaria energias que poderiam ser dedicadas ao avanço de reformas mais importantes.
Mas o fato é que, a despeito das polêmicas, as instituições políticas brasileiras vêm demonstrando uma notável estabilidade histórica. As duas últimas décadas ao menos serviram para criar um consenso básico de que regras fundamentais como o sistema presidencialista de governo, o federalismo e o multipartidarismo estão aí para ficar.
Além disso, a evidência empírica disponível simplesmente não corrobora a hipótese de que uma ampla reforma institucional seria necessária para dar mais governabilidade ao sistema político. As instituições políticas claramente não têm sido um obstáculo à modernização das instituições econômicas. Ao contrário, sucessivos governos não tiveram problemas em aprovar no Congresso uma grande quantidade de reformas econômicas que tornaram a economia brasileira mais aberta e competitiva do que no passado.
No entanto, também é verdade que o avanço das reformas econômicas no país freqüentemente parece caminhar mais lentamente do que seria desejável, especialmente num contexto de integração econômica global. Mas este fato não parece estar relacionado às instituições políticas em si mesmas, e sim à difusão incompleta da visão de mundo capitalista na população em geral e na classe política em particular.
Um segundo – e ao meu ver mais grave – aspecto problemático do sistema político brasileiro está relacionado aos baixos níveis de popularidade dos políticos, dos partidos e do Congresso, conforme mensurado pelas pesquisas de opinião pública. Esse fato revela um distanciamento das instituições políticas em relação aos interesses e opiniões reais de parcelas importantes da população.
Os maiores problemas do sistema político brasileiro podem, portanto, não estar relacionados a um suposto e não comprovado déficit de governabilidade. Na verdade, eles parecem estar mais relacionados, por um lado, a um déficit de representatividade (no que diz respeito ao distanciamento entre eleitores e eleitos) e, por outro lado, à permanência de valores culturais estatizantes e anticapitalistas (que reduzem a adesão a reformas pró-mercado).
Nessa perspectiva, o alcance real de uma reforma política provavelmente estaria limitado apenas ao primeiro desses problemas. Isso significa reconhecer que regras e instituições políticas (ou econômicas) – quaisquer que sejam elas – não são capazes de afetar valores culturais pré-estabelecidos. Seja qual for a reforma política que o Brasil vier a implementar no futuro, ela não modificará a nossa capacidade de formulação e de apoio a reformas econômicas orientadas para o mercado – bem inferior à de outros países emergentes. E uma reforma política também em nada influenciaria as taxas de crescimento do PIB ou o desempenho de setores econômicos específicos.
Os atuais escândalos no Congresso apenas comprovam que o distanciamento entre os representantes eleitos e os cidadãos comuns é uma das principais causas dos baixos níveis de popularidade da classe política em geral. Mas quais reformas das regras eleitorais e partidárias poderiam ser as respostas corretas para corrigir as distorções que comprometem a representatividade do sistema político brasileiro? Na próxima semana, apresentarei a minha pauta pessoal para a reforma política.
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