Veja
Compromisso com o futuro (artigo Dilma Rousseff)
Protagonista de um extraordinário enredo de progresso e amadurecimento, o Brasil está diante de um desafio imposto a poucos países. Manter a rota virtuosa traçada nos últimos anos ou pôr um freio às recentes conquistas sociais e econômicas? Promover o salto ainda maior, esperado por uma população que voltou a sonhar alto, ou retroceder aos passos lentos e sofríveis das duas décadas anteriores? Os que me conhecem sabem que, diante dessas indagações, eu fico com as primeiras respostas.
Não se trata de ver o país como uma escala binária entre o certo e o errado, entre o bom e o mau, entre o bonito e o feio. Trata-se de reconhecer a vitalidade de um momento definidor dos rumos do Brasil. Há vinte anos batendo às portas do clube dos países desenvolvidos, estamos a um passo de atravessar o seu umbral. Com estabilidade. Sem sobressaltos.
Poucas nações tiveram a oportunidade posta à disposição do Brasil. Estamos diante de uma versão nacional do Tratado de Kanagawa, firmado entre Japão e Estados Unidos, em 1854, que permitiu aos japoneses iniciar a grande virada em sua industrialização. Ou algo como a etapa seguinte à Guerra da Secessão nos Estados Unidos, quando norte-americanos se viram sob o acúmulo crescente de capital, expansão territorial e revolução nos transportes, a ponto de ultrapassarem os britânicos como a maior economia mundial. Talvez haja semelhança com o passo fundamental das reformas chinesas, iniciadas ao fim da década de 1970 por Deng Xiaoping, que impulsionaram a arrancada capaz de trazer à China a marca do gigante.
Resguardadas as circunstâncias históricas específicas de cada trajetória de desenvolvimento, o Brasil vive o seu momento. Sem se resignar à condição de cópia melhorada, mera reprodução de modelos importados, está construindo sua própria história, a partir das suas necessidades, singularidades e esperanças. Buscamos enterrar, de uma vez por todas, uma marca que se repetia de maneira exasperante: a enorme distância entre o falar e o fazer, entre o discurso e a realidade.
Com a casa em ordem, Serra vai à luta
Ungido há menos de dez dias candidato oficial do PSDB à Presidência da República, José Serra não poderia encontrar ambiente mais propício para iniciar sua campanha. Duas novidades contribuem para isso. A primeira é que os tucanos estão animadíssimos – o que havia muito tempo não ocorria. Desde 2003, quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso colocou a faixa presidencial no pescoço do petista Luiz Inácio Lula da Silva, os militantes do PSDB passaram a amargar uma espécie de fossa de fundo existencial. A saída do poder jogou o partido numa crise de identidade em que ninguém sabia ao certo que bandeiras defender ou que líderes seguir.
Na semana passada, o PSDB parecia ter reencontrado o seu eixo. Ao barulhento lançamento da candidatura de Serra, acorreram mais de 6 000 militantes do partido. Vindos de todos os estados, carregavam bandeiras, espremiam-se uns contra os outros e cantavam sem parar no amplo auditório alugado pela sigla. A maioria usava camisetas nas cores azul e amarelo, algumas com inscrições como “temos orgulho do que criamos”. Era um clima diametralmente oposto ao registrado nos últimos encontros do partido. O motivo da animação é que o PSDB, finalmente, tem um projeto definido, aprovado e defendido por todos na sigla: eleger José Serra presidente da República. E eis aí o segundo elemento a pavimentar o caminho de Serra nessa campanha. Seu partido vai unido para a briga. E isso, tratando-se de PSDB, é outra grande novidade.
O próprio Serra é o maior responsável pela unificação do partido. Nas duas últimas eleições presidenciais, o PSDB marchou dividido. Em 2002, a primeira candidatura de Serra à Presidência só se consolidou ao custo de engalfinhamentos com tucanos diversos, como o ex-ministro Paulo Renato e o senador Tasso Jereissati. Em 2006, Geraldo Alckmin foi o escolhido – mas também só depois de emparedar Serra e toda a cúpula de seu partido. Essas contendas internas costumavam causar fraturas que custavam a cicatrizar. Como resultado, cada um remava para um lado e o barco tucano não saía do lugar.
Ele agora cobra 12 milhões
Desde que ajudou a eleger o presidente Lula, em 2002, uma maldição se abateu sobre o publicitário baiano José Eduardo Cavalcanti de Mendonça, o Duda Mendonça. Supersticioso e excêntrico, mas celebrado como um mago das urnas até pelos adversários mais críticos, Duda foi preso dois anos depois da eleição acusado de participar de um campeonato de briga de galos – hobby ilegal que ele praticava no Rio de Janeiro, mas que era pinto diante do que estava por vir. Em 2005, em depoimento à CPI que investigou o escândalo do mensalão, Duda admitiu a participação em um crime muito mais grave. Ele confessou ter recebido 10,5 milhões de reais do PT em uma conta clandestina nas Bahamas, como parte do pagamento pelo trabalho na campanha do presidente Lula. Supostamente decepcionado com a sujeira na política e réu por lavagem de dinheiro e evasão de divisas, Duda, na época, prometeu abandonar as campanhas eleitorais, mas logo mudou de ideia. Após ensaiar um retorno como consultor em 2006, o marqueteiro elegeu 2010 o ano de sua volta ao mundo das refregas eleitorais. Duda já se insinuou para dois presidenciáveis (Dilma Rousseff e Ciro Gomes), negocia com sete candidatos a governador e já está trabalhando para um deles. Entre os que pagarão pelos seus talentos deve figurar até mesmo o presidente da CPI que o investigou, o senador petista Delcídio Amaral.
O marqueteiro só não voltará na crista da onda porque foi vetado pelo presidente Lula para comandar a campanha de Dilma Rousseff, com quem chegou a se encontrar no fim do ano passado. Sua área de influência, porém, está longe de ser desprezível, e seu passe, apesar de todos os problemas, parece que só se valorizou depois do escândalo. O pacote de campanha estadual está sendo oferecido por 12 milhões de reais – o dobro do que cobram outras estrelas do ramo e muito mais do que custou oficialmente a campanha presidencial de 2002 (7 milhões de reais). Há duas semanas, Duda esteve no Maranhão gravando os comerciais regionais do PMDB. O trabalho já é parte do pacote negociado com a governadora Roseana Sarney, que disputará a eleição em outubro. Caro? “Não conheço os valores porque a contratação foi negociada pelo partido. O governo não tem nenhuma relação com essa ne-gociação”, garante o secretário de Comunicação de Roseana, Sergio Macedo.
Por um Rio sem favelas
Poucos especialistas falam com tanta autoridade sobre a favelização nas metrópoles brasileiras quanto o economista carioca Sérgio Besserman, 52 anos. As últimas estatísticas disponíveis sobre as favelas no país foram produzidas sob sua gestão (1999-2002) como presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Suas opiniões sobre o assunto dão aquele banho de racionalidade que costuma desconcertar o senso comum. Besserman sustenta que retirar os barracos dos morros no Rio de Janeiro é uma solução que, se implementada, vai trazer ganhos econômicos e sociais para toda a população. Diz ele: “A questão precisa ser discutida com rigor lógico, a salvo das influências de ideologias e do romantismo”.
A prefeitura e o governo do estado do Rio de Janeiro começaram, na semana passada, a retirar barracos de áreas de risco. Por que nenhum governante fez isso a tempo de evitar tragédias?
Por um misto de incompetência e demagogia. No Rio de Janeiro, a remoção de favelas passou a ser um grande tabu, sustentado por um assistencialismo barato segundo o qual o estado deve prover tudo aos pobres dos morros – ainda que sua permanência ali possa pôr a própria vida em risco e acarretar prejuízos à cidade como um todo. A ideia absurda embutida nesse raciocínio é a de que quem vive em favela é um cidadão especial, que não precisa se submeter nem à Constituição e não tem os mesmos deveres dos outros brasileiros. Sob essa ótica obtusa, remover favelas é visto como uma afronta aos direitos dos mais necessitados. Essa bobagem demagógica tem suas raízes no populismo que há décadas contamina a política fluminense. O inchaço das favelas do Rio é resultado da combinação desses fatores.
Como o populismo contribuiu para a proliferação das favelas?
Historicamente, ele foi a mola propulsora das favelas fluminenses, tendo como seu principal expoente o governador Leonel Brizola, na década de 80, quando se chegou ao auge de proibir a entrada de policiais nas favelas. O resultado foi um surto de ocupações irregulares. Sem polícia, foi dado o sinal verde para o banditismo. Sob o pretexto absurdo de que havia uma dívida social a ser quitada, foram concedidos aos moradores das favelas direitos inacessíveis aos demais brasileiros pobres ou ricos. Enquanto isso, os populistas iam esparramando nos morros seus currais eleitorais, ganhando votos em troca de tijolos, cimento, dentaduras e bicas-d’água. Isso explica a perpetuação dessa classe de políticos em uma sociedade que se pretende moderna. Eles e as favelas estão aí como símbolos do atraso. Quando alguém fala em remoção de barracos, são justamente eles os primeiros a levantar a voz contra. Claro, não querem perder seus currais eleitorais.
O Estado é cúmplice
O pedreiro baiano Ademar Jesus da Silva, de 40 anos, atirou num homem pelas costas, fugiu para o interior de Goiás, forjou uma nova identidade e, antes de ser capturado pela polícia há cinco anos, ainda teve tempo de molestar duas crianças. Preso por estupro, reduziu-se a apenas um entre os 470 000 internos que compõem a miserável massa humana dos cárceres brasileiros. Solto por apresentar “bom comportamento” e por ter cumprido um sexto de sua pena, revelou-se um psicopata. Saiu da penitenciária da Papuda às vésperas do Natal e, uma semana depois, voltou a estuprar crianças – só que, desta vez, não houve sobreviventes. Matou primeiro um adolescente de 13 anos. Nas semanas seguintes, agindo sempre com a mesma perfídia, ele atraía garotos a um matagal em Luziânia, a 70 quilômetros de Brasília, onde os violentava e, ato contínuo, assassinava-os a golpes de pau, martelo ou enxada. Há dez dias, a polícia finalmente conseguiu prender Ademar, que confessou os crimes. Os terríveis atos cometidos por ele destruíram seis famílias. Ao resto do país, confrontado com tal demonstração de ferocidade, sobrou somente a triste e necessária pergunta: não era possível ter evitado essa matança?
Como costuma acontecer numa tragédia dessa proporção, ninguém aceitou a responsabilidade pela dor que agora dilacera os familiares das vítimas. Sim, o pedreiro Ademar executou os adolescentes, e certamente agora pagará por isso, mas ele não estava sozinho naquele matagal. A terrível verdade moral é que estavam lá também as polícias da Bahia e de Goiás, que falharam em não prender o pedreiro quando ele cometeu outros crimes; estavam lá ainda os três psicólogos e a psiquiatra que avaliaram o estado mental de Ademar durante o processo de soltura e não descobriram que ele representava um perigo para as demais pessoas; e, por fim, o juiz do caso, que acabou por soltá-lo, apesar das evidências de que se tratava de um perigoso estuprador. Todos são agentes do estado e, embora possam ressaltar que cumpriam a lei, pressionados pela necessidade de esvaziar as desumanas prisões brasileiras, não hesitaram em assinar os papéis que devolveram o pedreiro à vida em sociedade. O caso do maníaco de Goiás traz à luz, portanto, o putrefato estado do sistema prisional do país – que acumula mais presos do que pode, isolando-os em cubículos fétidos, muitas vezes por mais tempo do que deveria, não os reeduca e, fosse isso pouco, solta muitos deles sem saber se têm condições de retornar ao convívio social.
Sobe para dez pontos vantagem de Serra sobre Dilma, segundo Datafolha
O pré-candidato do PSDB à Presidência José Serra amplia para dez pontos a sua vantagem sobre Dilma Rousseff, do PT, aponta uma pesquisa do instituto Datafolha que será publicada neste fim de semana.
No último levantamento realizado pelo mesmo instituto, divulgado no dia 27 de março, a vantagem de Serra era de nove pontos – em fevereiro, o ex-governador de São Paulo tinha apenas quatro pontos de vantagem sobre Dilma, a segunda colocada nas pesquisas.
IstoÉ
Um milionário inglês no mensalão do DEM
Morando há 11 anos no País, o milionário Benhnam Baghai Sangari frequenta há tempos as mais famosas colunas sociais, ao lado de governadores e prefeitos. Nascido no Irã e inglês naturalizado, ele acaba de virar réu no Tribunal de Justiça de Brasília, acusado de envolvimento com a quadrilha do Mensalão do DEM. Ben, como gosta de ser chamado, fechou com o ex-governador José Roberto Arruda um contrato ilegal de R$ 289 milhões, sem licitação, para vender às escolas do DF kits de ciência fabricados por sua empresa, a Sangari. O esquema fraudulento foi revelado pelo delator Durval Barbosa.
Na ação civil pública que impetrou no Tribunal de Justiça do DF, o promotor Vetuval Martins concluiu pela ilegalidade do convênio de Ben com o governo local. O promotor diz que há “fortes indícios de acordos escusos” antes das eleições de 2006 entre Sangari e Arruda. “Não restam dúvidas quanto ao conluio dos envolvidos para a consecução do objeto ilegal e imoral, e consequentemente enriquecimento pessoal à custa dos cofres públicos”, diz o promotor. Nas reuniões, o grupo combinou de vender os kits escolares, “com a promessa de que o retorno seria compensador para a campanha de Arruda”, diz Barbosa. Os depoimentos confirmam as suspeitas. O diretor de programação da Secretaria de Planejamento do DF, Leolino Cezar Campos, disse que fez questionamentos sobre o contrato com a Sangari. “As especificações técnicas do termo de referência estão ausentes ou são genéricas, diz Campos.
As várias faces de Brasília (editorial)
Cidade de contrastes, a capital federal chega à meia-idade com um projeto que, por um lado, consagrou a interiorização do desenvolvimento no País, mas por outro marcou em definitivo o imenso fosso de paradoxos sociais que ainda hoje rege a vida dos brasileiros. Brasília da expansão desordenada de suas cidades-satélites – algumas convertidas em verdadeiras favelas – e do modelo de superquadras para a elite de moradores do seu Plano Piloto segue como palco de convivência encenada entre ricos e pobres, entre poderosos e comandados. Entre os que podem e os que dependem. E cada um deles, no seu papel, irradia para o resto do País a imensa dívida de cidadania ainda não quitada, a ferida da desigualdade que não cicatriza. Como diz agora o mestre Oscar Niemeyer, que desenhou suas curvas e realizou o sonho: “Brasília perdeu o sentido da solidariedade.” A crítica, feita em entrevista exclusiva à ISTOÉ na pág. 53, deve servir de alerta aos governantes porque tem a força de uma mensagem de quem entende a cidade nas suas entranhas.
Na banda mais positiva da trajetória de 50 anos, Brasília cumpriu o papel vital de viabilizar o progresso mapa adentro. Se hoje o País tem o Cerrado como celeiro do agronegócio, que tomou estatura e conquistou o mundo, Brasília foi a alavanca. Com a capital plantada no coração do nada, se adiantou um processo de integração regional que, do contrário, demoraria décadas. Foi uma epopeia extraordinária, inacreditável e corajosa do então presidente Juscelino Kubitschek. Brasília virou realidade em seu mandato, para espanto dos que não acreditavam.
Aluga-se um partido
Uma metamorfose ambulante. A definição cabe perfeitamente ao Partido Progressista, o PP. Controlado com mãos de ferro pelo ex- governador de São Paulo Paulo Maluf até o início da década de 90, o antigo PDS, hoje PP, trocou três vezes de nome em apenas dez anos. Tornou-se PPR, depois do impeachment de Collor, virou PPB, quando passou a dar sustentação ao governo Fernando Henrique Cardoso no Congresso, mas bastou a ascensão de Lula ao poder, em 2003, para o partido escolher novo nome e posição. Agora, às vésperas de outra eleição presidencial, não será surpresa se o PP mudar de canoa outra vez. Embora integre, hoje, a base de Lula no Legislativo e conte com um ministro no governo, o das Cidades, Marcio Fortes, os dirigentes da legenda têm intensificado, nos últimos dias, as conversas com o PSDB para compor a chapa tucana com a vaga de vice de José Serra.
Só nas duas últimas semanas, expoentes progressistas participaram de reuniões com o deputado Jutahy Jr. (PSDB-BA) e com o presidente nacional tucano, senador Sérgio Guerra (PSDB-PE). Entre os nomes do PP comentados para a vaga de vice de Serra estão o do presidente do PP, Francisco Dornelles (PPRJ), do ex-ministro da Agricultura de FHC, Pratini de Moraes, e do ex-ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan. O nome mais forte é o de Dornelles. O próprio Serra foi procurado por um emissário do partido. Para o PSDB, a possível indicação de Dornelles para vice é encarada como garantia de que o ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves irá entrar de corpo e alma na campanha. Amigo pessoal do mineiro, Dornelles é sobrinho de Tancredo Neves, avô de Aécio. “Com a recusa do Aécio em ser vice, o nome ideal seria o do Dornelles”, diz o deputado Bruno Rodrigues (PSDB-PE).
PT de Minas não se rende
Apesar das fortes pressões do presidente Lula, o PT de Minas Gerais não desiste de lançar candidatura própria ao Palácio da Liberdade. Além de aceitar as inscrições das pré-candidaturas dos ex-ministros Patrus Ananias e Fernando Pimentel, o partido decidiu realizar uma prévia seletiva na qual consultará a cúpula petista e também alguns representantes da base sindical. Um dos critérios é o poder de aglutinação. Enquanto aguarda a consulta, Ananias percorre o interior do Estado e trabalha sua candidatura “25 horas por dia”. Seus fiéis escudeiros garantem que, no momento, a aliança com o PMDB está fora de cogitação.
Longe do governo e perto de Dilma
O PT quer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva longe do Palácio do Planalto nas semanas que antecedem o primeiro turno das eleições presidenciais. A ideia, que chegou a ser descartada por Lula, voltou a ganhar força nas últimas semanas e lideranças do partido iniciaram um esquema orquestrado de pressão para convencer o presidente a embarcar de corpo e alma na campanha de Dilma Rousseff. Debruçados sobre as últimas pesquisas de intenção de voto, dirigentes do PT argumentam que Lula pode ser um “trunfo de última hora” para Dilma liquidar a eleição já no primeiro turno. Hoje, pela lei eleitoral, Lula só pode participar de eventos partidários ao lado de Dilma nos fins de semana ou fora do horário do expediente. Antes resistente a deixar o governo, Lula já admite discutir a possibilidade, convencido de que pode se transformar, de fato, numa carta na manga da candidata petista na reta final da corrida à Presidência. O presidente aceitou reconsiderar a ideia, vista por ele como descabida há algumas semanas, por conta da decisão do vice-presidente, José Alencar, de não sair candidato e estar apto a assumir a Presidência em caso de sua licença.
No PT, um dos principais defensores do projeto é o ex-ministro José Dirceu. Na quinta-feira 15, Dirceu tratou do assunto em reuniões privadas com correligionários. Nos bastidores, o ex-ministro tem sido um dos principais articuladores da campanha de Dilma nos Estados. Amigo pessoal de Lula, o ex- governador do Acre, Jorge Viana, reconhece que, “se for necessário”, o presidente sairá mesmo a campo. “A lei brasileira permite que o presidente possa participar da campanha. Com Alencar permanecendo como vice, passamos a contar com essa possibilidade”, disse Viana em entrevista à ISTOÉ. “Lula tem saúde, disposição e pode ser mesmo um diferencial”, acrescentou o petista. “Imagina o Lula andando na rua pedindo voto, entregando santinho? Imagina o que vai representar para a campanha. É um cabo eleitoral que todos nós queremos”, afirma o senador Delcídio Amaral (PT-MS). O líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), admite que o tema “licença de Lula” tem sido recorrente no PT. “Sei que tem gente falando (na licença). Não sei se vai precisar. Dilma tem todas as condições de crescer mais que Serra, embora ache cedo para falar em vitória no primeiro turno”, disse Vaccarezza.
Católicos divididos
Uma transformação política silenciosa vem ocorrendo no seio da Igreja Católica do Brasil, cujo papel político nas últimas décadas esteve intrinsecamente ligado ao Partido dos Trabalhadores. É cada vez mais evidente o fim da hegemonia do PT entre as lideranças religiosas e os leigos que atuam nos movimentos sociais ligados à Igreja Católica. Espécie de caixa de ressonância do petismo nas camadas mais pobres da sociedade, boa parte das chamadas pastorais sociais resolveram sair da clausura e proclamar o rompimento com o governo Lula. Com ataques duros direcionados ao Palácio do Planalto, muitas dessas organizações agora apostam suas fichas em outras legendas. Considerada nos bastidores da Igreja como o maior racha político depois da redemocratização do País, a divisão dos católicos ganhará visibilidade a partir do dia 4 de maio, em Brasília, quando mais de 300 prelados brasileiros estarão reunidos na 48ª Assembleia- Geral dos Bispos do Brasil, evento anual tido como o mais importante encontro da cúpula católica do País. “É o fim de uma hegemonia política, os católicos ficaram mais maduros”, entende dom Cristiano Jakob Krapf, bispo de Jequié (BA). “A Igreja nunca esteve tão dividida”, admite dom Tomás Balduíno, bispo emérito de Goiás, um dos fundadores da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
A portas fechadas, a reunião dos bispos debaterá durante nove dias a conjuntura política nacional e, prioritariamente, o novo papel das comunidades eclesiais de base (CEBs) – grupo interno da Igreja que surgiu na década de 60 incentivado pelo Concílio Vaticano II para ampliar a leitura dos textos litúrgicos. No Brasil, alinhadas à teologia da libertação, as CEBs ganharam musculatura lutando contra a ditadura militar. Assim como o sindicalismo, do qual veio o presidente Lula, as comunidades eclesiais de base tiveram um papel fundamental na construção e fundação do PT. Como braço dos petistas dentro da Igreja, elas assumiram funções importantes em todas as eleições de Lula e, claro, na sua chegada ao poder.
CartaCapital
O que será? (Mino Carta)
Proponho um teste: quem pronunciou a seguinte sentença? “Não se deve pensar no Estado da inércia, da improdutividade. O Estado deve ser forte, não obeso. Forte em seu papel de cumprir as funções básicas e ativar o desenvolvimento, a justiça social e o bem-estar da população.” Respostas: a) Karl Marx; b) Antonio Gramsci; c) José Serra; d) Lenin; e) Dilma Rousseff.
Não obrigo os leitores a procurar na última página desta edição a resposta correta, colocada de cabeça para baixo. Digo logo: resposta C. A apreciação do pré-candidato tucano à Presidência da República consta da entrevista que ele deu à Folha de S.Paulo, publicada no domingo 11. Excluído do teste, obviamente, o público do jornal.
Talvez haja quem se surpreenda com uma declaração que coincide, ao menos na essência, com algumas anteriores feitas pela pré-candidata Dilma Rousseff. Os meus afáveis botões murmuram em surdina que a mim não cabe surpresa. Com sua definição a favor do Estado ativo (o adjetivo é dele), Serra foi certamente sincero. Outra situação que não justifica espantos é o entusiasmo da mídia nativa com o lançamento da candidatura do ex-governador, sábado 10. De volta aos botões, eles sentenciam: é a beatificação em vida.
Foi de fato uma apoteose, com o condimento das lágrimas de Fernando Henrique e da súbita empolgação de Aécio Neves. Sobram aspectos da cobertura midiática de compreensão intrincada, se não francamente impossível. Se Dilma fala em Estado forte, o pânico coa das páginas e do vídeo. Em compensação, a Serra tudo se permite. Será que editorialistas, colunistas, articulistas, repórteres não levam Serra a sério quando usa argumentos banidos do catecismo dos herdeiros do udenismo velho de guerra? E apostam então na ação concentrada do tucanato para conter os arroubos de um ex-cepalino ainda sob contágio?
O maior desafio do século
“A transição para uma economia de baixo carbono é o desafio do século.” Foi assim, sem rodeios, que a senadora e pré-candidata à Presidência da República Marina Silva iniciou sua participação na mais recente edição dos Diálogos Capitais, o seminário organizado por CartaCapital e realizado na última segunda-feira 12. Apoiado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e pelo jornal Brasil Econômico, o evento foi patrocinado pelo Banco Santander e pela Vale. Mais de 900 espectadores lotaram o Teatro da PUC, para discutir “O Brasil e a transição para uma economia de baixo carbono”.
O encontro marcou o lançamento do segundo suplemento especial de CartaCapital, o Carta Verde, com conteúdo da nossa parceira Envolverde e da revista britânica Green Futures. “A união com CartaCapital significa maturidade editorial”, comentou Dal Marcondes, editor da Envolverde. “Na edição publicada, optamos por trazer experiências empresariais. São dez casos que mostram que a sustentabilidade dá certo, dá lucro. E lucro limpo.”
O consultor editorial de CartaCapital, Luiz Gonzaga Belluzzo, explicou os motivos da aproximação com a Envolverde e com a Green Futures, representada no evento por Ana Nassar, da Embaixada Britânica no Brasil. “CartaCapital acredita nas causas que são comprometidas com o bem-estar e a felicidade do homem.”
Além de Marina Silva, participaram da mesa de debates o professor da PUC Ladislau Dowbor; o diretor de desenvolvimento e implantação de projetos de capital, sustentabilidade e relações internacionais da Vale, Guto Quintella; a superintendente de Desenvolvimento Sustentável do Banco Santander, Linda Murasawa; e o assessor especial do Ministério do Meio Ambiente, Tasso Azevedo.
Enfim, um beato homossexual
Como saber se um prelado é hétero ou homo desde que fez voto de castidade? Há qualquer coisa de muito intrigante na declaração do secretário de Estado do Vaticano, cardeal Tarcisio Bertone: “Numerosos psiquiatras e psicólogos demonstraram que não existe ligação entre celibato e pedofilia, mas muitos outros demonstraram que existe entre homossexualidade e pedofilia”.
Pronunciada no começo da semana, atiçou um vespeiro global. Das organizações e associações gays, de boa parte da mídia, até da chancelaria francesa erguem-se protestos, a ponto de provocar na quarta um comunicado em que o Vaticano pretende esclarecer: Bertone apenas se referia aos homossexuais de batina. Com a seguinte revelação: dos 3 mil casos de pedofilia registrados pelas autoridades eclesiásticas (e rigorosamente mantidos sob sigilo) nos últimos 50 anos, 10% são de pedofilia stricto sensu enquanto 90% são, a bem da santíssima verdade, de efebofilia, ou seja, envolvem adolescentes. Reminiscências gregas. Destes, 60% correspondem a práticas homossexuais e 30%, hétero.
O que não fica esclarecido é como a Igreja consegue catalogar com tamanha precisão as atividades sexuais dos seus padres, dos quais os fiéis esperam outros gêneros de comportamento. Mas não haverá de ser por acaso que o próprio Bento XVI viaja para a Inglaterra em setembro próximo para a beatificação do cardeal teólogo John Henry Newman, o qual pediu para ser enterrado ao lado do amigão reverendo Ambrose St.-John. Quanto este morreu, o cardeal confessou que sua dor era igual à de um marido, ou de uma esposa. Vale assinalar ainda o surgimento na Áustria de uma associação filantrópica destinada a proteger e educar os filhos abandonados por padres heterossexuais. Uns e outros seriam bastante numerosos.
Economia de bombas
A cúpula de Segurança Nuclear em Washington nos dias 12 e 13 de março deve ser entendida, antes de mais nada, como uma tentativa dos EUA e aliados, de manter o status quo geopolítico ao menor custo militar e econômico, por meio de um concerto de potências nucleares. Menos ruim, é provável, que o unilateralismo belicoso do primeiro governo Bush júnior, mas continua a ser um esforço no sentido de salvar uma hegemonia em risco.
A preparação incluiu um acordo entre Washington e Moscou sobre redução de arsenais nucleares e uma revisão da estratégia nuclear dos Estados Unidos, segundo a qual o país, mesmo atacado com “armas de destruição em massa”, promete não usar armas nucleares contra nações que não as possuam se – a ressalva é importante – estes cumprirem o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP). Nenhuma das duas decisões é exatamente o que parece. Ao contrário do acordo nuclear anterior, entre Bush pai e Mikhail Gorbachev, o novo nem sequer exige que as ogivas postas fora de serviço sejam de fato inutilizadas: podem ser deixadas de reserva e reativadas em questão de dias, se a conjuntura mudar.
Da mesma forma, se a conjuntura mudar, a “nova postura nuclear” de Obama pode ser alterada de uma penada, como se fez em relação a Bush júnior. Além de ser um retrocesso em relação a posições anteriores. Antes de 2002, quando o Júnior anunciou a doutrina que fez do “eixo do mal” um alvo potencial de bombas atômicas – o que levou a Coreia do Norte a expulsar os inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), retirar-se no ano seguinte do TNP e detonar sua bomba atômica em 2006 –, a posição dos EUA era que armas nucleares seriam usadas apenas contra potências como China e Rússia.
Época
Nelson Jobim: “Com Dilma ou Serra, a defesa não muda”
O ministro da defesa, Nelson Jobim, desfruta uma situação única no governo Lula. Homem de confiança do presidente numa das áreas mais sensíveis da Esplanada, Jobim mantém estreitas relações com o candidato da oposição ao Planalto, José Serra (PSDB). A dupla militância permite a previsão de que, em assuntos de Defesa, o Brasil manterá as diretrizes atuais caso a eleição seja vencida por Serra ou pela ex-ministra Dilma Rousseff. “Fiz reuniões com PT, PMDB, DEM e com o ex-presidente Fernando Henrique”, diz Jobim, ao explicar as mudanças na área militar, como a subordinação ao poder civil, aprovadas no Congresso. Nesta entrevista a ÉPOCA, Jobim faz um balanço dos acordos internacionais do país e das medidas para tentar organizar a aviação no Brasil.
Como vai ficar a defesa nacional do Brasil no futuro?
Os políticos e os governos civis viam a defesa com certa distância. Na época da Constituinte, a defesa se confundia com repressão política. Com isso, militares tinham de tomar certas decisões que, a rigor, eram decisões de governo civil. Exemplo: quais as hipóteses de emprego (das Forças Armadas) que politicamente interessam ao país? Isso é um misto de política internacional com defesa. Cabe ao poder civil definir o que os militares devem fazer em termos de defesa. Os militares decidem a parte operacional.
Isso aconteceu no governo Lula?
Tudo é um processo. Não acontece assim, bum! Começou no governo Fernando Henrique, com a criação do Ministério da Defesa, em 1999, nas condições possíveis naquele momento. No governo Lula, avançou-se um pouco no início, com o ministro Viegas (José Viegas, primeiro ministro da Defesa de Lula). Os avanços mais doutrinários são consolidados pelo vice-presidente (José Alencar) que o sucedeu e, depois, pelo Waldir Pires. Quando assumi, decidi que precisávamos realizar uma mudança de concepção para dar mais musculatura ao Ministério da Defesa.
O senhor, então, não espera grandes mudanças se o próximo presidente for Dilma Rousseff ou José Serra?
Eu não espero.
A Defesa está acima das questões políticas?
Tudo que estou falando foi discutido com todos os partidos. Fiz reuniões com o PT, o PMDB e com o DEM. Fui ao Instituto Fernando Henrique Cardoso. Estava cheio de gente lá, todos os ministros dele, todos meus colegas, e várias outras pessoas, intelectuais também.
STF publica acórdão do julgamento de Cesare Battisti
O Diário de Justiça Eletrônico do Supremo Tribunal Federal traz na edição desta sexta-feira (16) o acórdão do julgamento da extradição do italiano Cesare Battisti, preso no Brasil desde 2007. Redigido pelo ministro Cezar Peluso, relator do processo, o documento reconhece que a autorização de extraditar Battisti decidida pelo Tribunal no fim do ano passado não vincula o presidente da República. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem, portanto, a palavra final sobre o caso. Lula já havia declarado que aguardaria o acórdão para tomar uma decisão.
Battisti foi condenado à prisão perpétua na Itália acusado de ter cometido quatro assassinatos no final dos anos de 1970. O italiano foi julgado à revelia em 1993, quando estava refugiado na França. Fugiu para o México e, depois, para o Brasil. Preso no Rio de Janeiro, Battisti solicitou refúgio político ao Comitê Nacional para os Refugiados (Conare). De início, o pedido foi negado. Ao analisar o recurso, o então ministro da Justiça, Tarso Genro, concedeu o refúgio. O argumento foi o de que Battisti não teve respeitado o direito à ampla defesa no processo que o condenou.
Apesar da decisão que cabe a Lula, o chefe do Executivo terá de observar o tratado celebrado entre os governos do Brasil e Itália, que prevê a recusa no envio somente em casos de perseguição política. Para manter o italiano no país, porém, o presidente terá que buscar uma justificativa diferente da que foi usada pela defesa de Battisti no processo analisado pelo Supremo.
Dois consórcios vão disputar a hidrelétrica Belo Monte
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) informou nesta sexta (16) que dois consórcios disputarão o leilão da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. O consórcio Norte Energia, que será formado por nove empresas, e o consórcio Belo Monte Energia, por seis.
O primeiro consórcio terá participação da Chesf com 49,98%, e será composto ainda pela Construtora Queiroz Galvão (10,02%); Galvão Engenharia (3,75%); Mendes Júnior (3,75%); Serveng-Sivilsan (3,75%); J Malucelli Construtora (9,98%); Contern Construções (3,75%); Cetenco Engenharia (5%) e Gaia Energia e Participações (10,02%). O segundo, Belo Monte Energia, é liderado pela Andrade Gutierrez, com 12,75%, e formado por Vale (12,75%); Neonergia (12,75%); Companhia Brasileira de Alumínio (12,75%); Furnas (24,5%); e Eletrosul (24,5%). Essas empresas depositaram garantias no valor de R$ 190 milhões, que corresponde a 1% do investimento total da usina estimado em R$ 19 bilhões.
Também nesta sexta, a Aneel divulgou nota comunicando que o leilão de Belo Monte será mantido no dia 20 de abril. A medida se baseou em decisão tomada no mesmo dia pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que derrubou a liminar que impedia o leilão. A liminar também cassava a Licença Prévia do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama), que fica mantida. O Ministério Público Federal havia conseguido impedir o leilão por meio dessa liminar cassada hoje. O leilão está marcado para o próximo dia 20.
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