A Procuradoria-Geral da República (PGR) solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta sexta-feira (15) a inclusão da delação premiada de Lúcio Funaro, operador do PMDB em esquemas de corrupção, no inquérito do Decreto dos Portos, um dos dois ativos no STF contra o presidente Michel Temer (MDB). A investigação apura se Temer recebeu propina para publicar o instrumento legal, editado sob medida para beneficiar empresas do setor portuário como a Rodrimar, como apontam indícios.
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Caberá ao ministro Luís Roberto Barroso, relator do inquérito, decidir sobre o pedido de inclusão, procedimento que permite atestar a veracidade de declarações de Funaro, um dos condenados na Operação Lava Jato, e cotejá-las com os demais elementos da investigação. A delação de Funaro, para quem Temer atuou criminosamente para beneficiar empresas portuárias, é considerada forte o suficiente para fundamentar a apresentação de uma terceira denúncia contra o presidente, já acusado por corrupção passiva, obstrução de Justiça e participação em organização criminosa.
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“Essa MP foi feita para reforma do setor portuário e ela ia trazer um grande prejuízo para o grupo Libra, que é um grupo aliado de Cunha e, por consequência, de Michel Temer, porque é um dos grandes doadores das campanhas de Michel Temer. O grupo Libra não ia mais poder renovar suas concessões portuárias, porque tinha vários débitos fiscais inscritos em dívida ativa”, relatou Funaro, apontando a restrição contida na MP e, em seguida, a providência tomada por Cunha.
“O que Eduardo Cunha fez? Pôs dentro [sic] dessa MP uma cláusula [garantindo] que empresas que possuíam dívida ativa inscrita pudessem renovar seus contratos no setor portuário desde que arbitrassem arbitragem para discutir esse débito tributário”, acrescentou o delator, para quem Temer recorria a Cunha porque o então deputado estava à frente das negociações em torno da votação da medida provisória.
Veja no vídeo (a citação relacionando Temer à MP é feita a partir de 8:43):
Responsável pelas apurações, a Polícia Federal deve conceber um relatório final sobre o caso até o início de julho, prazo para a conclusão dos trabalhos. A corporação também pode solicitar mais tempo de investigação – já houve duas prorrogações desse inquérito. A investigação cumpre etapa de exame das provas reunidas até o momento. Autorizada a inclusão, o cruzamento de informações já coletadas ganha força e poder embasar o conjunto probatório para a próxima fase, quando a denúncia poderá ser formulada.
Quadrilhão
Funaro teve acordo de colaboração judicial homologado pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, no início de setembro do ano passado. Temida pelo governo, a delação do operador, que compunha o grupo criminoso do deputado cassado e preso Eduardo Cunha (MDB-RJ) na Câmara, fortalece a tese de obstrução de Justiça em consideração na segunda denúncia da PGR contra o presidente. Segundo o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, Temer avalizou a compra do silêncio tanto de Funaro quanto de Cunha.
Acusado de participar dos desvios na Caixa Econômica, em parceria com Cunha, Funaro confessou crimes, descreveu o envolvimento de parlamentares nas negociatas e entregou provas “fortes” de movimentação ilegal de dinheiro (palavras da PF) durante as negociações da delação premiada. Tais relatos se somaram às delações e gravações de Joesley Batista e outros executivos da J&F na peça de acusação contra o presidente.
O peemedebista é alvo de denúncias que apuram o envolvimento dele e do ex-assessor da Presidência Rodrigo Rocha Loures, entre outros, em crimes como corrupção, obstrução à Justiça e organização criminosa, no que esquema que ficou conhecido como “quadrilhão do PMDB”. O ex-procurador-geral da República suspeita que Temer usava Rocha Loures para executar negócios escusos, receber propina da JBS e atrapalhar a Lava Jato já no exercício do mandato.
Segundo as investigações, Funaro fez revelações consistentes e reveladoras que reforçam as acusações de Joesley contra o presidente. Foi com base em depoimentos dele que a Polícia Federal prendeu o ex-ministro Geddel Vieira Lima por obstrução à Justiça.
Um dos peemedebistas mais próximos de Temer, Geddel é acusado de sondar a mulher do doleiro sobre a intenção dele de fazer delação premiada. Dinheiro não faltava para comprar o silêncio de Funaro, segundo a Polícia Federal, que encontrou 15 malas e caixotes recheados de dinheiro em endereço atribuído ao ex-ministro. Funaro confirmou o que áudios de conversa fora da agenda presidencial entre Temer e Joesley, em 7 de março, sinalizaram: que recebeu dinheiro da JBS, a mando de Temer, em troca de seu silêncio. Temer sempre negou as acusações, e emitiu nota neste sentido no ano passado (íntegra abaixo).
MP da discórdia
A complicação de Temer nesse caso começou quando ele ainda era vice-presidente. Com novas regras para o setor portuário, a Medida Provisória 595/2012, editada no governo da ex-presidente Dilma Rousseff, foi aprovada em 16 de maio de 2013 a cinco horas de perder a validade, em meio a um verdadeiro turbilhão de protestos da oposição da época, formada principalmente por PSDB e DEM, e disputa de bastidores. Revogando a Lei dos Portos, que estava em vigência desde 1993, a matéria liberou os portos privados para operarem qualquer tipo de carga, entre outras disposições.
As novas regras concederam à União a prerrogativa da gestão e planejamento estratégico do setor e, para os estados, a prerrogativa de administrar os portos. A medida também permitiu a movimentação de cargas de terceiros nos Terminais de Uso Privado (TUPs) e muda os critérios de desempate das futuras licitações. Para o governo, a proposta daria competitividade ao setor.
“‘Isto aqui não é hospício’. Dita em tom de desabafo pelo líder do governo na Câmara, o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), a frase revela o nível de tensão de uma semana que teve de tudo – e quase nada – no Congresso Nacional. Troca de acusações e insultos entre os líderes do PR e do Democratas, deputado agarrado pela cintura por segurança e sessão estendida por quase 50 horas. A MP dos Portos foi um pavio de pólvora que explodiu os ânimos entre os parlamentares e estilhaçou a pauta do Congresso. Para alívio do governo e protestos da oposição, o texto foi aprovado na noite de ontem no Senado, cinco horas antes de perder a validade, e segue para sanção presidencial”, registrou o Congresso em Foco na ocasião.
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A nota de Temer:
O vazamento de vídeos com depoimento prestado há quase dois meses pelo delator Lúcio Funaro constitui mais um abjeto golpe ao Estado Democrático de Direito. Tem o claro propósito de causar estardalhaço com a divulgação pela mídia como forma de constranger parlamentares que, na CCJC da Câmara dos Deputados, votarão no dia 18 o muito bem fundamentado parecer do relator, deputado Bonifácio de Andrada, cuja conclusão é pela rejeição ao pedido de autorização para dar sequência à denúncia apresentada contra o Presidente Michel Temer pelo ex-Procurador-Geral da República.
É evidente que o criminoso vazamento foi produzido por quem pretende insistir na criação de grave crise política no País, por meio da instauração de ação penal para a qual não há justa causa. Só isso explica essa divulgação, ao final de uma semana em que a denúncia formulada pelo ex-Chefe do MPF foi reduzida a pó pelo parecer do deputado Bonifácio de Andrada.
Autoridades que têm o dever de respeitar o ordenamento jurídico não deveriam permitir ou promover o vazamento de material protegido por sigilo. É igualmente inaceitável que a imprensa dê publicidade espetaculosa à palavra de notório criminoso, que venceu a indecente licitação realizada pelo ex-PGR para ser delator, apenas pela manifesta disposição de atacar o Presidente da República.
As afirmações do desqualificado delator não passam de acusações vazias, sem fundamento em nenhum elemento de prova ou indiciário, e baseadas no que ele diz ter ouvido do ex-deputado Eduardo Cunha, que já o desmentiu e o fez de forma inequívoca, assegurando nunca ter feito tais afirmações. Assim como o fizeram todos os demais mencionados pelo delator em sua mentirosa história, que lhe serviu para a obtenção de prêmio.
Eduardo Pizarro Carnelós
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