Álvaro Lins*
As eleições municipais passadas frustraram novamente todos aqueles que acreditavam na superação do triste aviltamento do papel da internet na política brasileira que ocorreu na campanha presidencial de 2010.
Naquele ano, ao invés de propostas, participação e debate, assistimos as pobres polêmicas sobre o aborto, “casamento gay”, blogs subsidiados para a calúnia e a intriga, perfis e dossiês falsos, spam e tudo mais do que não constrói, não mobiliza e não motiva a participação.
Este ano não foi diferente. Talvez até pior. Escudados pelas facilidades de criação de perfis, blogs e sites, candidatos e campanhas priorizaram a baixaria em detrimento da divulgação de propostas, do estímulo ao debate e à participação.
Os repetitivos sites dos candidatos, prefeitos e vereadores mantinham a mesmice estética e estrutural do trinômio: biografia, propostas (vagas e superficiais) e agenda de campanha com fotos e vídeos de eventos. Alguns sites de campanha sequer listavam os endereços dos comitês. Pouquíssimos colocavam como prioridade o que deveria ser o mais importante: o centro de atividades. Ou seja, a orientação de como participar, como divulgar, como contribuir na campanha e, o principal, como relacionar a sua atuação diária nas redes sociais com a campanha do seu candidato.
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Além disso, a impertinência, o uso de listas de emails e até a divulgação em massa de mensagens (spam) foram amplamente utilizados gerando um sentimento de repulsa e servindo para ampliar o distanciamento dos jovens da política e da participação. Confundir a internet com a rua, panfletagem com spam, ser invasivo, atuar pensando em volume, sem planejamento e sem profissionalismo é vulgarizar um canal que tem um imenso potencial de mobilização, de interatividade e de convencimento.
As últimas campanhas presidenciais americanas são o exemplo disso. E a partir delas se criaram muitas ilusões. Uma delas uma está definitivamente sepultada: os políticos brasileiros não vão arrecadar recursos para suas campanhas com doações voluntárias pela internet.
No entanto, tudo mais, das exemplares campanhas de Barack Obama, continua válido.
Cadastrei-me em 2008 no site do então candidato Obama. De lá para cá, não se passa uma semana sem uma mensagem dele, de apoiadores, do Bill Clinton e até mesmo, simpáticos e personalizados recados da primeira dama Michelle. Em todos constava sempre um pedido para doação, mas o importante é a visão de continuidade, de intimidade com o eleitor e a simplicidade resumidos em textos curtos e afirmativos. Boa parte deles remetia para vídeos também de curta duração e bem diretos.
Mitt Romney, nas prévias, usou telemarketing com voluntários. Ele também foi bastante eficiente na mobilização pela internet. Os centros de atividades orientavam desde como organizar uma reunião familiar, como percorrer a vizinhança, como fazer telefonemas voluntários e como mobilizar o cidadão para votar. Tutoriais detalhavam atuação nas redes sociais, em especial, no Facebook e no Twitter para os quais foram desenvolvidos aplicativos especificamente voltados às campanhas. Um exemplo de eficiência.
Da comparação entre o modo americano e o nosso de fazer campanhas na internet podemos destacar três aspectos que considero prioritários.
1. Marketing de permissão
A compreensão de que a permissão é a premissa básica para o relacionamento correto na internet é fundamental. Seth Godin é o pai da teoria do Marketing de Permissão que está resumida a seguir. Leia substituindo consumidor por eleitor:
“O marketing de permissão oferece ao consumidor uma oportunidade de aceitar voluntariamente o marketing que lhe querem apresentar. Ao falar apenas com voluntários, o marketing de permissão tem certeza de que os consumidores darão mais atenção à sua mensagem.
O marketing de permissão estimula os consumidores a participar de uma campanha de marketing de longo prazo e interativa, em que eles são, de alguma forma, recompensados por prestar atenção a mensagens cada vez mais relevantes. Ele é antecipado, pessoal e relevante.”
Essa premissa deve nortear qualquer atividade política na internet. Se não formos capazes de obter a permissão para o relacionamento (e será o cidadão que ditará seus parâmetros e limites), não poderemos nunca, de forma impertinente e inoportuna, encher sua caixa postal de emails e enviar indiscriminadamente propostas e propaganda eleitoral.
A partir dessa compreensão, não se usa spam, não se envia emails para listas conseguidas por terceiros etc.
A permissão do cidadão é o início de uma atividade política bem sucedida na internet.
2. Continuidade
É impossível construir uma rede de apoiadores, amigos, simpatizantes e voluntários em três meses. A legislação eleitoral impõe a data de 6 de julho como data de divulgação das candidaturas na internet.
Presos a isso, muitos candidatos consideram que a partir daí se começa a atuar na construção da sua rede de apoio. É um grande erro. O marketing político é uma atividade permanente. A apresentação de idéias, projetos e programas não pode se limitar aos três meses “legais” da campanha. O trabalho de criação da imagem do político empreendedor que tem soluções para sua cidade ou estado começa ontem, e sempre. Pensar uma campanha e a construção de uma presença significativa na internet de forma sazonal e efêmera é um imenso deslize. Aqueles que, pensando em disputar um mandato eletivo, consideram a internet como uma frente menor, secundária, passível de ser assumida perto da data da eleição, perderão a viagem. Não se firmarão na rede, não construirão uma estrutura capaz de interagir com o eleitor e, o mais grave, estarão menosprezando uma frente de ação onde está previsto que 90% dos seus integrantes, em 2014, estarão nas redes sociais e que o acesso móvel (smartphones e tablets) estará muito mais ampliado.
Começar já, construir uma rede de amigos e colaboradores é se preparar, corretamente, para os futuros embates.
3. Tecnologia e profissionalismo
Dos milhares de candidatos nas eleições municipais em 2012, quem usou o tablet como panfleto? Quem transmitiu suas atividades externas no seu site? Quem fez pesquisas usando a tecnologia de acompanhamento em tempo real? Quem rompeu os limites do mundo virtual para o real, orientando, acompanhando e usufruindo de uma ação política coordenada e controlada pelas modernas ferramentas existentes?
Gostaria de conhecer esse candidato tão antenado.
Na verdade, a questão da profissionalização nessa frente é colocada de lado. Pululam “especialistas” e curiosos. O candidato se deixa envolver por quem chega primeiro, pelo menor custo, pela solução caseira.
A tecnologia hoje, e mais ainda em 2014, abre muitas portas à criatividade e à inovação no campo do marketing político e das campanhas eleitorais. Saber acompanhá-la e adequá-la à sua realidade, com profissionalismo e determinação, é de suma importância.
Concluindo, quando os nossos políticos trocarem a impertinência pela permissão, a precipitação pelo planejamento e o amadorismo pela atuação profissional, conjugados, é claro, com a ética e a decência, teremos uma bela campanha eleitoral no espaço do internauta.
Vamos acreditar.
*É consultor e diretor da empresa Piguara.com e especialista em redes sociais e planejamento e organização de campanhas eleitorais
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