Fábio Góis
O PSDB formalizou nesta terça-feira (28) na Secretaria de Apoio a Conselhos e Órgãos do Parlamento, no Senado, três representações por quebra de decoro parlamentar contra o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP) – alvo de inúmeras denúncias desde que tomou posse para o terceiro mandato, em fevereiro deste ano, desde uso da estrutura institucional em benefício próprio até envolvimento em atos administrativos secretos para contratar parentes. O documento, que será encaminhado ao Conselho de Ética, foi protocolado pelo presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra (PE), acompanhado pelo senador Alvaro Dias (PR).
Mais cedo, o partido chegou a considerar a apresentação de quatro representações, mas duas delas foram unificadas por tratarem do mesmo assunto, a suspeita de desvio de dinheiro por parte da Fundação José Sarney, no Maranhão.
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Segundo Guerra, as representações “têm muito a ver” com as quatro denúncias apresentadas pelo líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), ao colegiado. “O que nós desejamos é que o Conselho de Ética funcione, sem tropas de choque e pré-julgamentos”, declarou Guerra, referindo-se a senadores como Renan Calheiros (AL), líder do PMDB, Wellington Salgado (PMDB-MG), e o próprio presidente do Conselho, Paulo Duque (PMDB-RJ). “Só temos saída para esta crise que atravessamos no Senado agora se o regimento for cumprido, e que as denúncias caminhem no Conselho de Ética.”
O tucano negou haver uma ameaça articulada pelos peemedebistas contra senadores tidos como adversários de Sarney. A ameaça, supostamente encabeçada por Renan Calheiros, consistiria na apresentação de representações por quebra de decoro também contra nomes como Arthur Virgílio, que recebeu empréstimo do ex-diretor-geral afastado Agaciel Maia e empregava assessor fantasma no exterior, às custas do Senado; Efraim Morais (DEM-PI), titular das duas últimas gestões da Primeira Secretaria, que deveria ter gerenciado a emissão de atos administrativos secretos; e Tasso Jereissati (PSDB-CE), que utilizou cota de passagem aérea para fretar jatinho em viagem não oficial.
“Se o líder Renan promover ameça ou esse tipo de retaliação, acho que ele estará equivocado. Nós respeitamos o PMDB, o Congresso, mas estamos usando um direito legítimo nosso, que é o de solicitar investigação, sem prejulgamento, mas como firmeza e democracia”, ponderou Guerra, que disse ter conversado ao telefone com Renan, que teria negado os rumores de ameaça. “Não se falou de ameaça, de nada disso. Falou-se de um clima indesejado, que é o que prevalece no Senado hoje.”
Fogo cerrado
Ao todo, Sarney já tem contra si no Conselho quatro representações (a primeira foi ajuizada pelo Psol). Com as três representações formalizadas hoje, a oposição quer evitar que o presidente do Conselho, aliado de Sarney, arquive sumariamente as denúncias, como prevê o regimento interno. Caso as representações sejam acolhidas, haverá sorteio da relatoria de cada uma delas entre os membros do colegiado, o que aumenta as chances de um oposicionista ser um dos relatores.
Um dos principais críticos de Sarney no Senado, Álvaro Dias explicou que duas das quatro representações que seriam apresentadas, ambas referentes ao mesmo tema, foram unificadas.
“A representação que diz respeito à Fundação José Sarney engloba uma outra que dizia respeito à eventual mentira pronunciada em plenário [por Sarney]”, disse Alvaro, lembrando que, por ser distribuída por sorteio, a relatoria das representações podem cair nas mãos de um senador “independente”.
Uma das representações diz respeito às concessões de crédito consignado para servidores do Senado, operadas irregularmente por um dos netos de Sarney junto a instituições bancárias. A outra se refere ao fato de Sarney ter negado participação na emissão de atos clandestinos, quando escutas telefônicas autorizadas, ilegalmente vazadas para a imprensa, mostram Sarney e parentes negociando a contratação do namorado da neta no serviço médico da Casa.
Procedimento
As denúncias apresentadas por Virgílio, individualmente, apenas formalizavam pedido de investigação sobre atos que configurariam quebra de decoro parlamentar. Cabe ao presidente do colegiado decidir a transformação da denúncia em representação – do contrário, o regimento interno possibilita ao presidente arquivamento sumário, sem consulta aos demais integrantes do colegiado. Segundo a Secretaria de Apoio, as quatro denúncias continuam formalizadas na secretaria, mesmo com teor idêntico ao das três representações, mas devem ser arquivadas por Duque. A assessoria do órgão disse ainda que o regimento não prevê a situação.
As representações partem do pressuposto de que houve, por parte do parlamentar representado, quebra de decoro parlamentar – o que implica imediata abertura de processo, cuja pena máxima é a perda de mandato. Apenas partidos podem formalizar representações no Conselho de Ética, por meio da maioria dos votos da executiva.
Nesse caso, o presidente do Conselho não pode arquivar sumariamente a representação, mas deve submetê-la à apreciação dos demais membros do colegiado. Caso os senadores considerem, no transcorrer de um eventual processo, que houve quebra de decoro, o plenário julgará se o representado deve perder o mandato. Uma vez aprovado o requerimento de abertura de processo, Sarney fica imediatamente afastado da presidência até a conclusão da votação em plenário.
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