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“Eu quero contar um episódio. Na véspera de eu fazer meu discurso no plenário da Câmara (o pronunciamento foi feito no dia 17 de maio), havia uma apreensão muito grande dos partidos da base, em especial o PL e o PP, e do próprio governo. Dez minutos antes de eu sair para falar chega aqui, esbaforido, Pedro Corrêa (PE), presidente do PP: "Bob, cuidado com o que você vai falar. O governo interceptou uma fita de você exigindo do Lídio (Duarte, ex-presidente do Instituto de Resseguros do Brasil) dinheiro para o PTB". Eu dei um sorriso e disse: "Pedrinho, se era essa a sua preocupação, pode ficar tranqüilo, essa conversa nunca existiu. Não sou assim, nem o doutor Lídio é assim". Aí ele rebateu: "Mas pode ter sido seu genro (Marcus Vinícius Ferreira)". Eu falei: "Meu genro é um homem de bem. E eu vejo, Pedrinho, que você não tem convicção de fita nenhuma. Fica calmo que eu não vou contar nada do que eu sei a respeito de ‘mensalão’.” Leia também Mesada em troca de apoio ao governo “Um pouco antes de o Martinez (o ex-presidente do PTB José Carlos Martinez, morto em outubro de 2003) morrer, ele me procurou e disse: “Roberto, o Delúbio (Soares, tesoureiro do PT) está fazendo um esquema de mesada, um "mensalão", para os parlamentares da base. O PP, o PL, e quer que o PTB também receba. R$ 30 mil para cada deputado. O que você me diz disso?". Eu digo: "Sou contra. Isso é coisa de Câmara de Vereadores de quinta categoria. Vai nos escravizar e vai nos desmoralizar". O Martinez decidiu não aceitar essa mesada que, segundo ele, o doutor Delúbio já passava ao PP e ao PL. Morto o Martinez, o PTB elege como líder na Câmara o deputado José Múcio (PE). Final de dezembro, início de janeiro, o doutor Delúbio o procura: "O Roberto é um homem difícil. Eu quero falar com você. O PP e o PL têm uma participação, uma mesada, eu queria ver se vocês aceitam isso". O Múcio respondeu que não poderia tomar atitude sem falar com o presidente do partido. Aí reúnem-se os deputados Bispo Rodrigues (PL-RJ), Valdemar Costa Neto (SP, presidente do PL) e Pedro Henry (PP-MT) para pressionar o Múcio: "Que que é isso? Vocês não vão receber? Que conversa é essa? Vão dar uma de melhores que a gente?". Aí o Múcio voltou a mim. Eu respondi: "Isso desmoraliza. Tenho 22 anos de mandato e nunca vi isso acontecer no Congresso Nacional". Ministros sabiam da “mesada” “No princípio de 2004, liguei para o ministro Walfrido (Mares Guia, Turismo, PTB) e disse que precisava relatar algo grave. Conversamos num vôo para Belo Horizonte. "Walfrido, está havendo essa história de ‘mensalão’." Contei desde o Martinez até as últimas conversas. "Em hipótese alguma. Eu não terei coragem de olhar nos olhos do presidente Lula. Nós não vamos aceitar." E eu passei a viver uma brutal pressão. Porque deputados do meu partido sabiam que os deputados do PL e do PP recebiam. As informações que eu tenho são que o PMDB estava fora. Não teve "mensalão" no PMDB. Fui ao ministro Zé Dirceu, ainda no início de 2004, e contei: "Está havendo essa história de mensalão. Alguns deputados do PTB estão me cobrando. E eu não vou pegar. Não tem jeito". O Zé deu um soco na mesa: "O Delúbio está errado. Isso não pode acontecer. Eu falei para não fazer". Eu pensei: vai acabar. Mas continuou. (…) Lá para junho eu fui ao Ciro Gomes. Falei: "Ciro, vai dar uma zebra neste governo. Tem um "mensalão". Hoje eu sei que são R$ 3 mi, R$ 1,5 mi de mensal para o PL e para o PP. Isso vai explodir". O Ciro falou: "Roberto, é muito dinheiro, eu não acredito nisso". Aí fui ao ministro Miro Teixeira, nas Comunicações. Levei comigo os deputados João Lyra (PTB-AL) e José Múcio. Falei: "Conte ao presidente Lula que está havendo o "mensalão’". Nessa época o presidente não nos recebia. Falei isso ao Aldo Rebelo, que então era líder do governo na Câmara.” Por que Jefferson teria se calado inicialmente “Disse ao ministro Palocci: "Tem isso e é uma bomba". Fui informando a todos do governo a respeito do "mensalão". Me recordo inclusive de que, quando o Miro Teixeira, depois de ser ministro, deixou a liderança do governo na Câmara, ele me chamou e falou: "Roberto, eu vou denunciar o "mensalão". Você me dá estofo?". Eu falei: "Não posso fazer isso. Vamos abortar esse negócio sem jogar o governo no meio da rua. Vamos falar com o presidente Lula que está havendo isso". Me recordo até que o Miro deu uma entrevista ao Jornal do Brasil (publicada no dia 24 de setembro de 2004) denunciando o "mensalão" e depois voltou atrás. A reação de Lula ao saber da “mesada” “No princípio deste ano, em duas conversas com o presidente Lula, na presença do ministro Walfrido, do líder Arlindo Chinaglia, do ministro Aldo Rebelo, do ministro José Dirceu, eu disse ao presidente: "Presidente, o Delúbio vai botar uma dinamite na sua cadeira. Ele continua dando "mensalão" aos deputados". "Que "mensalão’?, perguntou o presidente. Aí eu expliquei ao presidente. (…)“O presidente Lula chorou. Falou: "Não é possível isso". E chorou. Eu falei: É possível sim, presidente. Estava presente ainda o Gilberto Carvalho (chefe-de-gabinete do presidente). Toda a pressão que recebi neste governo, como presidente do PTB, por dinheiro, foi em função desse "mensalão", que contaminou a base parlamentar. Tudo o que você está vendo aí nessa queda-de-braço é que o "mensalão" tem que passar para R$ 50 mil, R$ 60 mil. Essa paralisia resulta da maldição que é o "mensalão". O que Lula fez “Depois disso (da conversa) parou. Tenho certeza de que parou, por isso está essa insatisfação aí (na base parlamentar). Ele meteu o pé no breque. Eu vi ele muito indignado. E o presidente agora, desde janeiro, quando soube, eu garanto a você (que o "mensalão" foi suspenso). A insatisfação está brutal porque a mesada acabou. (…) Serenamente eu já tenho o caminho traçado: não me preocupa mais o mandato, não vou brigar por ele. Só não vou sair disso como um canalha, porque não sou. Experiência inédita “Nunca aconteceu. Eu tenho 23 anos de mandato. Nunca antes ouvi dizer que houvesse repasse mensal para deputados federais por parte de membros do partido do governo. O porquê da “mesada” “É mais barato pagar o exército mercenário do que dividir o poder. É mais fácil alugar um deputado do que discutir um projeto de governo. É por isso. Quem é pago não pensa.” |
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