Envolvido em denúncias de corrupção e caixa dois eleitoral, o PT ainda vai precisar "sangrar muito" para recuperar a credibilidade perdida, disse o presidente Lula, em entrevista exibida ontem pelo Fantástico, da TV Globo. Ao longo de 37 minutos de conversa com o jornalista Pedro Bial, Lula evitou comentar as conclusões das CPIs sobre o mensalão e disse que vai cobrar, ao término das investigações, desculpas daqueles que o acusaram de responsabilidade pelas irregularidades.
“O PT cometeu um erro… um erro que é de uma gravidade incomensurável”, disse. “Todo mundo sabe, e sabe o PT hoje e sabe quem cometeu os erros, que o PT cometeu um erro que será de difícil reparação pelo próprio PT. O PT vai sangrar muito para poder se colocar diante da sociedade outra vez com uma credibilidade que ele conquistou ao longo de 20 anos”, completou, após ser questionado sobre declaração dada em entrevista anterior, em Paris, em que afirmava que o caixa dois do PT era prática sistemática da política brasileira.
O presidente também declarou que recebeu como uma "facada nas costas" as denúncias sobre o esquema montado pelo PT com o empresário Marcos Valério Fernandes. A expressão é a mesma utilizada pelo deputado cassado Roberto Jefferson (PTB-RJ) ao relatar, em depoimento ao Conselho de Ética da Câmara, a reação de Lula ao tomar conhecimento da existência do mensalão. Apesar de se dizer traído, mais uma vez o petista não revelou o nome dos traidores.
Leia também
Com o dedo em riste, o presidente disse que gostaria de receber pedidos de desculpas, pela "leviandade" dos que fazem julgamentos precipitados. "Com relação à minha pessoa, a única coisa que eu peço a Deus é que, quando terminar tudo isso, aqueles que me acusaram peçam desculpas. Só peço isso. Não quero, não quero nada mais do que isso. Peçam desculpas."
Lula também ressaltou a importância do governo, do Ministério Público, da Polícia Federal e das CPIs nas investigações e garantiu que, assim como o PT, ele também fez a sua parte assim que as denúncias surgiram.
A seguir, alguns dos principais trechos das entrevistas de Lula ao Fantástico:
PT
“Primeiro, o PT cometeu um erro… um erro que é de uma gravidade incomensurável. Todo mundo sabe — e sabe o PT hoje e sabe quem cometeu os erros — que o PT cometeu um erro que será de difícil reparação pelo próprio PT. O PT vai sangrar muito para poder se colocar diante da sociedade outra vez com uma credibilidade que ele conquistou ao longo de 20 anos.”
José Dirceu
“Se há indícios (de tráfico de influência), tem que ter uma investigação séria, e que eu quero que ela seja feita para o Zé Dirceu como eu quero que ela seja para mim, como eu quero que ela seja feita para você. E, na hora em que a gente tiver a investigação feita corretamente e o veredito, aí você fala: ‘Bom, esse cidadão cometeu uma heresia, por isso, esse cidadão tem que ser punido’. Isso vale para todos nós. O que eu quero dizer é que o processo de julgamento do Zé Dirceu… a Câmara tem independência para fazer isso. Também não é a primeira vez e nem será a última que vai cassar alguém. A CPI… ela vai ter que apresentar à nação brasileira um resultado que possa justificar todo o trabalho que a CPI fez até agora. E, para mim, se a CPI precisa de mais um mês, mais dois meses, mais outro mês, é um problema da CPI. Não é um problema meu. O meu papel nesse momento é cuidar deste país.”
Sabia ou não sabia
"O que é importante não é se você sabia ou não, porque, se eu tivesse condições de saber, não teria acontecido. Esse é o dado concreto. Se eu tivesse condições de saber, não teria acontecido. Na medida em que eu soube, naquilo que diz respeito ao presidente da República, as providências todas foram tomadas. Foi afastado quem deveria ser afastado. Foi punido quem deveria ser punido. Agora, a Justiça faça a sua parte. E, no caso do PT, o PT fez a sua parte".
Investigações das CPIs
“Nem poderia ler (quando lhe perguntaram se havia lido o relatório parcial da CPI dos Correios). O presidente da República tem informações dos relatórios pelos meus assessores, mas eu estou esperando é o relatório conclusivo da CPI. Porque o que conta na verdade é quando você tiver um relatório consagrado. Terminou a CPI, o relatório está pronto, vai ser encaminhado ao Ministério Público. A Polícia Federal vai entrar em ação. O Poder Judiciário vai entrar em ação. Aí sim, esse relatório é que vale para uma avaliação definitiva do presidente da República. Os relatórios parciais ainda vão passar por outras comissões, ainda vão ser julgados pela própria CPI. Aí, quando ele estiver pronto, aí eu tenho um documento final para poder fazer juízo de valores desse documento.”
Reeleição
“No Brasil, em primeiro lugar, tem muita coisa para acontecer. Eu, como disse agora há pouco, eu não defini se sou candidato. Não tenho pressa de definir. Vai depender de muitas conversas com os partidos. Vai depender de muita conversa com gente da sociedade. Você sabe que eu tenho uma tese sobre a reeleição. Se eu decidir ser candidato, obviamente que eu vou decidir ser candidato, vou comunicar à nação brasileira. Se eu decidir que não sou, sabe… Ou eu estarei tomando posse ou eu estarei passando a faixa para alguém que ganhou as eleições. A única coisa de que eu tenho certeza de dizer ao povo brasileiro é que 2006 será o ano do povo brasileiro, porque está tudo engatilhado, está tudo preparado, está tudo armado para que o Brasil tenha um forte crescimento, uma forte distribuição de renda, muito emprego para esse povo e quem sabe a gente construir junto o Brasil que sonhamos há muito tempo construir.”
Reformas no Congresso
“A minha parte eu cumpri. Nós criamos um Fórum Nacional do Trabalho em que participaram empresários, trabalhadores e o governo. Apresentamos uma proposta que está no Congresso Nacional. Eu não posso bater escanteio e marcar o gol ao mesmo tempo. Eu enviei o meu processo ao Congresso Nacional que eu espero que ele vote. A reforma trabalhista, eu acho que ela precisa ser feita. Ser feita da forma mais madura possível para que a gente possa adequar o Brasil ao século XXI. Agora, ela não pode ser uma imposição de um grupo sobre outro. Ela tem que ser um acordo, em que leve em conta as necessidades do Brasil. É para isso que nós trabalhamos. E por isso que eu digo que não haverá medida populista, que eu não tomarei nenhuma atitude, nenhuma, nenhuma atitude que signifique ‘ah, o presidente está fazendo isso aí por causa da eleição’. Eu vou fazer o que tem que ser feito no Brasil. O Brasil consolidou e é isso que eu peço que o povo brasileiro acredite.”
Plantando e colhendo
“Você colhe no tempo que dá. Eu não escolho o tempo em que eu posso colher. Quando você começa uma obra em 2003, você não a termina em 2003. Quando você começa uma hidrelétrica, você demora cinco, seis anos para colher. Quando você começa uma ferrovia, você demora para colher. Quando você começa a plantar no tempo certo, você colhe no tempo certo. Algumas coisas nós colhemos, outras não. Eu vou dar um exemplo para você. Na política social, nós já colhemos muita coisa e temos muito para colher. Nós pegamos o governo com R$ 7 bilhões em política social. Este ano de 2005, terminamos com R$ 17 bilhões e, para 2006, serão R$ 22 bilhões investidos em política social. É por isso que o estudo do IBGE divulgado pela Pnad dá que, pela primeira vez na História, os mais pobres tiveram um ganho como não tinham há muito tempo. E, embora o salário não tenha crescido tanto o que eu gostaria que crescesse, a verdade é que é o momento em que ele mais cresce na História do Brasil. Depois, três milhões de pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza deixaram de viver abaixo da linha da pobreza. Então, nós vamos fortalecer mais política social. Esse é um dado de uma coisa que nós estamos colhendo. Outra coisa que nós vamos colher é o nosso programa de investimento em educação. Nós estamos construindo quatro universidades federais novas. Nós estamos transformando cinco faculdades em universidades. E estamos fazendo 32 extensões de universidades federais para o interior do país. Estamos levando uma universidade para o ABC, estamos levando para Diadema, levando para Sorocaba, estamos levando para o Nordeste e para o Norte inteiro, que é para que o Brasil comece a pensar que ele deve ser um grande exportador de inteligência e de conhecimento e não apenas de produto manufaturado ou matéria-prima. (…) Então, por que eu não vou colher as coisas que nós plantamos? Nós vamos colher, e eu quero, como presidente da República, ir aos locais em que eu fui anunciar que ia fazer… Eu quero ir lá colher agora o que eu plantei.”
Deixe um comentário