Edson Sardinha
O PT e o PSDB estão cada vez mais parecidos ideologicamente, e só não caminham juntos por causa de uma acentuada disputa de poder. A constatação não é feita por nenhum dissidente petista, tampouco traz em si um tom de censura. Pelo contrário, é de autoria do vice-líder do governo na Câmara, Sigmaringa Seixas (PT-DF). Um dos amigos mais próximos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso, o deputado faz parte de um seleto grupo de petistas – também composto pelo governador Jorge Viana (AC) e os senadores Tião Viana (AC) e Flávio Arns (PR) – que defende a aproximação do PT com os tucanos.
Com a experiência de quem passou oito anos no PSDB antes de se filiar ao PT, em 1997, o deputado identifica no distanciamento entre os dois partidos o fortalecimento dos setores conservadores e a inviabilidade da consolidação de uma política de centro-esquerda no país. Sigmaringa nada na contracorrente em meio à polarização entre tucanos e petistas, que deve se intensificar esta semana com a investigação do suposto vínculo do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) com o valerioduto (leia mais).
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“São dois partidos com a maior identidade, não tenho dúvida. Acho que essa é uma aliança para chegar ao poder e liberar as reformas. Reconheço as dificuldades porque disputamos as eleições presidenciais. Isso nos afastou. O PSDB é uma alternativa de poder”, afirma. “Se o PT e o PSDB estivessem juntos, poderíamos ainda não ter maioria no Congresso, mas seria mais fácil chegar a ela”, completa o vice-líder do governo, nesta entrevista exclusiva ao Congresso em Foco.
O discurso moderado dirigido aos principais desafetos do Palácio do Planalto contrasta com o tom contundente que Sigmaringa adota na defesa do governo Lula. Na avaliação dele, o pior momento da crise já ficou pra trás, a oposição se desgasta dia-a-dia com as CPIs e as apurações não vão atingir a economia do país nem o presidente da República.
“Acho que essas CPIs já não têm mais o que apurar. Havia uma expectativa de que elas fossem derrubar governo. O cidadão está vendo que houve um escarcéu muito grande para o resultado que elas tiveram até agora. Depois se viu que não havia esse antro de corrupção que a oposição alardeava desde o início”, afirma. “Vai haver uma grande decepção por parte daqueles que imaginavam que iam vincular o governo Lula à corrupção”, emenda.
Do próprio veneno
Em seu terceiro mandato na Câmara, o primeiro pelo PT, Sigmaringa compartilha da visão de que o partido é alvo de ódio e preconceito. Mas não deixa de reconhecer que os petistas têm sua parcela de culpa pela ira despertada e provam do seu próprio veneno. “O PT sempre questionou muitas coisas, às vezes com toda razão, mas muitas vezes apenas para marcar posição. O PT podia ter reconhecido algumas proposições do governo Fernando Henrique perfeitamente. Não reconheceu porque era um governo adversário. Quando o PSDB faz a mesma coisa hoje também está errado. Tudo isso criou muita animosidade contra o PT aqui dentro”, admite.
O vice-líder do governo também reconhece que Lula não conseguirá cumprir seus compromissos de campanha e que precisará dialogar mais com os congressistas e liberar as emendas dos parlamentares ao Orçamento para recompor sua base de apoio no Congresso. “Você acha que o Lula não está fazendo tudo aquilo que ele prometeu por quê? Porque mudou a cabeça? Mudou nada. A realidade é outra, porque não consegue fazer tudo. Tem um Congresso aqui, isso é da democracia. Está tendo dificuldades para formar maioria.”
Congresso em Foco – Com a vitória de Aldo Rebelo na Câmara, o governo conseguiu estancar a crise política?
Sigmaringa Seixas – A vitória de Aldo foi muito importante para o governo porque mostrou que ele tem força aqui, num momento em que a oposição achava que ia dominar a Câmara e teria de condições de eleger um candidato dela. É verdade que o Congresso se dividiu muito, mas, de qualquer maneira, foi uma vitória importante. O governo vai voltar a se rearticular com o Congresso e as coisas vão caminhar como devem. Os projetos virão para cá e serão debatidos. Quando for possível, faremos acordos. Nos demais casos, vamos para o voto democraticamente. Essa sempre foi a essência do Parlamento. É importante para o Congresso, para o governo e, conseqüentemente, para o país ter na presidência da Câmara alguém que vai conduzir os trabalhos da Casa com independência, como Aldo Rebelo.
Na sua avaliação, o pior momento da crise já passou?
Sem dúvida. O que falta agora? Acho que essas CPIs já não têm mais o que apurar. Havia uma expectativa de que elas fossem derrubar governo. O cidadão está vendo que houve um escarcéu muito grande para o resultado que elas tiveram até agora. As CPIs começam a entrar em um processo de desgaste. São poucos os parlamentares que atuam com o propósito real de se dedicar apenas à investigação. Boa parte dos parlamentares passa o tempo todo fazendo discurso político. Investigar mesmo, praticamente não se investiga. Isso acaba levando as CPIs a um desgaste. A opinião pública, que estava acompanhando com muita atenção o desenvolvimento dos trabalhos das CPIs, já começa a perceber que elas já esgotaram o seu papel de investigar e o uso político que delas está se fazendo. O Congresso está começando a se desgastar, inclusive os próprios parlamentares que integram as CPIs. O pior momento passou, os nomes estão aí, a Câmara vai decidir autonomamente o que fazer com os parlamentares que forem culpados, e o país vai continuar crescendo.
O que dá ao senhor tanta certeza sobre isso?
Com toda essa crise política – que a oposição faz questão de dizer que foi a mais grave da história da República –, o governo Lula não chegou a patamares tão baixos que pudessem inviabilizá-lo. Nós tivemos governos anteriores, em seus piores momentos, em uma situação muito mais delicada que o governo Lula, do ponto de vista da aceitação pública. A tendência agora é o governo voltar a trabalhar sem as preocupações que hoje o envolve. Veja que o país continua crescendo. Estamos gerando 100 mil empregos por mês e a economia continua crescendo. Depois de muito tempo, tivemos empresas com lucratividade maior do que a dos bancos. Ou seja, o país passou por cima dessa crise política, que, a meu ver, se encerra no fim deste ano. Com isso, o governo vai ter condições de se desenvolver mais ainda em 2006.
Em que momento, na avaliação do senhor, o governo começou a virar esse jogo nas CPIs?
No início, criou-se uma expectativa muito grande. “É um governo entulhado na corrupção, nunca houve corrupção tão grande neste país”, dizia a oposição. A opinião pública foi contaminada por isso. Começou-se a apurar, apurar e apurar e se viu que a coisa estava limitada. Houve um empréstimo – eu não estou nem justificando, mas estou mostrando o quadro real – repassado para alguns partidos políticos. Se o partido usou bem ou mal é outra questão. Acho até que muitos usaram esse dinheiro de forma equivocada, repreensível.
Para uso pessoal? Gente do PT, inclusive?
É possível, mas não para o PT. É possível que alguns parlamentares tenham sido beneficiados com esses empréstimos. Mas eu não tenho dúvida nenhuma de que a grande maioria não tinha idéia da origem desses recursos. Dirigentes partidários e parlamentares que tinham seus compromissos a saldar recorreram ao tesoureiro nacional do PT (Delúbio Soares), que indicou a eles o caminho para receberem recursos. A Câmara agora vai decidir se isso foi certo ou errado, ou se isso configurou quebra de decoro parlamentar. Mas você me perguntou inicialmente quando o governo começou a virar esse jogo. Acho que não começou a virar, é que se criou essa expectativa para polemizar mesmo. Depois se viu que não havia esse antro de corrupção que a oposição alardeava desde o início. Você vê que pouca coisa foi apurada. Mesmo nas CPIs onde há predominância da oposição não se tem praticamente nada apurado.
Mas essa dificuldade em apurar os fatos não tem a ver com a preocupação excessiva de alguns integrantes da CPI com os holofotes, em detrimento da investigação? Não se descobriu mais coisas por incompetência da própria oposição?
Não posso dizer que não se apurou nada porque os parlamentares são incompetentes. O próprio governo tomou a iniciativa de investigar, por meio do Ministério da Justiça e da Polícia Federal. Aliás, a Polícia Federal nunca investigou tanto na história deste país, com resultados objetivos, reais, concretos, como agora no governo Lula. Os exemplos estão aí, todos os dias, nos jornais. A Controladoria-Geral da União, por exemplo, apontou irregularidades em muitas prefeituras, algumas inclusive administradas pelo PT. E quem criou a CGU foi o presidente Lula. Dizer que não se apurou porque houve incompetência na investigação seria admitir que há, realmente, fatos graves, e que só não foram levantados porque os parlamentares são incompetentes. Acho que não é isso. Mas percebo parlamentares mais preocupados com os holofotes do que, propriamente, com investigação. Muitos porque não têm uma formação profissional que lhes habilitem a fazer uma investigação mais aprofundada, outros porque não têm nenhum interesse. Essas investigações mais rigorosas e mais técnicas são feitas pelos órgãos competentes.
Mas, objetivamente, por que o governo está conseguindo se recuperar?
O governo está se recuperando porque a opinião pública está começando a compreender que a coisa não é como se dizia no início. Há corrupção? Há. É só investigar. Os responsáveis serão punidos, é o que o governo quer. Mas não há nada que não se conhecesse antes. O problema é que o PT sempre foi muito rigoroso, sempre pediu CPI para qualquer coisa, e hoje está provando de seu próprio veneno.
Um dos ícones do PT, a filosofa Marilena Chauí desabafou dizendo que não entende o que o PT fez para ser alvo de tanto ódio. O senhor também acredita nesse ódio? Já conseguiu resposta para essa pergunta?
Até compreendo um pouco. Foi inocência do PT. Eu acho que parte de culpa é do próprio PT. Há um ódio ideológico, porque o PT é um partido estruturado, que surgiu no movimento sindical e cresceu. Tem muita gente que não suporta ver na presidência da República um torneiro mecânico que não tem um dedo. Isso é inquestionável. Alguns chegam até a expressar isso. Outros estão envergonhados, mas há esse sentimento forte por parte da população. Mas também, em parte, sobretudo aqui dentro, porque o PT sempre foi contra tudo. O PT sempre questionou muitas coisas, às vezes com toda razão, mas muitas vezes apenas para marcar posição. O PT podia ter reconhecido algumas proposições do governo Fernando Henrique perfeitamente. Não reconheceu porque era um governo adversário. Quando o PSDB faz a mesma coisa hoje também está errado. Tudo isso criou muita animosidade contra o PT aqui dentro. O partido sempre requereu muitas CPIs, sempre foi muito duro nessas investigações.
O senhor acredita que o PT sairá um partido melhor desta crise?
Eu acredito. O PT aprendeu muito nos últimos anos. Mesmo sem essa crise, teria aprendido por ter chegado ao poder. Você acha que o Lula não está fazendo tudo aquilo que ele prometeu por quê? Porque mudou a cabeça? Mudou nada. A realidade é outra, porque não consegue fazer tudo. Tem um Congresso aqui, isso é da democracia. Está tendo dificuldades para formar maioria. No Senado, por exemplo, nós não temos. Na Câmara temos uma maioria muito débil, conseguida com alianças com partidos que não têm uma firmeza ideológica ou programática, como seria razoável. Isso dificulta.
Algumas das figuras que estão hoje no papel de acusadores estiveram, no governo FHC, envolvidos em denúncia de compra de votos, como a da emenda da reeleição. Não falta ao PT, que é o principal partido da base, explorar essas contradições da oposição?
Estamos muito acuados. É como se nossos companheiros estivessem um pouco envergonhados, como se o discurso da oposição fosse real, se o governo Lula estivesse mesmo mergulhado em um mar de corrupção. Como o PT está mergulhado em um mar de corrupção? Que culpa têm os 900 mil filiados do PT com o que está acontecendo? Que culpa tem a direção do PT com o que foi feito por um grupo, e não por toda a direção? Esses fatos inclusive não eram do conhecimento da Executiva do PT como um todo.
O ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira já afirmou que a Executiva tinha conhecimento desses empréstimos…
Isso não é verdade. Como a esquerda do PT, que também faz parte da Executiva, iria concordar com isso? Isso não existe. Não houve compra de votos por parte do governo. Se houve pagamento de propina a parlamentares de outros partidos, foi uma relação interna. O que deve ter acontecido é que o PT foi ao banco, levantou recursos e transferiu parte deles a esses partidos, para campanhas eleitorais, publicidade ou propaganda partidária. Agora, se esse dinheiro que chegou a esses partidos tinha uma outra destinação, o PT não pode ser responsabilizado por isso. Nunca houve o propósito do governo de pagar a parlamentares para votar. Isso é inadmissível. E nunca ninguém provou isso. Isso é uma maldade. Não se esqueça de que o governo anterior foi acusado disso. Essas denúncias surgem em todos os governos.
Até agora a CPI do Mensalão ainda não conseguiu chegar ao governo FHC…
Não sei aonde ela vai chegar. Vai haver uma grande decepção por parte daqueles que imaginavam que iam vincular o governo Lula à corrupção. Até agora, isso não chegou. Nada, absolutamente nada. Não tem nada que se possa dizer que atinja o governo do presidente Lula.
No caso do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), os indícios da existência de um grande esquema de corrupção na estatal não são acentuados demais?
Tudo bem, reconheço que há denúncias. Vou falar, então, de forma diferente: não há nada que comprove a conivência do presidente Lula. Corrupção numa máquina administrativa como a nossa é difícil de se controlar. O importante é ter ciência de que o governo tomou atitude ao saber da existência desses casos. Essas coisas têm sido feitas. Há denúncia, o presidente demite. O resto cabe à Polícia Federal, ao Ministério Público e à Justiça tomar providências.
Qual a responsabilidade do presidente Lula e do ex-ministro José Dirceu para que a crise chegasse a este ponto?
Tenho convicção de que eles não têm responsabilidade pela crise. Gostaria que não me julgassem antes de a gente concluir as investigações. Estou absolutamente convencido de que isso foi uma irresponsabilidade de uma pessoa que tinha um poder que não deveria ter.
Quem?
Delúbio Soares. O partido não poderia ter dado esse poder todo a ele. Cometemos um erro inicial. O Genoino (José Genoino, ex-presidente do PT) é um homem correto, de bem, que está sofrendo profundamente com esses fatos todos. Ele não poderia ter sido o presidente do partido, não é do estilo dele. Genoino é um parlamentar de plenário. Confiou demais em Delúbio e deixou a coisa correr. Ele tem responsabilidade política por tudo isso. E uma responsabilidade objetiva, porque ele era o presidente do partido. O Delúbio tinha muita liberdade, muita autonomia. O Delúbio exagerou, pecou, foi irresponsável por isso. Envolveu-se com os outros partidos de uma forma que ia muito além do que sabiam Genoino e Dirceu.
O que lhe dá tanta certeza sobre a inocência do ex-ministro José Dirceu?
O Dirceu é um cara muito inteligente e preparado, nunca ia deixar chegar a esse ponto. Não ia permitir que se fizesse um empréstimo vultoso como os que foram feitos porque sabia que o partido não teria como pagar. O Marcos Valério nunca foi um publicitário. Sabe-se agora que ele era um grande nome do mercado financeiro, que sabia fazer essas operações. Ele também envolveu o Delúbio, que vai pagar pelo que fez.
O Marcos Valério também não é um personagem novo nessa história de financiamento de partidos. Ele mesmo reconhece que desde 1998 repassava recursos para partidos, como o PSDB. Ele chega a ser uma novidade para um senhor?
Para mim é, e para o PT também devia ser. Mas hoje a gente vê que ele fazia a mesma coisa para outros partidos, inclusive o PSDB.
Mas não é aí, quando todos parecem ser atingidos, que as CPIs começam a morrer?
Estamos discutindo um problema antigo, para o qual não vamos dar solução alguma. Nem se 200 parlamentares forem cassados e Delúbio e Marcos Valério forem para a cadeia, a coisa estará resolvida. O problema é estrutural. É urgente fazer uma reforma política profunda. No fundo, há duas coisas nesse sentido: uma é a corrupção, que está lá na ponta, a outra são os recursos levantados para fazer face à vida partidária e às campanhas eleitorais. Então, se não se resolver esse negócio, não adianta cassar deputados, porque isso vai voltar. Pessoalmente sou a favor do voto em lista e de financiamento público de campanha. É preciso haver uma legislação rigorosa, dotar a Justiça Eleitoral de instrumentos que lhe permitam fiscalizar com rigor os recursos que são utilizados em campanhas eleitorais, punir quem fugir do financiamento público e extrapolar o limite estabelecido.
Sem a reforma política, que não deve mesmo ser feita este ano, a tendência é esses problemas se repetirem em 2006?
É bem simples. A campanha é muito cara. As pessoas se desesperam, precisam levantar recursos e aí recorrem a essas coisas. Eu não estou justificando, absolutamente. Estou apenas explicando como é que elas surgem. Neste processo de cassação, você vai cassar alguns com justiça, outros com injustiça. E você vai deixar outros parlamentares aqui que mereciam ser punidos e não foram, entendeu? Vai ser injusto na cassação de alguns, vai ser injusto ao não cassar outros. Precisamos de uma reforma política com urgência. É uma pena termos perdido essa oportunidade. Isso que está acontecendo hoje vai voltar a acontecer em outubro, se não tomarmos medidas.
O senhor já foi do PSDB. Neste momento, há uma polarização muito grande entre tucanos e petistas. Mas não lhe parece que os dois partidos, no topo, nunca foram tão parecidos?
Ideologicamente são (muito parecidos). São dois partidos com a maior identidade, não tenho dúvida. Pessoalmente sempre lutei por uma aliança do PT com o PSDB. Acho que essa é uma aliança para chegar ao poder e liberar as reformas. Falo isso há muitos anos. Reconheço as dificuldades porque disputamos as eleições presidenciais. Isso nos afastou. O PSDB é uma alternativa de poder. Não tem muito sentido para eles fazerem uma aliança conosco, já que o presidente da República é nosso. Eles acham que podem ter o presidente. Discordo. Prefiro o PSDB como alternativa.
O senhor prefere o PSDB ao PFL como alternativa, por exemplo?
Claro, o PFL é um adversário ideológico.
No governo FHC, o PSDB não se aproximou demais dos ideários do PFL?
Isso faz parte das circunstâncias da política. O PSDB se aproximou do PFL para poder sustentar melhor uma campanha presidencial. Sozinho também não sustentaria. E o PSDB, sem se alinhar com o PFL, teria dificuldade para avançar. O PFL tem uma visão mais conservadora do processo. O problema é que a mesma coisa aconteceu com o PT. O PT também falou: “Não sou mágico, vou ser obrigado a fazer alianças com setores conservadores”. Se o PT e o PSDB estivessem juntos, poderíamos ainda não ter maioria no Congresso, mas seria mais fácil chegar a ela. Com uma aliança com os partidos menores, de centro-esquerda, poderíamos chegar a uma maioria. Teríamos facilidade para fazer realmente as mudanças necessárias para o país. No poder, o PSDB teve dificuldades porque fez alianças com o setor conservador. O PT chegou ao poder e também foi obrigado a fazer alianças com o setor conservador. Isso dificulta para todos nós.
Mesmo olhando para além de 2006, essa aproximação entre PSDB e PT não é uma causa perdida?
Não, não é uma causa perdida. O PT e o PSDB são partidos que têm responsabilidades. Veja que os dois já votaram juntos sem precisar se sentarem a uma mesa de negociação. Foi o que ocorreu, por exemplo, na reforma da Previdência. O problema é que estamos a um ano da eleição, e o PSDB tem candidato a presidente da República. Age como um partido de oposição, que quer minar muito a candidatura de Lula para que seu candidato possa crescer. Até nisso uma reforma política ajudaria.
Ajudaria em que sentido?
Porque não precisaríamos compor aqui maiorias como hoje. Se você tem lista e fidelidade partidária, por exemplo, consegue compor dentro de uma afinidade partidária. E isso ajuda muito na hora da votação dos temas que interessam para o país, mesmo porque quadros mais qualificados serão eleitos. Os parlamentares hoje precisam responder de imediato a reivindicações mais clientelísticas de sua base. Por quê? Porque eles não são eleitos por uma lista partidária. Um foi eleito em um nicho aqui, o outro ali, como os deputados evangélicos, mas não chegaram ao Congresso pelos partidos. Foram eleitos pelas igrejas.
Como o governo vai recompor sua base aliada no Congresso?
O Aldo não vai fazer jogo nenhum do governo. Ele não vai fazer isso. Mas também não vai agir como presidente de oposição.
Mas o que tem de mudar prioritariamente na relação do Executivo com o Legislativo?
O governo tem de conversar mais com o Parlamento. O próprio presidente da República tem de conversar mais com parlamentares. O presidente conversa pouco. Tem de conversar mais. O governo tem de estar mais presente. Eu até sugeriria que o Jaques Wagner (ministro de Relações Institucionais) passasse mais tempo aqui dentro do Congresso do que no Palácio, para atender no que for possível as reivindicações dos parlamentares. Tem de conversar. As pessoas reclamam muito disso. Outra coisa: tem que atender à liberação das emendas parlamentares. São recursos que se destinam a melhorar a qualidade de vida da população. Se há emendas mal postas ou exageradas, não vamos liberar.
Falta ao governo dar mais transparência na liberação das emendas parlamentares?
Eu acho que sim. Pelo amor de Deus, são parlamentares. Está na lei: eles têm o direito de emendar o Orçamento. Se existe alguma emenda duvidosa, tudo bem. Mas não podemos generalizar que todas são problemáticas.
Alguns parlamentares reclamam que o governo retém esses recursos, mas que, na hora de uma votação importante, libera tudo. Não está aí a deturpação?
É isso que estou dizendo. É preciso fazer uma programação e liberar esses recursos mesmo que aos poucos. O problema é que o governo não libera. É verdade. E é uma reclamação justa dos parlamentares. O governo vai ter de mudar sua relação com o Congresso nesse ponto. Não adianta, tem de liberar. Agora, se há receita, não há receita, se a obra vai ser executada ou não, isso é outro problema.
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