Fábio Góis e Renata Camargo
Com rejeição de dois destaques, o plenário do Senado aprovou há pouco a chamada MP da Amazônia (MP 458/09), que simplifica o processo de regularização fundiária da Amazônia Legal. A medida permite à União a transferência de terras de sua propriedade, de até 1,5 mil hectares, a ocupantes da região, sem necessidade de licitação. Em uma sessão movimentada e com debates acirrados, a matéria recebeu 37 votos a favor, dois contra e uma abstenção, e segue para a sanção presidencial.
O texto da MP determina que, para ter direito a receber as terras da União, o beneficiário deve provar que ocupava a propriedade antes de 1º de dezembro de 2004. Ao todo, 67 milhões de hectares são atingidos pela nova norma.
A medida estabelece ainda faixas de extensão territorial para o repasse: terras com até 100 hectares seriam doadas aos ocupantes; as com até 400 hectares seriam vendidas por valor simbólico; já as grandes propriedades, no limite máximo de 1.500 hectares, seriam revendidas a preço de mercado com base na tabela do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Nesse caso, os posseiros teriam até 20 anos para pagar o valor estipulado, com possibilidade de parcelamento e carência de três anos.
Os destaques rejeitados foram apresentados em conjunto pelos senadores petistas Marina Silva (AC) e Aloizio Mercadante (SP). Mas a votação que derrubou os recursos para votação em separado foi apertada: 23 votos pela rejeição, 21 contra, e uma abstenção. Os destaques solicitavam que os beneficiários da regularização fundiária na Amazônia Legal fossem proibidos de comercializar suas terras em até dez anos, e que fosse vetado o uso dos chamados prepostos (ocupantes de terra) em propriedades rurais.
“O maior problema dessa MP são as brechas criadas para que aqueles que cometeram o crime de apropriação de terras públicas sejam anistiados e confundidos com aqueles posseiros de boa-fé, cujos direitos são salvaguardados pela Constituição Federal”, criticou Marina.
A MP da Amazônia foi relatada pela senadora Kátia Abreu (DEM-TO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) e integrante da bancada ruralista do Congresso. O parecer de Kátia manteve o texto da medida conforme veio da Câmara (leia). A justificativa da senadora, que rebateu as críticas de que a matéria facilita a grilagem de terras na Amazônia, é que o prazo de validade da matéria vence na próxima semana.
“Para quem não sabe o que significa grilagem, digo que a falsidade ideológica era tão detalhada, que alguns, de má-fé, colocavam um documento novo dentro de uma caixinha de madeira, onde colocavam grilos, deixando-os ali dentro por alguns dias, para que ali fizessem suas necessidades e comessem as beiradinhas do papel, para que aquele documento parecesse um documento velho”, esclareceu a senadora, acrescentando que a prática representaria, entre outros crimes, partilha de herança sem registro, bem como seu falseamento, ou escritura sem título de domínio ou de registro anterior. “Assim, efetiva-se e legalizava-se a grilagem.”
Alterações
O texto apreciado pelos senadores tinha vários pontos diferentes em relação à proposta inicial enviada pelo Executivo. Entre as mudanças feitas pelos deputados, uma das mais polêmicas era a permissão para que empresas brasileiras e proprietários de outros imóveis rurais participem desse processo de regularização por meio de licitação. O texto original da MP vetava essa participação.
Também foi alterado na Câmara o prazo para a venda da terra regularizada. Pelo texto original, o beneficiário não poderia transferir o título em um prazo de dez anos. No texto aprovado na Câmara, esse item foi excluído, passando a ser autorizada a transferência de títulos para propriedades superiores a quatro módulos fiscais em um prazo de três anos. Para áreas inferiores a quatro módulos o prazo para transferência permanece de 10 anos.
Pressa e veto
Não só a relatora como os senadores da base aliada tinham pressa em aprovar a proposição, antes do encerrar o prazo de 45 dias desde o envio ao Congresso pelo Planalto: a MP precisava ser aprovada pelas duas Casas até a quarta-feira da próxima semana (10). Se tivesse recebido modificações no Senado, a medida teria de retornar para a Câmara e ser novamente votada pelos deputados.
Ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva já avisou que, caso a MP da Amazônia fosse aprovada no Senado como veio da Câmara, pediria ao presidente Lula o veto integral à matéria (leia).
“Sou amplamente favorável ao amplo processo de regularização na Amazônia. Mas tenho alertado sobre equívocos. O maior problema são as brechas criadas para aqueles que se apropriaram de terras públicas [grileiros]. Uma proposta dessa magnitude jamais deveria ter vindo como MP. Tinha ser um projeto, para se ter um amplo debate com a sociedade”, observou a petista, referência internacional na defesa do meio ambiente.
Renegociação
Os senadores também aprovaram a Medida Provisória 457/09, que renegocia dívidas de municípios junto ao INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social). A votação, feita de maneira rápida e em caráter simbólico, autoriza a União a parcelar as dívidas municipais vencidas até 31 de janeiro deste ano. O soma desses débitos chega a R$ 22,1 bilhões.
A matéria recebeu do relator, senador Valter Pereira (PMDB-MS), 14 destaques ao texto aprovado na Câmara dos Deputados, o que obrigará seu retorno à apreciação dos deputados. A MP também tem até a quarta-feira (10), quando completa 45 dias desde o envio (prazo regimental e constitucional), para ser analisada e aprovada pelas duas Casas. Do contrário, perde a vigência.
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