IstoÉ
O abandono de Dilma
Quando Dilma Rousseff assumiu o comando do País, quase quatro anos atrás, ela reunia o apoio de 17 partidos, o que lhe assegurava votos favoráveis no painel eletrônico da Câmara de pelo menos 306 dos 513 deputados. Era a maior base aliada de um presidente em início de mandato desde a redemocratização. Às vésperas da campanha pela reeleição, o quadro de alianças nem de longe lembra aquele desfrutado pela então presidenta recém-eleita. Em queda nas pesquisas e com a popularidade em xeque, Dilma Rousseff assiste a uma debandada de partidos da sua coligação. O primeiro a pular fora da nau governista foi o PTB, que chegou a participar de um jantar no Palácio da Alvorada oferecido por Dilma e saiu de lá com a promessa de selar a aliança, mas pegou de surpresa a todos no Planalto ao anunciar o rompimento às vésperas da convenção do PT. Depois, veio o anúncio do apoio de Sérgio Cabral, aliado histórico de Dilma no Rio de Janeiro, a Aécio Neves (PSDB), principal candidato de oposição.
Na última semana, para evitar a deserção de novas legendas, o que lhe custaria preciosos minutos na televisão durante o horário eleitoral, o governo teve de recorrer ao fisiologismo e ao velho e surrado toma lá dá cá. Só que, desta vez, Dilma precisou aprimorar o método. Para agraciar o PR, fez uma das maiores concessões a um aliado desde que assumiu o poder: trocou o comando de dois ministérios, o dos Transportes e o de Portos, setores considerados fundamentais para o andamento dos projetos de infraestrutura do governo. Com isso, César Borges deu lugar no Ministério dos Transportes a Paulo Sérgio Passos. Como compensação, assumiu a Secretaria de Portos, na vaga deixada por Antônio Henrique Silveira. Até então, Dilma resistia a promover alterações nas áreas, mas teve de ceder temendo uma defecção de partidos ainda maior e de olho no tempo de tevê durante a eleição. Contabilizados os apoios oficiais de PMDB, PR, PDT, Pros, PSD e provavelmente o do PP, Dilma terá 11 minutos e 25 segundos em cada bloco de 25 minutos na propaganda eleitoral, cerca de 45% na fatia do tempo.
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Com as concessões aos aliados, o governo almejava em primeiro lugar assegurar o maior naco de tempo na televisão. Conseguiu. O outro objetivo, no entanto, que era o de contar com o apoio da máquina partidária, ou seja, com o trabalho e o esforço de prefeitos e governadores dessas legendas para reeleger Dilma, dificilmente será alcançado. O PR, por exemplo, segue dividido na campanha, uma vez que grande parte dos deputados federais promete declarar apoio a Aécio Neves (PSDB). Na prática, mesmo se rendendo ao preço imposto pela cúpula do PR, Dilma não conseguirá a adesão das lideranças regionais do partido.
O mesmo deve ocorrer no PP, cuja convenção foi conturbada e parou na Justiça. O presidente da legenda, Ciro Nogueira (PI), precisou usar o poder do cargo para atropelar a maioria dos integrantes do partido que discursava na convenção a favor do apoio ao candidato tucano Aécio Neves. Nogueira suspendeu a discussão sob ataques dos companheiros que gritavam palavras como “vendido” e “ditador”. Ainda que tenham garantido o tempo de televisão do PP a Dilma, os progressistas convivem com um racha irremediável. No Rio Grande do Sul, a candidata Ana Amélia (PP) anunciou que a decisão de dar palanque ao tucano Aécio Neves independe do diretório nacional.
A maior fonte de dor de cabeça para Dilma durante as eleições, porém, deve ser o PMDB. O cenário de provável segundo turno vem incentivando a revoada de peemedebistas da linha de frente da campanha da presidenta, mesmo com a legenda compondo formalmente a chapa presidencial. Embora tenham indicado, por decisão da maioria, o nome de Michel Temer para vice-presidente, setores expressivos do PMDB dificilmente entrarão de corpo e alma na campanha de Dilma. Há, entre as lideranças do partido, quem acredite que manter certa distância do PT é saudável para os planos futuros do próprio partido. Outros peemedebistas de peso decidiram já pelo rompimento total. Foi o caso do PMDB fluminense, que resolveu apoiar Aécio Neves (PSDB). O tucano vai subir no palanque do governador Luiz Fernando Pezão, cujo padrinho político é o ex-governador Sérgio Cabral, que já foi muito próximo da presidenta
Os problemas do PMDB com Dilma se estendem pelo Brasil. No Rio Grande do Norte, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, será apoiado pelo PSDB, pelo PSB e pelo PSC. Todos com candidatos próprios e opositores de Dilma. Eles serão convidados a pedir votos para Alves no Estado e o único acordo é que o presidente da Câmara não pedirá votos para eles diretamente em respeito à aliança nacional com o PT. No Paraná há outro enrosco. A candidatura da senadora Gleisi Hoffmann depende do apoio do PMDB. Mas o partido quer lançar o senador peemedebista Roberto Requião afinado com o PSB, por considerar suas chances de vitória superiores às de Gleisi. Em São Paulo, é o vice-presidente da República, Michel Temer, quem turbina pessoalmente a candidatura de Paulo Skaf (PMDB), que vai disputar o Palácio dos Bandeirantes contra o candidato petista Alexandre Padilha.
Nos bastidores, tem sido cada vez mais difícil para a presidenta esconder o incômodo com a debandada e o racha dos aliados. Especialmente porque tudo o que Dilma não queria era se tornar refém do “toma lá dá cá” com os partidos. O que se viu com muita clareza na última semana é que nem mesmo quando cede às chantagens – e o faz negociando cargos públicos – o governo consegue o apoio esperado. Na quarta-feira 25, quando recebia adesão oficial de uma surpreendente maioria do PSD de Gilberto Kassab, a presidenta não conseguiu conter a indignação. Em entrevista, disparou contra as legendas que abandonaram seu projeto de reeleição. “Tem uma espécie de esperteza que tem vida curta. A política que aprendi a praticar ao longo da vida, desde a minha juventude, que me levou inclusive à prisão, implica construir relações que sejam baseadas, não em conveniências, mas em convicções”, disse ela. O discurso é correto. Pena que, na prática, o PT não só não abandonou como aperfeiçoou essas práticas, combatidas fervorosamente pelo partido antes de ascender ao poder.
Cadê eles?
A Copa do Mundo no Brasil é um sucesso e, agora, todos querem aparecer como responsáveis ou apoiadores do evento. Certo? Errado. Alguns nomes que pesaram para que o Mundial fosse realizado aqui simplesmente sumiram do mapa – ou melhor, das arquibancadas, dos gramados, dos holofotes. Como, por exemplo, o do presidente de honra da Fifa, João Havelange, 98 anos, sitiado por muitas acusações de corrupção, que está recluso em sua casa, em Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro. Ainda se recuperando de uma pneumonia depois de uma semana de internação hospitalar, ele acompanha as partidas pela televisão, segundo um amigo, e “tem gostado dos jogos, achando-os tecnicamente interessantes, com muitos gols”. O cartola também se regozija, elogiando a organização. “Os pessimistas foram calados”, teria dito, referindo-se aos que apostavam no fracasso do Mundial no País. Menos sumido, mas muito discreto, o atual presidente da federação, Joseph Blatter, 78 anos, assiste a alguns jogos nos estádios e, embora se esforce para não chamar atenção, já foi vaiado pela arquibancada quando sua imagem foi projetada no telão durante uma disputa. O secretário-geral da entidade máxima do futebol, o polêmico Jérôme Valcke, 53, está no Brasil desde maio, mas passou despercebido na primeira fase. Talvez para encerrar o período de reclusão, resolveu marcar uma entrevista coletiva na sexta-feira 27, no Maracanã, no Rio.
Agora, incógnita mesmo é o destino do ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) Ricardo Teixeira. Alguns de seus interlocutores afirmam que ele está longe da Copa do Mundo, viajando pela Europa. Com residência fixa no Rio e em Miami, Teixeira não é encontrado em nenhum dos dois endereços. No mês passado, foi visto almoçando com o ex-presidente do Flamengo Edmundo Santos Silva, no Leblon, zona sul do Rio. “Ele vive ‘zanzando’ entre os Estados Unidos, Europa, especialmente a Espanha, e o Brasil. Só não fica de vez nos Estados Unidos porque não tem o green card (literalmente, cartão verde, que permite a estrangeiros morar no país) americano”, diz uma pessoa próxima. Menos importante, mas também uma ausência notada, é a neta de Havelange, Joana, diretora-executiva do Comitê Organizador Local (COL). Ela está sumida também da casa do avô, com quem ainda não teria assistido a uma partida de futebol, desde a indigesta gafe cometida em maio, quando postou em sua conta do Instagram um texto que, entre outras coisas, dizia: “O que tinha que ser gasto, roubado, já foi”.
A dirigente não estudou na cartilha do avô, segundo um velho conhecido da família, que não quis se identificar. “Ela fez exatamente o contrário do que João Havelange ensinou. Ele sempre foi discreto, tomou cuidado redobrado com sua imagem. Joana se expôs e expôs a organização do evento. É claro que ele ficou chateado com ela”, afirmou. Resultado: outra Havelange fora de cena, outra executiva do futebol escondida nos bastidores. Joana segue sua rotina diária de reuniões no COL e assiste a jogos diretamente nos estádios, mas, até agora, está praticamente invisível. O time dos sumidos não ficaria completo sem o mascote da competição, o tatu-bola Fuleco, que sequer foi chamado para a abertura da Copa. O personagem só apareceu rapidamente, e em versão digital, nos telões das arenas para comemorar gols ou no noticiário como figura principal de um embate entre a Fifa e a Associação Caatinga, organização não governamental que reclama da falta de apoio financeiro da Federação aos projetos contra a extinção do bicho.
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Porto Alegre ou Buenos Aires? Um desavisado que caminhasse pelas cercanias do estádio Beira-Rio, na quarta-feira, dia 25, poderia sentir-se na capital argentina. As avenidas que ligam o centro da cidade às margens do Rio Guaíba, rota conhecida como Caminho do Gol, pareciam as ruas perto de La Bombonera, o estádio do Boca Juniors, ou do Monumental de Nuñez, do River Plate. Quase 100 mil argentinos caminhavam em direção ao estádio ou rumo à Fifa Fan Fest. No caminho, dezenas de comerciantes argentinos vendiam – em pesos – churrasco, mate, Fernet (uma espécie de caipirinha amarga dos argentinos) e muito choripan, o chorizo no pão, um clássico das portas de estádios na Argentina.
Não foi privilégio de Porto Alegre. A Copa do Mundo transformou capitais brasileiras em pontos de encontro de variadas culturas latino-americanas e diferentes sotaques do espanhol com o espírito e o português brasileiros – uma invasão inédita na história do Brasil. Equatorianos e mexicanos passearam juntos na orla da Praia de Copacabana, cercados de cariocas. Chilenos e uruguaios cantaram em vagões de metrô a caminho do Itaquerão, na Zona Leste de São Paulo, amontoados sobre paulistas. Colombianos e costa-riquenhos tomaram cerveja na Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte, e ganharam o carinho dos mineiros. Na Copa de 2014, nove seleções da América Latina se sentiram em casa fora de seu país.
Excluído o Brasil, anfitrião do torneio e fonte da maior demanda por ingressos da Copa, quatro países latino-americanos – Argentina, Colômbia, Chile e México – estão entre as dez nações que mais compraram ingressos para a Copa do Mundo, segundo a Fifa. Mais de 208 mil ingressos foram comprados na América Latina. Argentinos compraram 61 mil, colombianos 55 mil e tanto chilenos como mexicanos ficaram com mais de 30 mil. Muitos vieram sem ingresso. O Ministério do Turismo estima que mais de 450 mil latino-americanos tenham vindo ao país. A última Copa realizada na região, em 1986, no México, não chegou nem perto – estima-se que apenas 50 mil sul-americanos tenham viajado para lá.
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