Fábio Góis
O senador Pedro Simon (PMDB-RS) tem várias décadas de vida pública. Um dos fundadores de seu partido – o “velho MDB” –, gosta de mencionar passagens e curiosidades que envolvem nomes como o ex-deputado Ulysses Guimarães, o presidente da República que não assumiu Tancredo Neves e o ex-governador de São Paulo Mário Covas – todos ainda vivos como referências na luta pela democracia.
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Igualmente lembrado como defensor da causa democrática, Simon resiste. Mesmo já tendo dito estar cansado da política praticada hoje no Brasil (leia mais), continua os passos iniciados no início da década de 60, em Caxias do Sul, para ser escolhido, nesta 5ª edição do Prêmio Congresso em Foco, por jornalistas especializados em política como um dos parlamentares mais identificados com a defesa dos princípios democráticos (confira).
Antes de receber a honraria em solenidade realizada ontem (segunda, 22), em Brasília, o senador gaúcho concedeu uma breve entrevista ao site. Pode ter deixado de usufruir o show de encerramento do Prêmio que celebrou a atual legislatura e deu boas vindas à próxima, no remelexo baiano de Moraes Moreira, mas não perdeu a oportunidade de registrar o que acha da iniciativa.
“Falo com sinceridade: o Congresso em Foco é uma instituição emocionante. Porque é um punhado de jovens, sem patrimônio – cadê o capital de vocês? (risos). Nem capital de risco, a não ser o nome. É a dignidade de vocês que está sendo posta em jogo”, observou.
Simon pode parecer não muito confiante na práxis política que o rodeia atualmente. Mas, a julgar por uma de suas respostas (confira a íntegra da entrevista abaixo), deixa nas entrelinhas a impressão de que crê em novos tempos. “O internauta assumiu um papel espetacular, agora, na aprovação do Ficha Limpa. Era algo que não tinha condições, não passava. Na Câmara não passava, no Senado não passava – e, cá entre nós, na Justiça também não. Não passava pela cabeça de ninguém. No entanto, passou. Foram vocês, internautas, que falaram, que bateram, que gritaram”, declarou o senador, autor de projetos similares sobre inelegibilidade discutidos na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Todos relegados à gaveta legislativa.
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Confira os principais trechos da entrevista com Pedro Simon:
Congresso em Foco – O senhor foi eleito senador pela primeira vez em 1978, e é um dos mais longevos parlamentares em atividade. De lá pra cá, o Congresso piorou ou melhorou?
Pedro Simon – Tem uma frase tradicional do Dr. Ulysses, quando foram se queixar para ele: “Ulysses, o Congresso está muito ruim”! Ele respondeu: “espera só para ver como vem coisa pior”… Então, na verdade, isso tem sido uma realidade. Com o tempo… Me lembro que eu era um gurizinho e, logo que se instalou a democracia, em 1946, grandes juristas, professores, intelectuais, gente de algo gabarito fazia questão de se candidatar. Com o tempo, isso foi diminuindo. Nessa última eleição,eu passei vergonha. Eu só recebi não para candidato a deputado federal e estadual no Rio Grande do Sul, pelo PMDB. Cada vez mais pessoas se sentem até ofendidas quando são convidadas a se candidatar. Eu acho que, se nós conseguirmos – e o [Projeto] Ficha Limpa já foi um início – começarmos aquilo a que se chama o fim da impunidade, começa uma transformação. Acho que, por isso, estamos vivendo um grande momento. Por um lado, chegamos ao fundo do poço, em que muito poucas pessoas de grande credibilidade aceitaram concorrer. De outro lado, estamos iniciando um movimento para chamar a responsabilidade das pessoas para que cada um pague pelos seus erros, pelos seus pecados. Se isso acontecer, e nós fizermos agora, como tudo leva a crer, no primeiro ano da presidente Dilma, a reforma política, institucional, partidária, pode ser que nós estejamos a viver uma nova aurora. É o que eu espero.
O senhor vivenciou diversas fases do Senado – as mais recentes, negativamente marcadas por casos como os atos administrativos secretos, com a mão do Executivo dando suporte aos aliados considerados pivôs da situação. Mas há o outro lado. O senhor acha que projetos moralizadores como o Ficha Limpa e trabalhos jornalísticos como o realizado por este site, inclusive com um prêmio que ressalta a boa prática parlamentar, refletem a tendência de que as coisas podem melhorar na política?
Falo com sinceridade: o Congresso em Foco é uma instituição emocionante. Porque é um punhado de jovens, sem patrimônio – cadê o capital de vocês? (risos). Nem capital de risco, a não ser o nome. É a dignidade de vocês que está sendo posta em jogo. No entanto, vocês estão preenchendo o caminho de vocês. Agora, se formos entrar no contexto da realidade brasileira… o conceito de ética, de moral, de dignidade, não é um conceito que está em moda no Brasil. Depende do momento. Por exemplo, o negócio a que você está se referindo: vem um jornal, põe uma manchete, tremeu o Senado, daqui a pouco vem o Lula, botou a mão em cima, e o próprio candidato do PT perdeu feio [referência a Tião Viana, do Acre, que perdeu a disputa da Presidência da Casa para o peemedebista José Sarney, do Amapá] – porque o Lula mandou que mudasse. E não aconteceu absolutamente mais nada. Lamentavelmente, é isso. Cadê os inquéritos, os levantamentos que nós fizemos? Agora estamos falando na nova direção. Cadê o estudo que foi feito? Quem pretende fazer modificações? Eu pretendo que, antes de escolhermos a nova direção, a gente faça uma reunião com os 80 senadores e cada um apresente suas propostas com relação a essas coisas que foram encontradas de equívoco, e que devem ser alteradas.
O senhor foi hoje (segunda-feira, 22) à tribuna do Senado falar sobre o primeiro discurso de Dilma Rouseff como presidente…
Eu fiquei emocionado com o discurso da presidente. O Lula fez o discurso dele, de choque de capitalismo, mas fez antes de se eleger, fez para buscar votos. O próprio [Mário] Covas fez um discurso sério nesse sentido, mas fez antes de se eleger, também para buscar voto. A Dilma não: no primeiro discurso eleita – ao invés de optar um discurso de estadista, bonito, um discurso de peso – ela fez um discurso técnico, objetivo. Os compromissos que ela fez, eleita, no seu primeiro pronunciamento, foram nota dez. Que os homens do governo têm que ter uma filiação, uma indicação política, mas têm de ter uma capacidade técnica e um compromisso com a verdade, com a moral. Que puna quem que tiver de punir, e não haverá ninguém acobertado no governo. Isso já é um início nota dez.
O senhor está otimista às vésperas de um governo que ainda nem começou e já tem de lidar com uma disputa entre os principais partidos da base, PT e PMDB?
Foi o que eu disse no pronunciamento de hoje: presidente Dilma,a senhora que pensar no primeiro time. No momento em que o Waldomiro [Diniz, pivô do escândalo das propinas nos Correios, em 2005] apareceu na televisão e fizeram aquele flagrante dele recebendo dinheiro, colocando dinheiro no bolso e discutindo percentuais, nós fomos ao presidente Lula e ele não aceitou, disse que não tirava [Waldomiro do posto de chefia na estatal], dissemos: Lula, tem de tirar, tem de marcar o teu governo no primeiro ato. Não tirou. Aí entramos com a CPI. Ele não deixou criar a CPI. Fomos ao Supremo, e o Supremo mandou criar. Mas um ano depois, aí já não foi a CPI do Waldomiro, foi a CPI do mensalão, o escândalo estava firmado. O que disse para ela hoje foi isso, ela tem que começar no primeiro time, no início, ter firmeza de colocar gente que tenha aquilo que ela está dizendo. Já de saída ouve um erro gravíssimo: aquela moça [Christiane Araújo de Oliveira, denunciada pelo Ministério Público Federal por envolvimento com a máfia dos sanguessugas, em 2008] que foi indicada para fazer parte de uma lista de 30 para fazer a coordenação da transferência de governo. Ela está sendo processada e ninguém sabia? Aquilo é um exemplo do que não pode ser feito. Tem de ver a biografia, lembrando sempre daquilo que o presidente Lula diz: que não se pode considerar alguém culpado sem ser condenado em definitivo é verdade. Mas aquilo vale para te botar na cadeia, mas para escolher um ministro teu, para escolher um cara do Banco Central, para escolher um cara para a Petrobras, tem de ter um conceito dele, biografia, não tem de ser condenado em definitivo. Se ela não quer para casar com a filha, não pode querer para ministro do governo.
O eleitorado brasileiro dá sinais de maturidade, a começar pelos debates travados por meio da internet. No entanto, continua a eleger candidatos sem preparo ou com complicações judiciais. Como o senhor vê isso?
Isso é culpa de todos nós. É o sistema anárquico em que nós vivemos. Em primeiro lugar, qual é o partido que coloca o Tiririca na sua nominata? No início de toda caminhada, o partido, a partir da convenção, tem de fazer a seleção. Nesse caso, não fez. Em segundo lugar, a gozação, não é a primeira vez que isso acontece. Aquele macaco para vereador, em São Paulo, há 40 anos, fez 400 mil votos. Esse é o lado ridículo da questão. Agora, não estou sentindo partidos políticos a grandeza de que estão melhores. Cada um quer pegar sua fatia. Mas, se cada um está querendo pegar sua fatia – e eu não quero citar nomes –, eu não vejo o interesse de apontar os melhores. Tem alguns caras que estão sendo apontados que, cá pra nós, não devem ser. A Dilma precisa ter autoridade para exercer o seu papel. Que indiquem, mas ela é quem deve escolher.
Qual a mensagem que o senhor daria ao internauta que votou e que, por meio de um prêmio como esse, pré-selecionado por jornalistas especializados, pode conhecer o valor de determinados parlamentares?
Participe. Participe. O Congresso em Foco teve um papel fantástico. E o internauta assumiu um papel espetacular, agora, na aprovação do Ficha Limpa. Era algo que não tinha condições, não passava. Na Câmara não passava, no Senado não passava – e, cá entre nós, na Justiça também não. Não passava pela cabeça de ninguém. No entanto, passou. Foram vocês, internautas, que falaram, que bateram, que gritaram. Os caras-pintadas que apareceram e fizeram muito mais do que a gente imaginava. Só tem vocês: é o povão, é o jovem, é essa gurizada. É a internet, que oferece isso aí, que é uma coisa espetacular: daqui a pouco teremos uma revolução sem sair de casa. E aí a polícia não pode fazer nada, não pode bater, tem que aceitar os argumentos. Temos de aproveitar isso, porque o exemplo foi dado com o Ficha Limpa, que não passava pela cabeça de ninguém e foi aprovado.
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