Apesar de a
Câmara não ter divulgado o repasse dos computadores, diversos deputados
transformaram em ato político a entrega das máquinas inutilizadas pela Casa a
entidades beneficentes. Alguns deles noticiaram as doações em suas páginas na
internet e em sites locais. Procurados pelo Congresso em Foco,
eles foram unânimes em dizer que a doação não tem qualquer conotação eleitoral
basicamente por dois motivos: não pediram voto e a campanha só começa em julho.
“Ninguém está fazendo campanha. O período eleitoral só começa em
julho”, disse o deputado João Campos (PSDB-GO). “Seria campanha se estivesse
vinculado a comício e houvesse pedido de voto”, acrescentou.
Segundo ele, apesar de as máquinas terem sido repassadas por
indicação dos parlamentares, a doação foi institucional. “A Câmara somos nós.
Não é uma instituição metafísica”, afirmou. O tucano diz que divulgou em seu
site por entender que a publicidade dos atos é pressuposto da atividade
parlamentar e não pode ser vista com conotação eleitoral.
“Daqui a
pouco, político não poderá mais ser político. Se você consegue uma verba para
uma prefeitura, não pode nem ir lá para anunciar. Então não vamos ter mais
democracia”, ressaltou o parlamentar.
O deputado goiano distribuiu
os computadores repassados pela Câmara à Fundação Pestalozzi, dos municípios de
Águas Lindas e Bela Vista, à Associação das Viúvas Evangélicas do Brasil, em
Anápolis, à Associação das Donas de Casa, ao Conselho Tutelar de Goiânia, à
Associação dos Deficientes, Surdos e Mudos de Goiás e à prefeitura de Águas
Lindas, segundo sua assessoria.
Papai
Noel
A doação dos computadores tem ao menos dois registros
na página de João Campos na internet. “Papai Noel João Campos doa 14
computadores para diversas entidades”, destaca
o site, ao chamar para uma galeria de fotos da entrega das máquinas à Federação
Goiana das Pestalozzi no dia 21 de dezembro de 2009. A doação feita em Águas
Lindas, cidade do Entorno do Distrito Federal, foi
publicada há duas semanas, no último dia 25 de
março.
“Está tudo dentro do exercício do
mandato. Se eu, como parlamentar, não puder ir à inauguração de uma entidade e
entregar um bem público, então os governadores não poderão inaugurar obras”,
afirmou, ao ressaltar que não há nenhuma restrição da lei eleitoral sobre o
assunto.
“Tipo de emenda”
O
deputado Paes de Lira (PTC-SP) diz que a doação dos computadores é uma forma a
mais de o parlamentar exercer o mandato. Na avaliação dele, o repasse dos
computadores deve ser equiparado às emendas parlamentares individuais, por meio
das quais o congressista direciona recursos para determinadas obras e ações
sociais. “Foi um tipo de emenda parlamentar”, comparou.
“O que
diríamos, então, das emendas parlamentares? Elas são individuais. É apenas uma
forma de exercer a atividade parlamentar sem toda aquela burocracia. É tudo
lícito, perfeitamente de conhecimento público. A atividade parlamentar tem esse
caráter de ajudar a municipalidade”, considerou.
Paes de Lira
descarta que as doações possam ser usadas de maneira eleitoral pelos
parlamentares. “Se disserem que tem influência, então tudo o que o deputado
fizer será visto como algo que tem interferência no processo eleitoral”,
declarou.
O parlamentar paulista diz que os oito computadores de
seu gabinete foram doados “com lastro no interesse social”. Paes de Lira
repassou um computador para a Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais
(Apae) de Jaú e os demais para as prefeituras de Bebedouro, Colina e Parapuã,
todas em São Paulo. As
doações foram publicadas na página dele na internet em dezembro do ano
passado.
Paes de Lira avalia que a Câmara não tinha
condições de fazer uma doação institucional e, por isso, optou por solicitar aos
deputados que indicassem as instituições beneficiadas. Segundo ele, o ofício
encaminhado aos gabinetes pela Primeira Secretaria deu publicidade ao ato. “Não
sei por que razão não houve divulgação. Esse ofício que nós recebemos é aberto,
é de conhecimento público”, declarou.
O deputado faz coro ao
colega João Campos ao lembrar que o período eleitoral só começa
oficialmente em julho, após as convenções partidárias. “Propaganda eleitoral é
pedir voto, é só a partir de julho. É preciso haver uma visão crítica, mas o
deputado não está aqui para se esconder no gabinete. Tem de ir aos estados para
que as pessoas possam avaliar seu trabalho.”
“Campanha se
faz na rua”
O deputado Beto Albuquerque (PSB-RS) diz que
não pediu à Câmara para fazer a doação. Mas, diante do ofício enviado pela
Primeira Secretaria aos gabinetes, decidiu indicar a União das Associações de
Moradores de Passo Fundo (RS), que promove cursos de capacitação para pessoas
sem acesso à internet. “É uma política pública de acesso à internet”, afirmou,
por meio de sua assessoria.
A
doação dos computadores pelo deputado foi anunciada na página da prefeitura de
Passo Fundo no último dia 1º de março, quando Beto participou da inauguração do
laboratório de informática com o prefeito do município.
Segundo
o deputado, é inconcebível fazer qualquer ilação entre as doações e as eleições.
“Campanha eleitoral se faz na rua, e não distribuindo computadores para quem
precisa. Estaria fazendo campanha se tivesse entregando computador para cabo
eleitoral”, afirmou. “Só não tive voto em três dos 467 municípios gaúchos.
Qualquer município em que eu doasse, diriam que fiz campanha”,
emendou.
Regulamentação engavetada
Ao
mesmo tempo em que pede ajuda aos deputados para se desfazer das máquinas, a
Câmara engaveta uma proposta que regulamenta justamente a doação de computadores
por órgãos públicos. Está parado desde outubro de 2008 na Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ) o Projeto de Lei 7076/06, proposto na Comissão de
Legislação Participativa pelo Núcleo de Resistência Comunitária, organização
não-governamental com sede no município de Belford Roxo (RJ).
O
texto já foi aprovado pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço
Público e autoriza a doação de computadores por “órgãos da administração pública
direta e indireta, os fundos especiais e demais entidades controladas pela
União”. O projeto prevê ampla divulgação do processo de seleção das entidades
beneficiadas no site do órgão responsável pela doação, bem como dos bens de
informática colocados à disposição. Ainda de acordo com a proposta, os pedidos
deverão ser encaminhados diretamente pelas instituições que pretendem ser
atendidas.
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