Em fase final de tramitação no Congresso Nacional, um projeto de lei pode mudar a forma como a concessão da guarda compartilhada é tratada hoje. Pelo projeto (PLC 117/2013), a guarda compartilhada será regra, desde que pai e mãe se mostrem aptos a assumir os cuidados com os filhos. Atualmente é necessário que os dois entrem em acordo, ou seja, se uma das partes não estiver satisfeita, o juiz não defere o pedido.
Caso aprovado, o projeto de lei pode facilitar processos como o enfrentado pelo consultor de vendas Márcio Teixeira, 49 anos. Pai de uma menina de 13 anos, ele luta na Justiça, desde o ano passado, pela guarda compartilhada. Ele diz que a filha nasceu de um namoro e que nunca chegou a morar com a mãe dela. Apesar disso, ele diz que sempre brigou para poder visitar a menina. O primeiro processo na Justiça veio quando ela ainda tinha poucos meses. Entretanto, ele só conseguiu o direito de visitá-la dois anos depois. “A nova lei facilitaria o processo e os dois, tanto eu quanto a mãe, poderíamos participar ativamente da criação da nossa filha”, diz o consultor de vendas.
O projeto recebe o apoio de grupos ligados ao tema. De acordo com a Associação de Pais e Mães Separados (Apase), o caso de Teixeira não é exceção: em 80% dos casos de separação há dificuldades de relação entre os pais que acabam se refletindo na criação dos filhos. “Acreditamos que, com a guarda compartilhada, teremos uma grande queda dos problemas relativos à alienação parental [quando um pai faz a criança rejeitar o outro]. Com a nova legislação, quando os processos de guarda chegarem ao juiz, ele dará a guarda compartilhada e não haverá motivos para brigar”, acredita o presidente da Apase, Analdino Rodrigues Paulino.
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A Agência Brasil entrou em contato com os tribunais de Justiça estaduais e do Distrito Federal solicitando o número de pedidos de guarda compartilhada feitos nos últimos anos. Dez tribunais que responderam à solicitação alegaram que não tinham como discriminar os pedidos de guarda. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), por meio da assessoria de imprensa, confirmou apenas que a maior parte dos “pedidos são conflituosos e a guarda não é compartilhada”.
Outra entidade favorável aos princípios do projeto é o Instituto Papai, organização não governamental (ONG) pernambucana que defende direitos igualitários para homens e mulheres. “Não é bom para as crianças viverem com um só dos pais. Isso deve ser encarado como exceção e não regra, como é hoje. Acho que uma mudança de visão, que parte do pressuposto de que pais e mães devem compartilhar, é positiva”, diz a socióloga e coordenadora do Instituto Papai, Mariana Azevedo. Ela também acredita em um aumento no número de pais que participam ativamente da criação dos filhos. “Acredito que a maioria dos casos de guarda compartilhada seja feita de maneira informal, no cotidiano, sem levar o caso à Justiça”, diz.
É o caso do brigadista Dimas Cardoso dos Santos, 43 anos. Ele tem dois filhos com a frentista Marizete da Silva, Breno dos Santos, 21 anos, e Cristiano dos Santos, 18 anos. Quando se separaram, os meninos ainda eram pequenos. Marizete foi morar com parentes e as crianças continuaram na casa onde moravam, com o pai. “Mesmo morando comigo, os meninos sempre viam a mãe, porque morávamos muito perto. Ela buscava na escola, ficava com eles. Nunca tivemos nenhum problema com a guarda. Eles não têm culpa da nossa separação, nunca quisemos transferir isso para nossos filhos”, diz.
O professor do departamento de psicologia clínica da Universidade de Brasília (UnB) Áderson Luiz Costa Júnior explica que a criança e o adolescente precisam de pais presentes “para que tenham modelos de desenvolvimento e para que ganhem autonomia, independência e autocuidado”. “Os pais são agentes de aprendizagem, além de servirem de rede de apoio social”, destaca.
O especialista, entretanto, faz um alerta: não adianta estar presente se as brigas são constantes. “Pais presentes que brigam constantemente ou que não apresentam pontos mínimos necessários ao desenvolvimento da criança podem produzir mais danos que pais ausentes”, ressalta.
Para quem lida com a questão diariamente, no entanto, a mudança proposta pelo projeto não é tão simples. “Esse projeto, do meu ponto de vista, não tem serventia nenhuma. Quando se está saindo de um divórcio, quando há disputas de partilha e outras, não se tem a menor possibilidade de não se estar em litígio”, diz o advogado da família Maurício Lindoso, membro do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM).
“De certa forma, virou moda. As pessoas achavam interessante o aspecto do compartilhamento da guardam, mas entendem essa guarda como se fosse alternada. Não tem nada a ver com passar uma semana com o pai e outra com a mãe. É criar os filhos como se estivessem casados”, explica o advogado, destacando que para esse tipo de guarda é necessário que pai e mãe mantenham um relacionamento saudável.
Para Lindoso, entretanto, o que acontece, na maioria das vezes, é que pai e mãe quase não se falam e a criança “pula” de uma casa para outra. Apenas decisões maiores – como a definição da escola, por exemplo – são tomadas pelos dois e questões igualmente importantes como os tipos de brinquedos e as amizades das crianças são deixadas de lado. Nesse sentido, o advogado defende que, mesmo com a guarda unilateral, ambos participem da criação dos filhos e tenham atribuições.
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