Eduardo Militão
O futuro dos parlamentares envolvidos nas acusações de comércio ilegal de passagens vai depender da corregedoria da Câmara, órgão responsável por investigar a participação de deputados em irregularidades. Os trabalhos começam nesta segunda-feira (3) e servirão de base para eventuais punições de congressistas.
O corregedor da Câmara, ACM Neto (DEM-BA), tem em mãos o relatório concluído na semana passada pela comissão de sindicância. O documento vai funcionar como uma espécie de roteiro nas investigações conduzidas pelo deputado baiano.
Até agora, apenas servidores do congresso e funcionários de agências de viagens foram ouvidos no caso. O Congresso em Foco apurou os bastidores dos últimos dias de trabalho dos funcionários destacados pela Diretoria Geral da Câmara para investigar a venda ilegal de créditos aéreos das cotas dos parlamentares.
Foi às 3h45 da manhã da quinta-feira 23 de julho que a comissão de sindicância para apurar o comércio de créditos de passagens de parlamentares encerrou o trabalho. O relatório foi concluído por um trio de servidores que preferiu ficar longe dos microfones e holofotes. Naquele momento, foi às mãos de um servidor da Diretoria Geral, que pegou um avião naquela manhã. Foi até São Paulo a fim de entregar o relatório nas mãos presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP).
O documento aponta a participação de 44 servidores e ex-servidores envolvidos, com agentes de viagens, na venda ilegal de bilhetes. E descreve depoimentos de funcionários que acusam parlamentares se serem conhecedores do negócio, denúncia que será apurada pela Corregedoria da Câmara a partir da próxima segunda-feira (3).
Criada no final de abril, depois que o Congresso em Foco revelou a farra das passagens, a comissão trabalhou durantes três meses. Ao final dos primeiros 60 dias, pediu mais 30 para receber informações das companhias aéreas e terminar de apurar as reclamações de 14 parlamentares, que argumentavam terem sido vítimas do comércio ilegal de seus bilhetes.
O trio de servidores trabalhou numa sala de reuniões no 9º andar do Anexo I da Câmara. Com listas as de viagens publicadas pelo Congresso em Foco e pedidos de investigação feitos por deputados e ministros do Supremo Tribunal Federal, foram priorizadas também a “observância de condutas consideradas suspeitas” de acordo com informações publicadas na imprensa e obtidas pela comissão.
Tomaram 49 depoimentos de servidores, agentes de viagens, passageiros e representantes de companhias aéreas, que resultaram em 40 horas de gravações. Parlamentares não foram ouvidos porque a comissão não tinha competência para interrogá-los.
A papelada recebida pelo grupo de trabalho chegou a 800 páginas, entre bilhetes aéreos, requisições de passagens e comprovantes de pagamentos. O relatório foi fechado em 108 páginas, mais os anexos. O Departamento de Polícia Legislativa da Câmara forneceu à sindicância imagens do circuito interno de TV da Casa que mostravam a entrada de um agente de viagens no período em que foram emitidos bilhetes que serviram ao presidente do STF, ministro Gilmar Mendes. O magistrado foi vítima.
A comissão ainda buscou na Polícia da Câmara ocorrências policiais sigilosas já arquivadas porque tinham sido remetidas ao Ministério Público Federal. Nelas, relatos de funcionários acusando parlamentares de mandarem vender seus créditos aéreos. A comissão nada conclui com relação aos deputados. A Corregedoria da Casa promete avaliar as informações sobre os congressistas.
Pressa
Nas últimas horas de produção do relatório, na quarta-feira dia 22, o trio atuou na sala do 9º andar do Anexo I. Ao final do expediente, dirigiu-se à Diretoria Geral, de onde só saíram de madrugada.
A pressa era motivada pelo fim do prazo de existência da comissão. Segundo um servidor da Câmara, caso a data fosse estourada, seria necessário esperar uma norma ser publicada no Diário da Casa redesignando o trio de funcionários e só então o trabalho ser reiniciado.
Sumiço
Para descansar e para preservar o grupo, os três membros da sindicância se afastaram dos trabalhos da Câmara assim que encerram o trabalho. Aproveitaram o recesso parlamentar. Pelo menos um deles entrou em férias. Houve também uma recomendação da chefia para evitar assédio por vazamentos.
Para os superiores do trio, a discrição serve para o trabalho ser feito sem pressões da imprensa e, garantem, de deputados. Foi assim, por exemplo, numa colaboração à investigação do Ministério Público Federal no escândalo das sanguessugas, esquema de venda de ambulâncias superfaturadas por meio de emendas parlamentares descoberto em 2006.
Há um orgulho entre os setores técnicos da Câmara porque a colaboração deles à Justiça não teve “nenhuma linha” publicada na imprensa. Ao mesmo tempo, receberam elogios do juiz Jefferson Schneider, da 2ª Vara Federal de Cuiabá (MT), segundo contam os superiores da comissão sindicância.
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