Felipe Seligman*
Nos últimos dias, publiquei no Congresso em Foco e na Agência Pública reportagem que mostra acusação do Comitê Popular da Copa contra o uso do dinheiro público pelo Governo do Distrito Federal. De acordo com documentos revelados na notícia, para bancar as obras do estádio Mané Garrincha – em números absolutos, o mais caro do Mundial, com despesas de R$ 1,4 bilhão – o governo vendeu terras administradas pela Terracap, a estatal local usada para, entre outras coisas, viabilizar a política habitacional da cidade.
A reportagem ainda mostrava que o déficit habitacional de Brasília é de 16%, quase o dobro da média nacional. Na opinião do Comitê Popular, o GDF tirou a prioridade da política habitacional para investir no estádio da capital, cujo histórico futebolístico se resume às equipes do Brasiliense, do ex-senador Luiz Estêvão, e Gama, ambos fora da primeira divisão do Campeonato Brasileito. No último ‘candangão’, o torneio distrital, quem venceu o campeonato foi o Luziânia, um time Goiás, com o mesmo nome de cidade de 170 mil habitantes a 60 km da capital.
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Na quarta-feira (11), dia seguinte à publicação da reportagem no Congresso em Foco, o Governo do Distrito Federal divulgou uma nota.
Interessante a resposta deles. Não dizem nada sobre a venda dos lotes. E o ponto do Comitê da Copa é outro. O déficit de moradia em Brasília é maior do que no resto do país. Exatamente a empresa “parceira em todos os projetos” de moradia, a Terracap, foi a responsável por bancar a construção do Estádio. E mais, o governo não diz nada sobre o documento do Conselho Fiscal da Terracap.
Esse documento, revelado na reportagem, mostra que os recursos da estatal estavam saindo sem volta. Tudo por causa da construção do estádio. Os prejuízos vão pra conta da Terracap , que é “parceira em todos os projetos” habitacionais.
Outro ponto. Segundo o GDF, “não é verdade” que o Mané é o mais caro da Copa. Eu sabia já que o argumento era de que o Maracanã proporcionalmente é mais caro, pois foi uma reforma, enquanto o estádio brasiliense passou por reconstrução. Por isso mesmo, a reportagem diz que o Mané é o mais dispendioso “em números absolutos”. Até porque essa análise do GDF é subjetiva. Objetivamente, quem gastou mais dinheiro foi Brasília.
A questão dos investimentos na cidade também é outra questão. Se tivessem construído um estádio mais barato e até um pouco menor, será que tudo isso que, segundo o governo, movimenta a economia de Brasília não teria acontecido exatamente igual?
A reportagem não critica o estádio em si, mas sim as escolhas que o levaram a ser inexplicavelmente caro. Veja-se o preço do Estádio do Grêmio, construído 100% com dinheiro privado e que custou mais ou menos um terço do que foi gasto em Brasília, e tem 60 mil lugares, só um pouco menor que os 72 mil lugares do Mané da capital.
*Felipe Seligman é jornalista e co-fundador da Indie Journalism, rede global de jornalismo independente
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