O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, tornou-se ontem o principal alvo da oposição, após a confirmação de que dois de seus auxiliares estiveram na casa de Antonio Palocci no dia 16 de março, no momento em que o então ministro da Fazenda recebia do presidente da Caixa Econômica Federal o extrato bancário do caseiro Francenildo Costa.
Para a oposição, as novas informações indicariam que a violação do sigilo do caseiro foi uma "decisão de governo" e que contou, no mínimo, com a omissão de Bastos. Nessa segunda-feira, o PSDB apresentou, no Senado, um requerimento pedindo a convocação do ministro da Justiça para dar explicações sobre a violação do sigilo de Francenildo. Na quarta-feira passada, o PPS havia apresentado requerimento à Mesa Diretora da Câmara no mesmo sentido.
"Estou propondo a convocação do ministro para o plenário do Senado Federal. Não proponho que vá à CPI porque não quero tratá-lo como réu", afirmou o líder tucano, o senador Arthur Virgílio (AM). "Eu quero saber se houve omissão dele, do presidente Lula ou se não houve omissão (em relação ao caso)."
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Em depoimento espontâneo à Polícia Federal, no último domingo, o secretário de Direito Econômico, Daniel Goldberg, e o chefe de gabinete do ministro, Cláudio Alencar, confirmaram terem sido consultados por Palocci sobre a possibilidade de a PF investigar a existência de "movimentações financeiras atípicas" na conta do caseiro. Goldberg teria, inclusive, testemunhado a entrega dos extratos da conta de Francenildo a Palocci. Os dois negam, todavia, terem participado da violação ou da divulgação do sigilo.
No Senado, o requerimento do PSDB precisa da aprovação de, pelo menos, metade mais um dos senadores presentes à sessão. O presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), vai se reunir hoje com líderes partidários para discutir o assunto. Renan deve tentar convencer a oposição a desistir da convocação.
"Já basta termos uma investigação na Polícia Federal, investigação que foi muito eficiente", afirmou. "Não há nenhuma razão para paralisar o plenário. Há um esforço na oposição para criar um clima sucessivo de crise", criticou.
O líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), afirmou não haver clima para votar esse requerimento e que a pauta de votações do plenário, trancada por seis medidas provisórias, deveria ser priorizada. O presidente da CPI dos Bingos, Efraim Morais (PFL-PB), disse não ver a necessidade, por enquanto, de convocar o ministro para ir à comissão. O senador disse que pretende inicialmente analisar os depoimentos dos dois assessores de Bastos e de Palocci à Polícia Federal, previsto para ocorrer nesta quarta-feira.
O líder da oposição no Senado, José Jorge (PFL-PE), por sua vez, apresentou dois requerimentos de convocação à CPI, mas para ouvir Goldberg e Alencar.
Ministro diz não ver motivos para depor à PF
Durante visita ao Rio de Janeiro, Márcio Thomaz Bastos afirmou ontem que não vê motivos para prestar depoimento à Policia Federal no inquérito que investiga a quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo. Segundo Bastos, as investigações da PF – subordinada ao seu ministério – estão adiantadas e em fase de conclusão.
Bastos negou também qualquer envolvimento de Daniel Goldberg e Cláudio Alencar na violação da conta do caseiro. "Eles não são testemunhas de nenhuma irregularidade. Eles simplesmente foram lá (na casa de Palocci), receberam o pedido (de investigação), que não quiseram atender", disse Bastos. "Eles não assistiram à nenhuma quebra de sigilo nem a nenhum vazamento de sigilo", reforçou.
O ministro afirmou que tomou todas as providências cabíveis no episódio. Disse que soube da publicação da reportagem da revista Época, com o vazamento do sigilo bancário, no sábado (18) e que, no domingo, pediu ao diretor da Polícia Federal, Paulo Lacerda, a abertura de inquérito "com toda a liberdade e amplitude" para investigar a questão.
O inquérito, disse ele, foi instaurado na segunda. Na terça, Bastos pediu por escrito ao procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, que o Ministério Público Federal acompanhasse a investigação. "Essa investigação foi feita em tempo absolutamente compatível com a dificuldade, mas num tempo muito rápido", declarou.
O diretor-geral da Polícia Federal descartou ontem a necessidade de o ministro da Justiça ser convidado a depor no inquérito que apura a quebra ilegal do sigilo de Francenildo. "Havendo a necessidade, o delegado (do inquérito) faria o convite. No entanto, o que se verifica até o momento, é a absoluta desnecessidade desta medida (de ouvir o ministro). É apenas uma hipótese", declarou Paulo Lacerda.
Governistas saem em defesa de Bastos
A base aliada reagiu à tentativa da oposição de transformar o ministro da Justiça no novo alvo da crise política.
"Querer implicar o ministro nesta denúncia é o cúmulo da irresponsabilidade de uma oposição que aposta no clima de desestabilização do país", declarou o líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS).
Para o líder petista, o comportamento ético do ministro não pode ser questionado. "Durante os três anos e três meses em que o ministro Thomaz Bastos dirigiu a Polícia Federal, houve uma série de investigações delicadas, que envolveram figuras proeminentes, tanto adversários como aliados políticos, e o ministro passou por tudo com absoluto republicanismo", afirmou Fontana.
O senador tucano Alvaro Dias (PR) rebateu o petista. "A cada nova revelação o governo afunda mais", afirmou o vice-líder do PSDB no Senado. Para Dias, os indícios apontam, cada vez mais, que houve uma "decisão de governo" na quebra do sigilo do caseiro. "Thomaz Bastos tem de dar explicações sobre a sua participação no episódio", declarou.
A senadora Ideli Salvatti (SC), líder do PT, disse que a oposição perdeu o respeito ao falar do ministro da Justiça. "Estão com o mesmo modus operandi que tiveram com o Palocci. Passam meses falando bem do ministro e de repente vão ao ataque", ressaltou.
A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, também defendeu Bastos. "Ele é um dos melhores ministros da Justiça que este país já teve", afirmou.
O ex-ministro da Integração Nacional Ciro Gomes disse que acusar o ministro da Justiça é "passar totalmente da conta". "Não tem nada disso", afirmou Ciro, ao dizer que considera normal a presença de dois auxiliares diretos de Bastos na casa do ex-ministro Antonio Palocci, um dia antes de os dados da conta bancária do caseiro terem sido vazados para a imprensa. "O ministro da Fazenda chama um secretário da área econômica para ir à casa dele e ele não vai?"
PF deve indiciar Palocci por quebra de sigilo
Os depoimentos do secretário de Direito Econômico, Daniel Goldberg, e do chefe de gabinete do ministro Márcio Thomaz Bastos, Cláudio Alencar, praticamente decretaram o indiciamento do ex-ministro Antonio Palocci pela violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. O indiciamento deve ser oficializado nesta quarta-feira, quando está previsto o depoimento do ex-ministro à Polícia Federal. Ele pode ser indiciado ainda por outros dois crimes: advocacia administrativa (quando o servidor público age em seu benefício ou de terceiros) e por abuso de poder.
Goldberg confirmou que testemunhou a ida do então presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, à casa de Palocci no último dia 16. Segundo o secretário, o então ministro lhe perguntou se a PF poderia investigar Francenildo a partir da informação de que haveria uma movimentação financeira atípica na conta do caseiro. A resposta, negativa, teria sido dada no dia seguinte, após consulta a um delegado federal. A informação foi confirmada por Alencar.
"Diante disso, não há mais o que discutir. Acho que sim, que há elementos para indiciá-lo (Palocci)", afirmou o procurador Gustavo Pessanha, a quem caberá decidir se haverá denúncia contra o ex-ministro na Justiça.
O relator da CPI, senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), espera que Mattoso fale à CPI ainda nesta semana. "É ideal que ele (o ex-presidente da Caixa) preste depoimento o mais rápido possível para a gente conseguir avançar sobre os fatos novos." Também não está descartada a possibilidade de o ex-ministro da Fazenda ser convocado para prestar novo depoimento à CPI.
Palocci tentou afastar Polícia Civil de investigações
Goldberg e Alencar também contaram à PF terem sido consultados pelo ex-ministro sobre a possibilidade de tirar do comando da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual de São Paulo e transferir para a Polícia Federal a investigação sobre sua gestão como prefeito de Ribeirão Preto.
Em Ribeirão, Palocci e ex-assessores são investigados por supostas práticas ilegais, como manipulação de licitações, pagamento de propina e tráfico de influência. Para ele, o delegado Benedito Antonio Valencise estaria usurpando poderes do Judiciário ao investigá-lo sem a devida autorização do Supremo Tribunal Federal (STF), já que, como ministro, gozava de foro privilegiado.
Depois da conversa com Palocci, Goldberg disse ter discutido os questionamentos do ex-ministro com Cláudio Alencar, chefe de gabinete do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Para tentar transferir à PF a investigação que corre em Ribeirão, Palocci deveria usar um instrumento jurídico chamado "reclamação", fazendo esse pedido ao STF, sob o argumento de que, como ministro, teria direito a foro especial.
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