Então ficamos assim: Dilma Rousseff desistiu de convencer os cidadãos conscientes e politizados de que mereça continuar presidente da República, passando a direcionar seu discurso para os indivíduos despolitizados e suscetíveis de se deixarem iludir pela demagogia rasteira.
Mas, claro, a penúria para a qual deu enorme contribuição é um considerável empecilho. Papo furado não bota pão na mesa. E quando falta pão, poucos se satisfazem com embromação.
Ela protesta inocência, mas sua culpa é imensa: assumiu a Presidência quando os cenários econômicos mundiais começavam a se tornar desfavoráveis para o Brasil e quis porque quis exumar o vetusto nacional-desenvolvimentismo da década de 1950, tentando fazer a economia deslanchar graças a perdulários estímulos estatais.
Como a História só se repete em farsa, o resultado foi péssimo: retração dos investimentos, perda de competitividade, evolução incipiente (e depois negativa) do PIB, tendência inflacionária só mitigada pela queda de poder aquisitivo dos consumidores.
Resumindo: quebrou a cara e engatilhou uma forte recessão para o quadriênio 2015/18.
Aí bateu o desespero e ela mandou seus valores esquerdistas às urtigas, adotando a racionália do inimigo de classe.
Primeiramente, fez campanha à reeleição escondendo do povo a situação crítica da economia e a decisão já tomada de dar uma guinada de 180º à direita. Pelo contrário, acusou Marina Silva e Aécio Neves de pretenderem fazer o que ela já havia resolvido fazer. Ou seja, o compromisso dos revolucionários com a verdade virou pó de traque. E os trabalhadores que seu partido deveria representar foram tratados como otários.
Foi o estelionato eleitoral mais grotesco da política brasileira em todos os tempos, pior ainda do que quando a campanha de Eurico Gaspar Dutra atribuiu em 1945 a Eduardo Gomes uma afirmação que este jamais fizera, a de que não necessitaria dos “votos de marmiteiros [operários]”.
Tão logo foi empossada, Dilma jogou as bandeiras econômicas do PT no lixo e aderiu ao neoliberalismo de Milton Friedman, Ronald Reagan, Margaret Thatcher e Augusto Pinochet –tendo, ainda por cima, a implementá-lo um economista inexpressivo que o presidente do Bradesco, Luís Carlos Trabuco, indicou, depois de declinar o convite para pilotar ele próprio a barca furada.
Desde o primeiro momento alertei que jamais daria certo, pois um partido originário na esquerda não consegue governar com uma política econômica escrachadamente de direita.
Foi o que João Goulart aprendeu da maneira mais difícil: ele pretendia ir transformando o Brasil com as reformas de base (vide aqui), enquanto, em termos imediatos, mantinha diretrizes econômicas convencionais, aplicadas por ministros moderados como Carvalho Pinto e San Tiago Dantas. Mas, o fogo amigode Brizola e do PCB inviabilizou tal intenção e afugentou tais ministros, colocando o governo na rota da radicalização (que era tudo de que os golpistas precisavam para o sucesso da quartelada há tanto tramada…).
A História se repetiu: Joaquim Levy não conseguiu socar o ajuste fiscal goela dos brasileiros adentro e a situação econômica brasileira não cessa de piorar ao longo deste segundo governo de Dilma.
É difícil quantificar algo assim, mas o ziguezague de Dilma na condução da economia seguramente aumentou em milhões o número de desempregados, que seria considerável de qualquer forma, mas não tanto (uma pista: na comparação do quarto trimestre de 2014 com idêntico período de 2015, aumentou em 2,6 milhões o número de pessoas procurando emprego sem encontrar).
Por que considero Dilma pessoalmente responsável pelo desastre econômico?
Primeiramente, pela arrogância & ignorância com que tentou fazer a História retroceder mais de meio século, como se a globalização dos mercados não houvesse mudado a face da economia capitalista nesse meio tempo.
O delírio retrô de Dilma acabou resultando num formidável tiro pela culatra: o símbolo maior do nacionalismo dos anos 50, a Petrobrás, foi praticamente destruído sob sua tutela, como presidente do Conselho de Administração (2003/2010), ministra das Minas e Energia (2003/2005), chefe da Casa Civil (2005/2010) e presidente da República (desde 2011).
E, após suas diretrizes econômicas do primeiro mandato terem sido pulverizadas pela realidade, por ter tentado conciliar duas grandezas incompatíveis entre si. Deveria governar como petista no segundo mandato ou afastar-se do PT e buscar o apoio de tucanos e peemedebistas para seu ajuste fiscal. Não fez uma coisa nem outra, acabando por nos conduzir ao pior dos mundos possíveis.
O estelionato eleitoral que a reelegeu e o desastre econômico que protagonizou a fazem totalmente merecedora do impeachment ou cassação do seu mandato, pois o País não pode continuar paralisado como está há 15 meses e meio. Blablablá legalista não altera o fato de que nações não se suicidam, nas circunstâncias extremas fazem o necessário para sobreviver (justificativas legais sempre são encontráveis).
E, o principal: o povo sofredor não merece tamanho aumento dos seus tormentos, nem tem como aguentar isso por muito tempo mais.
Dilma jura inocência pessoal, como se fosse uma autista que ignorava todas as ilegalidades que ocorriam sob seu nariz e como se isto importasse alguma coisa em contraste com a devastação que causou. E os milhões de desempregados, eram culpados de alguma coisa?
Como revolucionário, estarei sempre ao lado dos coitadezas contra os poderosos. Tenho dedicado toda minha vida consciente à causa dos explorados, não à defesa de governantes omissos e incompetentes. Mantenho minha opção.
* Jornalista, escritor e ex-preso político. Edita o blogue Náufrago da Utopia.
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