João Alberto Capiberibe*
A violência costuma ser entendida apenas na sua face de ações criminosas, especialmente contra a vida e contra a propriedade. Embora seja importante o reconhecimento da gravidade dessas violações, é preciso compreender que existem diversas formas e situações de violência que também precisam motivar políticas de segurança.
São as violações relativas às condições precárias de urbanização, moradia e transporte da grande maioria da população. Também devem ser consideradas aquelas relacionadas à violência contra a mulher e as diferentes formas de discriminação com motivação étnico-racial. Do contrário, haverá uma perigosa banalização das distintas formas de violência praticadas na sociedade.
Com base nessa compreensão, as diferentes formas de expressão e práticas da violência precisam ser interpretadas e analisadas sob diferentes enfoques, especialmente nas suas causas de natureza econômica, social, cultural, diferenças regionais e, sobretudo, da perda de valores humanos, éticos e espirituais.
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Dessa análise resulta que toda a ação de segurança pública visa proteger o(a) cidadão(ã) e a sociedade de qualquer ação de violência ou violação de direitos. Essa ação de segurança pública, portanto, deve ter um caráter que combine a repressão e a prevenção e observe as causas da violência e suas formas de expressão.
A segurança pública não pode ser entendida como uma espécie de guerra não declarada, em que os policiais saem às ruas para enfrentar o inimigo. A conseqüência mais grave dessa concepção de segurança é considerar vários segmentos sociais da população como suspeitos ou potencialmente criminosos.
Ao contrário, aos policiais cabe a nobre missão de proteger o(a) cidadão(ã) e a comunidade. E a ação de prender criminosos deve ser a conseqüência da missão de proteger os direitos humanos da sociedade.
As instituições de segurança pública no Brasil precisam de muito mais que mudanças, e essas estão sendo realizadas e têm consistido em encaminhamentos importantes, mas, além disso, há necessidade de transformações profundas.
Uma delas é a construção de uma nova cultura que resgate o significado e que aclare nos profissionais de segurança a missão singular que lhes foi democraticamente outorgada. A lógica da guerra, portanto, compreende uma visão reducionista e equivocada que distorce a dignidade do profissional policial e a sua importante missão pedagógica para com a população.
A segurança pública entendida como proteção e defesa social, além da ação integrada do sistema de segurança, interage ainda com as políticas públicas das áreas sociais, destacando as políticas de prevenção da violência, especialmente as de caráter cultural, direcionadas aos jovens.
O sistema de segurança pública deve promover a integração das ações do sistema de inteligência com o policiamento ostensivo e as ações de prevenção, a partir da avaliação das principais violações de direitos a serem combatidas e as ações criminosas mais relevantes com a identificação dos seus grupos.
Uma ação combinada de repressão à criminalidade e de iniciativas ostensivas de prevenção é decisiva para a prática de uma segurança pública efetivamente cidadã.
A exibição pelo Fantástico, da Rede Globo, no último domingo (16), da experiência de polícia interativa comunitária do Morro do Cavalão, em Niterói (RJ), que já dura cinco anos, prova a correção da tese de uma segurança pública como proteção e defesa social.
A experiência do Morro do Cavalão deveria ser multiplicada pelo país, estendendo a mão protetora do Estado lá onde o povo vive. Com certeza, a qualidade de vida, em nossas cidades, seria outra.
*João Alberto Capiberibe, 60 anos, foi preso e exilado político durante a ditadura militar, e depois elegeu-se prefeito de Macapá (AP), governador e senador do Amapá. Atualmente, é o vice-presidente nacional do PSB.
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