Após quase uma semana de intensa pressão da opinião pública, o Congresso foi obrigado ontem pela Justiça a suspender o reajuste de 91% concedido aos parlamentares pelas Mesas Diretoras da Câmara e do Senado e a submeter ao Plenário a discussão sobre o assunto.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) declararam, por unanimidade, que deputados e senadores precisam aprovar um decreto legislativo específico para elevar o próprio salário. O STF concedeu uma liminar que impede o Congresso de utilizar um antigo decreto, de 2002, para validar o aumento (leia mais).
Desautorizados pelo Supremo, os presidentes da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), convocaram uma reunião com os líderes partidários para tratar do assunto. O encontro, marcado inicialmente para as 17h de ontem (terça, 19), foi adiado para esta manhã.
Durante a reunião, os líderes vão discutir qual será o valor do reajuste. A solução mais provável é dar aumento de 28,4% equivalente à inflação acumulada (segundo o IPCA) desde 2003, quando houve o último aumento. Com isso, os salários iriam para R$ 16,5 mil. A proposta é defendida pelas bancadas do PT, do PDT, do PPS e do PSB. Apenas o PV e o Psol defendem a manutenção dos atuais vencimentos, fixados em R$ 12,8 mil. As demais bancadas não se manifestaram.
Leia também
Voto aberto
Já a proposta que equipara os vencimentos dos congressistas ao salário dos ministros do STF, de R$ 24,5 mil – teto do funcionalismo público – foi praticamente enterrada devido à forte reação da opinião pública. Mesmo porque, com a decisão do STF, a votação terá de ser feita no Plenário, o que obrigará os parlamentares a manifestarem abertamente sua posição sobre o reajuste.
“Na quinta-feira passada, o argumento de 26 pessoas [dos 29 presentes em reunião da Mesa] era de que o reajuste era justo, legal e oportuno. E nós fomos taxados de hipócritas, demagogos e oportunistas. Vai ser muito pedagógica a mutação de uma reunião a portas fechadas para uma discussão aberta", disse líder do Psol, deputado Chico Alencar (RJ).
O projeto de decreto legislativo que estabelecerá a remuneração precisa ser aprovado por maioria simples, na Câmara e no Senado. Para isso, é necessário um quórum mínimo de 257 dos 513 deputados e 41 dos 81 senadores.
Reação contra o Supremo
A decisão do STF de barrar o aumento dos parlamentares pode desencadear uma espécie de represália no Congresso. A líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC), chegou a propor a redução dos salários dos ministros do STF para R$ 16,5 mil. Já o deputado Eduardo Gomes (PSDB-TO) pretende apresentar hoje uma proposta que pretende equiparar os vencimentos dos parlamentares ao teto do funcionalismo público.
A solução proposta pelo tucano é polêmica: congelar o salário dos ministros do Supremo e dar aumentos gradativos aos congressistas nos próximos quatro anos, até que os vencimentos de todos fiquem equiparados em R$ 24.500. Em 2007, o subsídio ficaria em cerca de R$ 16.500, sendo reajustado até 2010. “Isso acabaria com a eterna busca da equiparação”, disse Gomes.
Segundo a senadora, que votou a favor do aumento de 91% para os parlamentares na semana passada, o teto do funcionalismo público deveria ser rebaixado, já que a opinião pública julga que o valor de R$ 24,5 mil está fora da realidade do país. "O que não pode é admitir que o Legislativo não ganhe mais e o Judiciário tenha o seu aumento", disse a petista.
Ao ser questionada sobre as diferenças de funções e da carreira dos 11 ministros do STF e dos parlamentares, Ideli respondeu que esse fato era mais um motivo para se rever o valor pago aos magistrados. "É pior ainda porque eles têm cargo vitalício e os parlamentares têm mandato."
Equiparação contestada
Ontem, os ministros do Supremo Marco Aurélio de Mello e Carlos Ayres Britto disseram considerar inconstitucional a equiparação do salário de parlamentares ao deles próprios. As declarações, feitas por eles durante o julgamento contra o aumento no Legislativo, revelam que, mesmo que o Congresso aprove um decreto legislativo, conforme exigência do STF, poderá enfrentar novos problemas jurídicos se insistir em igualar sua remuneração à dos ministros do tribunal.
Marco Aurélio Mello negou que tenha havido confronto entre Judiciário e Legislativo por conta da decisão do STF. “Não se pode tomar de empréstimo o que a Constituição Federal quer não como subsídio de deputados e senadores, mas como teto, ou seja, o valor que percebe o ministro do Supremo”, disse.
Ele lembrou que o Congresso vai apreciar projeto de lei para reajustar os salários dos ministros do Supremo, que passariam de R$ 24,5 mil para R$ 25,7 mil. O projeto foi encaminhado ao Congresso no início de novembro pela presidente do STF, ministra Ellen Gracie.
Para o ministro, a proposta não é de um reajuste excessivo. Ele argumentou que o valor proposto, de R$ 25,7 mil, é bruto e sobre ele incidem impostos. “Agora temos um sócio que é o próprio Estado”, ponderou.
Deixe um comentário