Reportagem – é o aprofundamento de uma notícia ou o mergulho em um fato importante, mesmo que não seja recente, em busca de revelações exclusivas. A reportagem, na acepção aqui utilizada, está no universo do “jornalismo investigativo”, que remete ao esforço para tornar públicos fatos relevantes que autoridades ou pessoas poderosas gostariam de manter ocultos. Uma boa reportagem requer pesquisas intensas, entrevistas com grande diversidade de fontes, reiteradas checagens e cuidado especial na apresentação do conteúdo final, que pode trazer complementos como vídeos, infográficos, mapas e painéis de visualização de dados. Também deve trazer – ou, no mínimo, tentar obter – as explicações de quem pode ter sua imagem arranhada pela sua publicação.
Um senador autuado por dano ao meio ambiente preside comissão que vai apurar o desmatamento na Amazônia. O possível conflito de interesses deve voltar as atenções de ambientalistas e parlamentares para os trabalhos da Comissão Externa de Riscos Ambientais do Senado.
O presidente do colegiado é Jayme Campos (DEM-MT), grande proprietário de terras que já foi autuado por ato danoso ao meio ambiente em Mato Grosso. Hoje (17), a comissão realiza a sua primeira investigação in loco, em municípios do Pará.
O senador José Nery (Psol-PA) acredita que há conflito de interesse. “Seria mais conveniente que ele não presidisse a comissão externa. Essa situação pode significar uma solidariedade com as madeireiras ilegais e demais envolvimentos em desmatamentos”, argumenta.
Campos, no entanto, parece tranqüilo à frente da comissão que investiga as áreas desmatadas. Mesmo diante do fato de ter sido autuado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o parlamentar afirma que não há nada de errado em suas terras. “Já entrei com recurso. Auto de infração não quer dizer que cometi um crime. Vou continuar recorrendo”, afirma o senador do DEM.
O auto de infração, disponível para consulta pública no site do Ibama, na seção de áreas embargadas, é datado de julho de 2007. Dono de uma fazenda de 1.205 hectares, o senador responde por multa no valor de R$ 3.615.060 por desmatamento de floresta nativa ao longo dos cursos d’água e áreas de nascente – áreas de preservação permanente (APPs) – na fazenda Santa Amália, em Alta Floresta (MT), no norte do Mato Grosso.
Investigações in loco
Membros da Subcomissão Temporária para acompanhar a Crise Ambiental na Amazônia e da Comissão Temporária Externa de Risco Ambiental já estão no Pará, onde ficam até sexta-feira (18). As visitas às cidades de Tailândia, nordeste paraense, Paragominas, no sudeste, e Breves, na Ilha do Marajó, serão para averiguar dados referentes ao desmatamento e estreitar os discursos a respeito da devastação na área.
Segundo o senador Jayme Campos, a comissão externa quer verificar se os dados publicados pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) – em que foram avaliados o desmatamento grave em 36 municípios de Rondônia, Pará e Mato Grosso – são realmente verídicos. O senador afirma que os dados divergem de informações divulgadas pelas regiões. “No estado do Mato Grosso, por exemplo, o Inpe divulga que 66% das propriedades têm áreas desmatadas, enquanto dados do governo local mostram apenas 12,6%”, constata.
Mesmo com proposta de verificar dados, a comitiva – composta pelo presidente da Subcomissão, Flexa Ribeiro (PSDB-PA), Renato Casagrande (PSB-ES), Expedito Júnior (PR-RO), Gilberto Goellner (DEM-MT), Sibá Machado (PT-AC), Leomar Quintanilha (PMDB-TO) e o próprio Jayme Campos – partiu sem assessoria de técnicos para dar apoio às investigações. Segundo assessores de Flexa Ribeiro, o grupo será amparado por técnicos do Instituto de Pesquisa da Amazônia (Imazon), instalado no Pará.
Na opinião do senador Nery, para ir ao Pará verificar divergências nos dados do Inpe, seria preciso, em primeiro lugar, a companhia de um corpo técnico especializado. Ele acredita que os dados do Inpe foram contestados aleatoriamente. “Prefiro acreditar no Inpe, do que em informações de setores que, historicamente, privilegiam esses tipos de atividades que resultam em crimes ambientais”, diz.
Para o senador Sibá Machado, vice-presidente da subcomissão, os membros de ambas as comissões querem avaliar o interesse dos que se sentem prejudicados diante da “endurecida” do Ibama e da Polícia Federal nas punições de crimes ambientais.
Sibá preferiu não se posicionar sobre o fato de o senador Jayme Campos presidir uma comissão ambiental, mesmo respondendo por auto de infração por ato contra o meio ambiente. “Para falar de um membro da comissão, não me disponho. Mas vou acompanhar atento os trabalhos”, prometeu.
Operação “agressiva”
Outro objetivo da Comissão Externa de Riscos Ambientais é averiguar as ações da Operação Arco de Fogo, deflagrada pela Polícia Federal, em parceria com o Ibama. A Operação, que atua nos estados de Pará, Rondônia e Mato Grosso, já congrega números consideráveis. De acordo com dados do Ibama, até o momento, foram apreendidos mais de 23 mil metros cúbicos de madeira, aplicadas mais de 230 multas, totalizando valor de mais de R$ 40 milhões. A PF já instaurou 23 inquéritos policiais e 77 termos circunstanciados (TCO), além de fazer 19 prisões em flagrante.
Na última reunião da comissão externa, na terça-feira (15), o senador Jayme Campos qualificou a operação como “agressiva e violenta”. Para o senador, os governos estaduais não foram consultados, o que leva a desacordos na maneira como vem sendo feita a operação. “É um verdadeiro terrorismo”, afirma.
A Polícia Federal defende que a operação tem sido feita dentro dos padrões previstos e que não há indícios de violência. “Em nenhuma localidade por onde passamos, tivemos notícias de embates violentos. O que há são manifestações de madeireiros”, afirma o agente da PF, Herman Gomes de Almeida.
O senador Nery elogia a operação. Para o parlamentar, quando o Estado decide realizar uma ação mais contundente para punir crimes ambientais, há sempre protestos. “A Operação Arco de Fogo não só deve ser mantida como também ampliada, para que todas as rodovias por onde passem caminhões com madeira ilegal sejam fiscalizadas”, diz.
Números da Operação Arco de Fogo
Alta Floresta (MT)
– 16 empresas autuadas
– 25 multas, no valor de R$ 737 mil
– 1.200l m³ de madeira em tora e serrada
Tailândia (PA)(encerrada)
– 105 multas, no valor total de R$ 25,6 milhões
– 23.300 m³ de madeira em tora e serrada apreendida
– 46 empresas e áreas particulares embargadas (na área rural foram 6,3 mil hectares)
Paragominas (PA)(apenas uma semana de atuação)
– 16 multas, no valor de R$ 4,88 milhões
– 5 empresas autuadas
– 3.300 m³ de madeira em tora e serrada
– 3 serrarias lacradas, por não apresentarem licença para funcionar
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