A Procuradoria Geral da República (PGR) defendeu junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) a prorrogação do inquérito que investiga esquema de pagamento de propina no setor portuário e tem o presidente Michel Temer entre os principais investigados (leia mais abaixo). No mesmo despacho, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, solicita que o Supremo formalize ordem judicial para proibir “qualquer ato de ingerência” sobre o inquérito por parte do diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia. Apadrinhado de peemedebistas como o ex-presidente José Sarney e acusado de atuar para blindar Temer, Segovia antecipou-se aos responsáveis pelas apurações e, em entrevista à Agência Reuters, sugeriu não haver provas contra o presidente.
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Se Segovia vier a interceder, verbal ou operacionalmente, no chamado “Decreto dos Portos”, ficará suscetível de afastamento do cargo, ainda segundo a demanda encaminhada pela PGR ao STF. As informações sobre as providências vieram a público nesta segunda-feira (26), por parte da própria Procuradoria-Geral da República.
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O documento com a manifestação formal de Raquel Dodge foi provocado por pedido do ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso no STF. Depois que a entrevista de Segovia à Reuters veio a público, o próprio Barroso intimou o diretor-geral da PF a se explicar e o proibiu, de ofício, de voltar a se manifestar sobre o assunto. Na última segunda-feira (19), Segovia foi ao STF e garantiu, segundo relatos de interlocutores do magistrado, que não voltaria a falar sobre o inquérito.
Na entrevista em questão, Segovia chegou a sinalizar que o delegado Cleyber Lopes, responsável pelo inquérito dos portos na Polícia Federal, poderia ser punido por perguntas que, enviadas a Temer no transcorrer da investigação, teriam incomodado o presidente. Desde a publicação das declarações do diretor-geral, reações contundentes de delegados da PF e outras categorias ganharam o noticiário. Implicado diretamente na polêmica, Cleyber Lopes pediu ao Supremo, em 20 de fevereiro, a prorrogação dos trabalhos por mais dois meses.
Também nesta segunda-feira (26), a Justiça Federal em Brasília negou pedido para afastar Segovia do comando da PF. A decisão formalizada como resposta à ação popular protocolada em 14 de fevereiro pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), um dos principais críticos do governo Temer no Senado. Em seu despacho, o juiz Ed Lyra Leal, da 22ª Vara Cível do Distrito Federal, justifica não haver, na entrevista de Segovia, elementos suficientes para justificar o afastamento.
“Conquanto se noticie nos autos comportamento inadequado do agente público corréu, tal conduta não se qualifica de gravidade suficiente a justificar a suspensão pretendida, uma vez que ausente demonstração de ato concreto ou mesmo de intenção de interferência na investigação preliminar”, escreve o magistrado.
Lei dos Portos
Temer é acusado de ter atuado para defender interesses de empresas portuárias por meio da tramitação da MP dos Portos, medida provisória editada em 2013, quando o peemedebista ainda era vice-presidente da República. Com novas regras para o setor portuário, a Medida Provisória 595/2013, editada no governo da ex-presidente Dilma Rousseff, foi aprovada em 16 de maio de 2013 a cinco horas de perder a validade, em meio a um verdadeiro turbilhão de protestos da oposição da época, formada principalmente por PSDB e DEM, e disputa de bastidores. Revogando a Lei dos Portos, que estava em vigência desde 1993, a matéria liberou os portos privados para operarem qualquer tipo de carga, entre outras disposições.
As novas regras concederam à União a prerrogativa da gestão e planejamento estratégico do setor e, para os estados, a prerrogativa de administrar os portos. A medida também permitiu a movimentação de cargas de terceiros nos Terminais de Uso Privado (TUPs) e muda os critérios de desempate das futuras licitações. Para o governo, a proposta daria competitividade ao setor.
Já na condição de presidente, com o impeachment de Dilma concretizado em 31 de agosto de 2016, Temer assinou o Decreto 9.048/2017, o tal “Decreto dos Portos”, que prorrogou os contratos de concessão do setor portuário. Uma das principais suspeitas é que parte do instrumento legal serviu para beneficiar a empresa Rodrimar S/A, concessionária do Porto de Santos, por meio de negociatas articuladas por Rocha Loures, mediante pagamento de propina.
O ex-assessor de Temer chegou a ser preso depois de flagrado ao correr por uma rua de São Paulo carregando uma mala de dinheiro com R$ 500 em espécie. Segundo delatores do grupo JBS, empresa corruptora de figuras de diversos partidos, trata-se de uma parcela das várias outras que seriam repassadas a Temer e Rocha Loures como acerto de outro esquema de corrupção.
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