O Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro decidiu, por quatro votos a dois, pela cassação de meu mandato e pela inelegibilidade dos ex-governadores Anthony e Rosinha Garotinho. Ficou claro ao longo do processo que o julgamento teve cunho puramente político, e eu vou recorrer dessa decisão. Vou até a última instância.
A ação teve origem na alegação de que, em 12 de setembro de 2006, o Sr. Anthony William Garotinho, em troca de apoio à minha candidatura, se comprometeu em asfaltar logradouros públicos em Sapucaia.
Importante se faz destacar que as obras de pavimentação nas ruas de Sapucaia foram realizadas pela Prefeitura daquela cidade, que em 7 de agosto de 2006, solicitou ao D.E.R., por meio de ofício que foi anexado aos autos, massa asfáltica para a pavimentação de logradouros público do Município, o que é perfeitamente permitido pelo Regimento Interno daquela entidade e que situa o evento em data anterior à das eleições.
As obras em questão foram concluídas antes mesmo do período eleitoral, e outras um mês após às eleições, significando dizer que as mesmas não tiveram qualquer fim eleitoreiro, caso contrário, todas teriam sido realizadas e concluídas durante o calendário eleitoral.
Durante o trâmite da ação, foram ouvidas seis testemunhas arroladas pelo Ministério Público, sendo destas apenas um depoimento desfavorável, entretanto essa mesma testemunha, quando depôs perante o tribunal, entrou em contradição com seu depoimento anterior. Ademais, é inadmissível a prova exclusivamente testemunhal. A prova testemunhal é considerada como meio complementar da prova documental, conforme preceituam o Código de Processo Civil e o Código Civil. Como bem colocado por Rui Barbosa “a acusação é sempre um infortúnio enquanto não verificada pela prova”, e neste caso a prova nada comprova.
Não bastando a insuficiência testemunhal, confesso que me surpreende o fato de que tal processo possa mesmo ter tramitado, a despeito dos diversos vícios nele contidos. A começar pela intempestividade da Representação.
Segundo o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, o prazo para o ajuizamento das Representações pertinentes à Lei n° 9.504, de 30 de setembro de 1997, era de 5 (cinco) dias a contar do conhecimento do ato repudiado. Entretanto, houve a evolução do entendimento acerca da tempestividade das representações, firmando-se a jurisprudência de que o prazo para o ajuizamento de Representação com base no artigo 73, da Lei n° 9.504/97, é até o dia das eleições.
No caso concreto, resta clara a intempestividade da Representação, pois a mesma foi ajuizada no dia 28 de novembro próximo passado, ou seja, distribuída após as eleições, e 64 dias após o conhecimento do fato. Portanto, independente do entendimento em vigor, a ação deveria ser julgada intempestiva, declarando-se a perda do interesse de agir do Ministério Público.
O segundo vício repousa na ilegitimidade passiva do Primeiro Representado, o Senhor Anthony Garotinho que, segundo a ação, teria infringido o artigo 73, da Lei n° 9.504, de 30 de setembro de 1997, por meio da qual são disciplinadas as condutas vedadas aos agentes públicos, servidores ou não. Traduzindo em miúdos, os atos ali elencados apenas podem ser imputados aos agentes públicos, sejam servidores nomeados em caráter efetivo, com o atributo da estabilidade, após concurso público, sejam funcionários admitidos em caráter precário e que estejam ocupando cargos, empregos ou funções públicas, ou funcionários públicos por equiparação.
Ocorre que, o Primeiro Representado por ocasião , à época da reunião mencionada pelo Ministério Público Eleitoral, não ocupava qualquer cargo público, razão pela qual não poderia oferecer máquinas e / ou bens pertencentes à Administração Pública em troca do alegado apoio a minha candidatura, ou de quem quer que fosse. Significa dizer, que o Primeiro Representado não detém legitimidade para figurar no pólo passivo desta ação, uma vez que não pode ser punido pelas condutas vedadas pelo dispositivo legal supra citado, por não ser agente público.
Como se sabe, é vedado ao juiz proferir decisão, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em objeto diverso do que lhe foi demandado. E aí está o terceiro ponto questionável da ação, que caracteriza o julgamento extra petita.
O Ministério Público, ao ingressar com a Representação, fixou os limites da lide, cabendo aos Representados apenas se defenderem do pedido constante da exordial, ficando o Julgador adstrito aos limites fixados por este, não podendo julgar, portanto, fora do pedido.
Ocorre que, surpreendentemente, a procedência da ação está sendo fundamentada em abuso de poder, conduta não prevista no artigo 73, da Lei n° 9.504/97, e os Representados estão sendo condenados a pena de inelegibilidade, sanção não prevista no referido dispositivo legal. Enfatizo aqui que a inelegibilidade sequer foi pleiteada pelo Ministério Público, conforme se verifica pela simples leitura da petição inicial.
Além desses fatos, a acusação falhou em caracterizar o ilícito. O artigo 73, da Lei n° 9.504, de 1997, consiste em proibir os Agentes Públicos de ceder ou usar bens pertencentes à Administração, usar materiais ou serviços custeados pelo Governo, em beneficio de candidato, entre outras. E, como já afirmei aqui, as obras de pavimentação foram realizadas pela Prefeitura de Sapucaia.
Assim sendo, não pode-se imputar aos Representados as condutas vedadas pelo artigo 73, da Lei n° 9.504, de 1997, uma vez que as obras foram realizadas pela Prefeitura de Sapucaia, que solicitou, em data anterior à das eleições, formalmente, ao órgão do Governo do Estado ( D.E.R. ), massa asfáltica, não caracterizando-se, portanto, a hipótese de uso de máquinas e bens do governo para fins de favorecer candidato ao pleito eleitoral. Vale enfatizar que o Ofício da Prefeitura é datado de 7 de agosto, enquanto a citada reunião ocorreu em 12 de agosto, e que o Prefeito em questão apoiou a candidatura de outro candidato, não a minha.
A acrescentar tenho o parecer da Procuradoria Geral Eleitoral, cujo Vice-Procurador Geral Eleitoral, com assento junto ao Tribunal Superior Eleitoral, emitiu parecer opinando pelo desprovimento do Recurso contra Expedição de meu Diploma, interposto contra mim, consubstanciado na seguinte Representação, verbis:
“Utilizando a referida Representação n° 848/RJ como prova pré-constituída ( … ). No caso em testilha, não vislumbro a ocorrência do abuso do poder de autoridade ou interferência do poder econômico nem tampouco existência de potencialidade para influir no resultado final da eleição, visto que o Recorrido obteve 272.457 votos em todo o Estado do Rio de Janeiro e no município de Sapucaia obteve apenas 1.096 votos. Dessarte, resta patente que a conduta ilícita que lhe foi imputada não tem sequer probabilidade de comprometer o resultado do pleito”.
Não bastando os vícios supracitados, ainda resta a inexistência de potencialidade. Ainda, que a conduta proibida pelo artigo 73, da Lei n° 9.504/97, tivesse sido praticada, não teria ocorrido a potencialidade de afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos no pleito eleitoral.
O potencial de causar impacto no resultado final da eleição é elemento essencial para a caracterização da violação às regras da citada Lei. No caso concreto, não houve potencialidade para influir no resultado da eleição, uma vez que a referida conduta, supostamente praticada, não teria potencialidade em alterar o resultado da eleição, pois mesmo que não tivesse obtido nenhum voto em Sapucaia, ainda assim seria eleito .
Outrossim, ainda que os Representados tivessem praticado alguma das condutas vedadas pelo artigo 73, da Lei n° 9.504, de 1994, o que se admite por argumentação, deve ser observado o princípio da proporcionalidade. Conforme entendimento do TSE, “ A prática da conduta vedada do art. 73 da Lei das Eleições não conduz, necessariamente, à cassação do registro ou do diploma, cabendo ao magistrado realizar o juízo de proporcionalidade na aplicação da pena prevista no parágrafo 5º do mesmo dispositivo legal.
Independente do resultado, esse julgamento político que a mim foi imputado, assim como ao ex-Governador Anthony Garotinho e à ex-Governadora Rosinha, foi um ato covarde, um linchamento político, imposto não a mim, mas aos 272.457 eleitores que me confiaram seu voto para , aqui nesta Casa, representá-los.
Entretanto, a despeito dessas disputas regionais que ora contaminam alguns julgadores no âmbito dos Estados, quero afirmar a minha plena confiança na Justiça. E mais uma vez, recorro ao nosso ilustre Rui Barbosa:
“Eu não troco a justiça pela soberba. Eu não deixo o direito pela força”.
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