Fábio Góis
Um grupo suprapartidário de senadores decidiu, em reunião realizada nesta terça-feira (4), dificultar a já complicada situação do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no comando da Casa. DEM, PSDB, PT e PDT, bem como alguns integrantes do PMDB, decidiram assinar documento em que reafirmam o pedido de afastamento do peemedebista. O PSB espera a aquiescência do líder, Antônio Carlos Valadares (SE), para formalizar a adesão à iniciativa.
O líder do DEM no Senado, José Agripino (RN), informou que o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), membro do Conselho de Ética, ficará incumbido de examinar as 11 peças (seis denúncias e cinco representações) protocoladas contra Sarney por quebra de decoro. A intenção é que Demóstenes, que tem formação jurídica, avalie a ocorrência de posicionamentos indevidos nos documentos, no que tange aos ditames jurídicos.
Embora a decisão sobre os pedidos de investigação – prerrogativa do presidente do colegiado, Paulo Duque (PMDB-RJ) – seja eminentemente política, todo e qualquer posicionamento do colegiado deve ter embasamento jurídico. Com a função repassada a Demóstenes, senadores que querem a saída de Sarney querem impedir um eventual descumprimento regimental.
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Arrefecimento
Hoje, o tom dos discursos contra ou a favor de Sarney foi mais moderado em relação à sessão não deliberativa desta segunda-feira (3). Ontem, o que se viu foi o prenúncio de uma guerra declarada: depois de o senador Pedro Simon (PMDB-RS) ter ido à tribuna para reafirmar sua sugestão de afastamento de Sarney, um pronto contra-ataque foi posto em campo por aliados como o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), e Fernando Collor de Mello (PTB-AL).
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Nesta tarde, o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), recorreu à reflexão para questionar a permanência de Sarney à frente dos trabalhos legislativos. “Seria porventura normal o funcionamento do Congresso sob esse clima, dividido entre aqueles que de todo jeito insistem na permanência de vossa excelência na presidência da Casa e aqueles outros que não se conformam?”, indagou Sarney, que o observava da Mesa e disse que o responderia em discurso nesta quarta-feira (5).
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“Vossa excelência tem sido acusado de delitos graves, e tem o direito de se defender. E se defender para mim é explicar os delitos. E a resposta tem sido – em relação a mim, que não abri mão de denunciá-los – a de que haveria retaliação, a de que haveria a indicação do meu nome para exame do Conselho de Ética”, emendou o tucano, referindo-se à intenção do PMDB de ajuizar no colegiado uma representação contra ele, que assina as seis denúncias contra Sarney e participa partidariamente de três das cinco representações.
Retaliação ou reciprocidade
O PMDB considera que o tucano também cometeu deslizes que justificariam abertura de processo por quebra de decoro, como ter mantido na Europa assessor pago com dinheiro do Senado e ter cometido excessos no uso de verba de saúde em benefício de familiares.
“Será que dá para aceitar que o Conselho de Ética, posto como foi posto, recuse todas as ações propostas contra vossa excelência e aceite a minha, e este Senado funcione normalmente e vossa excelência se sedimente e se sente nessa cadeira cada vez mais sólido, cada vez mais firme, cada vez mais estável?”, provocou Virgílio.
Já o líder do DEM no Senado, José Agripino (RN), pediu a palavra para reportar a impressão que teria trazido dos cidadãos de seu estado em relação à instituição. “Hoje pela manhã, a Casa amanheceu – é o meu sentimento – meio de ressaca. E foi com esse sentimento que encontrei líderes partidários no gabinete do senador Sérgio Guerra [PSDB-PE]”, declarou Agripino, referindo-se à reunião suprapartidária que reforçou o pedido de afastamento a Sarney.
“Eu cheguei do meu estado onde eu ouvi muitas coisas, inclusive uma coisa que me chocou. Um conterrâneo me disse: ‘José Agripino, aquilo não é lugar para você mais não’. Eu ouvi, e ouvi como uma agressão, mas recolhi a reprimenda”, acrescentou o líder do DEM, partido que havia fechado com Sarney na corrida à presidência do Senado, mas que hoje retirou oficialmente o apoio à permanência do peemedebista.
“Presidente Sarney, o que percebo é que, hoje, esta é uma Casa conflagrada. (…) Se quisermos passar a limpo esta Casa, as denúncias que estão sendo feitas ao presidente Sarney têm de ser investigadas no fórum próprio, com independência, com atitudes firmes”, disse Agripino.
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Sarney ficou por poucos instantes presidindo a sessão de hoje. Depois, recolheu-se em seu gabinete com assessores para preparar o discurso de defesa que fará amanhã, em plenário. Ao deixar o Congresso pelo local conhecido como Chapelaria, espécie de entrada comum à Câmara e ao Senado, Sarney não deu declarações à imprensa.
Já Collor, confrontado com a notícia de que Pedro Simon o interpelaria na Corregedoria da Casa (leia mais), respondeu da seguinte maneira: “Manda ele [sic] ir…”, disse o senador alagoano. Sem precisar completar a frase. Em tempo: Simon disse ter ficado abalado com a postura de Collor ontem, na discussão em plenário: “Parecia um olhar de fogo, fulminante.”
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