Fábio Góis
Os senadores Cristovam Buarque (PDT-DF) e Arthur Virgílio (AM), líder do PSDB no Senado, apresentaram hoje duas denúncias contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no Conselho de Ética da Casa. Agora, o colegiado reúne onze pedidos de investigação contra Sarney, epicentro da crise institucional instalada há meses: cinco representações (três do PSDB e duas do Psol) e seis denúncias. As outras quatro denúncias foram protocoladas pelo próprio Virgílio.
Uma das denúncias solicita investigação acerca da “nebulosa transação” da venda de terras supostamente operada por Sarney, segundo reportagem da Folha de S.Paulo, sem que o devido recolhimento de imposto. A outra denúncia diz respeito aos “fatos escabrosos” noticiados pelo Correio Braziliense segundo os quais um assessor de Sarney, cedido da cota de ex-presidentes da República, repassava informações sigilosas da Polícia Federal ao grupo de seu filho, o empresário Fernando Sarney, alvo principal da Operação Boi Barrica (veja abaixo a íntegra da nota assinada pelo senadores).
Mais cedo, a presidente nacional do Psol, a ex-senadora e atual vereadora alagoana Heloísa Helena, veio ao Congresso para, junto com o líder do partido no Senado, José Nery (PA), formalizar a segunda representação do partido. “Não são mais apenas indícios relevantes de crimes contra a administração pública praticados por Sarney. Pelo contrário. Existem fatos que mostram claramente o tráfico de influência, a intermediação de interesse privado, e exploração de prestígio, que possibilitam a cassação de mandato parlamentar”, disse Heloísa, com o sotaque nordestino que a caracteriza.
As denúncias apresentadas ao Conselho de Ética apenas formalizavam pedido de investigação sobre atos que configurariam quebra de decoro parlamentar. Cabe ao presidente do colegiado decidir a transformação da denúncia em representação – do contrário, o regimento interno possibilita ao presidente arquivamento sumário, sem consulta aos demais integrantes do colegiado. Segundo a Secretaria de Apoio, as quatro denúncias continuam formalizadas na secretaria, mesmo com teor idêntico ao das três representações, mas devem ser arquivadas por Duque. A assessoria do órgão disse ainda que o regimento não prevê a situação.
As representações partem do pressuposto de que houve, por parte do parlamentar representado, quebra de decoro parlamentar – o que implica imediata abertura de processo, cuja pena máxima é a perda de mandato. Apenas partidos podem formalizar representações no Conselho de Ética, por meio da maioria dos votos da executiva.
Nesse caso, o presidente do Conselho não pode arquivar sumariamente a representação, mas deve submetê-la à apreciação dos demais membros do colegiado. Caso os senadores considerem, no transcorrer de um eventual processo, que houve quebra de decoro, o plenário julgará se o representado deve perder o mandato. Uma vez aprovado o requerimento de abertura de processo, Sarney fica imediatamente afastado da presidência até a conclusão da votação em plenário.
Desde que tomou posse pela terceira vez no comando da Casa, em fevereiro, José Sarney tem sido obrigado a se defender das mais variadas acusações – de uso de seguranças da Casa para fins particulares até a mais recente, o envolvimento na nomeação de parentes por meio de ato administrativo secreto. Mesmo depois de a bancada do PT no Senado ter seguido a orientação de partidos como PSDB, DEM e Psol e ter formalizado a posição em favor do afastamento, Sarney ainda conta com o apoio do presidente Lula, razão considerada crucial para a insistência em se manter no posto.
Confira a íntegra da nota:
“Nota à imprensa
Os abaixo-assinados senadores Arthur Virgílio (PSDB-AM) e Cristovam Buarque (PDT-DF) decidem:
a) Denunciar o Presidente do Senado Federal, José Sarney (PMDB-AP), com base no artigo 5º da Resolução nº 20, do Conselho de Ética da Casa, que prevê investigação do parlamentar – e possível perda de mandato – por quebra de decoro.
A denúncia se baseia nos graves fatos descritos pelos jornalistas Alan Gripp e Fernanda Odilla, do jornal Folha de São Paulo, envolvendo venda de terras pelo Presidente do Congresso, sem o necessário e devido pagamento de impostos. A nebulosa transação agride a Lei nº 8.137/90, que prevê crimes contra a Ordem Tributária;
b) Denunciar o Presidente do Senado Federal, com base no mesmo artigo 5º da Resolução nº 20, do Conselho de Ética da Casa, por quebra de decoro parlamentar. A denúncia se lastreia nos fatos escabrosos relatados pelo jornalista Lúcio Vaz, do jornal Correio Braziliense, segundo os quais o agente da Polícia Federal, Sr. Aluísio Guimarães Filho, cedido pelo Palácio do Planalto ao senador Sarney, na cota de funcionários de ex-Presidentes da República, passava informações privilegiadas do Departamento de Polícia Federal ao grupo comandado pelo empresário Fernando Sarney, filho do parlamentar ora denunciado.
Tal atitude colide com o artigo 325 do Código Penal: “Revelar fatos de que se tem notícia, em razão do cargo que ocupa, e que devam permanecer sob sigilo”. E configura, mais uma vez, a forma incestuosa com que o Sr. José Sarney e seu grupo político-empresarial tratam a coisa pública.
Brasília, 29 de julho de 2009
Senador Arthur Virgílio
Senador Cristovam Buarque”
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