A de ontem foi em Montreal – e eu nem estava lá como atleta (dinheiro curto) nem como torcedor. De lá para cá, foram-se quarenta anos. Acordo, hoje, com uma outra olimpíada no meu caminho, desta vez no Rio de Janeiro, meu país.
Na de Montreal, andava por lá porque me era impossível viver por aqui, onde uma ditadura infelicitava a vida do país. Rebelei-me contra ela e paguei as consequências. Terminamos presos, eu e Janete, minha companheira de vida e de luta. Juntos, nas mãos da repressão, comemos o pão que o diabo amassou. Andava pelas tabelas quando Janete, perseverante, conseguiu me transferir para um hospital fora da cadeia. De lá, ganhamos o mundo.
Na de Montreal, aos vinte e nove anos, em companhia de um amigo canadense, Bertrand Brillon, que pagou os ingressos, fui assistir nas oitavas uma partida de futebol entre Brasil e outro país, de que não lembro o nome. Ganhou o Brasil. Saí do estádio comemorando a vitória apertada do país para o qual não podia voltar.
Na daqui, aos sessenta e nove anos, depois de uma longo trajetória de luta política, depois de ter criado os filhos Artionka, Camilo e Luciana e ver vicejar os netos Antonio, Thomas, Cloé e João, eu e Janete fomos convidados especiais para a abertura dos jogos no Maracanã. Agradecemos, mas recusamos.
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Clima olímpico no meio do marasmo? Impossível. Não, não podemos nos permitir, nesse momento de incerteza e decepção, tamanho distanciamento, tamanha insensibilidade. Há quarenta anos, éramos dois exilados políticos alimentados pela utopia da volta. Hoje, somos dois agentes políticos eleitos pelo voto popular: eu, senador, Janete, deputada federal. Somos representantes de um sistema político falido que insiste em tentar resolver problemas do presente com ferramentas enferrujadas do passado. Em que indivíduos em rede, descrentes, reproduzem o bordão: “Esse ou essa não me representam”.
Conclusão: a Olimpíada pegou nosso país mergulhado numa crise medonha que não nos permite devaneios antes de encontrar uma saída. Esta que está posta, a do impeachment, não resolve a crise. Aprofunda-a. Trata-se de uma encenação grotesca para encobrir nossa falta de cultura democrática. Infelizmente, em perda de valores essenciais, a pantomima vai custar os olhos da cara e os de sempre vão pagar a conta, ficando tudo como dantes no quartel de Abrantes.
Decepcionados, mas cheios de disposição de seguir adiante – sem abrir mão, claro, de colocar nosso magnífico país no cesto de utopias dos nossos tempos de Montreal.
Mesmo sabendo que perderíamos um inesquecível espetáculo, à altura da diversidade cultural brasileira, resolvemos fazer como todo mundo, acompanhar pela televisão. Devolvemos os convites.
Por essas e por outras, deixamos de ir ao Maracanã, Rio de Janeiro, Brasil, assistir à abertura oficial do XXXI Jogos de Verão da Era Moderna.
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