O testemunho dado por dois ex-assessores do ministro Antonio Palocci de que o PT recebeu doação de Cuba na campanha eleitoral de 2002 e a suspeita de envolvimento do presidente Lula em lobby feito pelo empresário Marcos Valério para levantar a liquidação extrajudicial dos bancos Econômico e Mercantil recolocaram o governo na berlinda. Veiculadas anteontem por Veja, as duas acusações (leia mais) vêm à tona num momento em que a oposição já estava determinada a usar armas mais poderosas contra o Palácio do Planalto e o PT.
Nas últimas semanas, a base governista recuperou poder de iniciativa e ganhou algumas batalhas no enfrentamento com as bancadas oposicionistas. Em 28 de setembro, o preferido do Planalto, Aldo Rebelo (PCdoB-SP) foi eleito presidente da Câmara dos Deputados. Nas três CPIs nas quais é alvo de investigação (Correios, Bingos e Mensalão), o governo passou a adotar um comportamento mais agressivo, incluindo a apresentação de denúncias contra a oposição. Mais recentemente, comemorou o afastamento do senador Eduardo Azeredo (MG) da presidência nacional do PSDB, por ter recebido dinheiro do caixa dois de Valério para a campanha eleitoral de 1998.
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Tais fatos, associados ao avanço modesto das investigações em andamento no Congresso e à popularidade que o presidente Lula tem conseguido manter apesar da série de escândalos que atingem sua administração desde maio, vinham levando influentes tucanos e pefelistas a defenderem a radicalização do embate com o governo. A irritação aumentou após segunda-feira, dia 24, quando apareceram em Brasília cartazes em que o presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen, vestia uniforme nazista, numa foto-montagem. O sindicalista Avel de Alencar, filiado ao PT, assumiu a paternidade da façanha.
Foi nesse clima que o chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, teve de encarar – na quarta-feira, 26 – os irmãos de Celso Daniel na sessão da CPI dos Bingos na qual foi acusado de participar tanto do esquema de propinas da Prefeitura petista de Santo André como da operação-abafa montada para impedir a responsabilização dos culpados pela morte do ex-prefeito. Nessa mesma atmosfera, caciques oposicionistas como Agripino Maia (PFL-RN) e Tasso Jereissati (PSDB-CE) admitiram a possibilidade de a crise evoluir para um pedido de impeachment de Lula.
A artilharia da oposição
Esse cenário explica em grande parte a rapidez e a veemência da resposta da oposição às denúncias de Veja. PSDB, PFL e PPS já decidiram que representarão contra Lula e o PT na Justiça Eleitoral e no Ministério Público. Pedirão que as duas instituições abram investigações para verificar se os petistas realmente receberam doações provenientes do exterior, crime passível de pena de cassação de registro do partido. A eventual comprovação da denúncia também pode, em tese, embasar um processo de impeachment do presidente da República.
Outra decisão é que as duas principais fontes da denúncia, os ex-assessores de Palocci Rogério Buratti e Vladimir Poleto, serão chamados para depor no Congresso. Eles deverão ser ouvidos em sessão conjunta das CPIs dos Correios e dos Bingos (e, possivelmente, do Mensalão). Líderes oposicionistas cogitam ainda de convocar o próprio ministro da Fazenda. A idéia já tem dois defensores importantes, os líderes do PFL e do PSDB na Câmara, respectivamente, Rodrigo Maia (RJ) e Alberto Goldman (SP).
O mais importante ministro do governo Lula já foi acusado por Buratti de cobrar propinas de fornecedores quando foi prefeito de Ribeirão Preto (SP). Agora, também deve explicações sobre o suposto envolvimento de ex-auxiliares na generosa doação eleitoral despachada pelo país de Fidel Castro e que participação teve no lobby para encerrar a liquidação do Econômico e do Rural.
As novas denúncias também desafiam a versão até agora sustentada por Lula de que desconhecia o mensalão e as irregularidades em suas contas eleitorais e de que jamais teve qualquer relacionamento com Marcos Valério. Desta vez, com um agravante: como é o candidato o responsável pelas contas de sua campanha, não adianta alegar que “não sabia”.
Por isso mesmo, PFL e PSDB também já resolveram entrar com uma notícia-crime no Ministério Público em razão das irregularidades nas contas da campanha de Lula. Os dois partidos avaliam que é farto o material para isso. Ele inclui o depoimento do publicitário Duda Mendonça, que admitiu ter recebido dinheiro de caixa dois, e a omissão da prestação de contas de 2002 de recursos cuja origem o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares posteriormente atribuiu a empréstimos contratados com os bancos Rural e BMG.
Membro da CPI dos Correios, o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA) considera que a denúncia de que dinheiro cubano irrigou o caixa dois petista obriga a oposição a pensar novamente na possibilidade de pedir o impeachment de Lula. "A oposição errou feio lá atrás quando proibiu que se falasse em impeachment. É preciso acabar com esse veto. Pode ser que se conclua que não é o caso de impeachment, mas temos de analisar", disse ontem ACM Neto.
Na mesma linha, em nota à imprensa, Bornhausen afirmou: “A denúncia é gravíssima e tem de ser apurada em profundidade. O departamento jurídico do PFL foi acionado para estudar a questão sob todos os seus ângulos jurídicos. E, certamente, todas as providências legais serão tomadas”.
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