Erich Decat
Os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) terão a tarefa de responder, a partir de hoje (5), à pergunta para a qual nem mesmo os grandes pensadores da humanidade tiveram uma resposta conclusiva: afinal, quando começa a vida?
A polêmica questão – que gera controvérsia entre acadêmicos e religiosos – foi levada à Corte, ainda em 2005, pelo então procurador-geral da República Claudio Fonteles, por meio de uma ação de inconstitucionalidade (Adin) que contesta o uso de células-tronco embrionárias para fins de pesquisa científica.
Fonteles estará esta tarde na primeira fila do plenário do STF para assistir àquele que, segundo ele, será o julgamento mais importante da história do Supremo. Nesta entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, o subprocurador-geral da República denuncia a existência de interesses econômicos por trás da defesa das pesquisas com células-tronco embrionárias, chama o governo federal de omisso e cobra alternativas dos cientistas.
“Por que nossos cientistas não mergulham para achar outras variáveis? Num quadro de cem variáveis, eu só estou tirando uma e dizendo o seguinte: olha, esquece essa aqui porque ela está matando, e não é justo matar para curar”, afirma.
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Fonteles critica a elaboração da Lei de Biossegurança, aprovada pelo Congresso após intenso embate em 2005, condena a falta de investimentos do Ministério da Saúde em pesquisas voltadas para doenças degenerativas e reclama maior fiscalização sobre as clínicas de reprodução assistidas.
Membro da Ordem Franciscana, da Igreja Católica, há dez anos, o subprocurador-geral afirma que, ao contrário do que apregoa, sua argumentação não tem caráter religioso.
Indicado pelo presidente Lula no começo de 2003, Cláudio Fonteles deixou a chefia da Procuradoria Geral da República em 2005 sob elogios do governo e da oposição. Na época, pediu a abertura de investigações contra o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, e o então ministro da Previdência Social, Romero Jucá.
Veja a íntegra da entrevista:
Congresso em Foco – Qual é o objetivo dessa Adin que o senhor protocolou no Supremo Tribunal Federal?
Cláudio Fonteles – Dessa Lei [de Biossegurança] eu questiono apenas o artigo 5º, porque a razão de ser dessa lei não é o artigo 5º, a razão dela é regulamentar o plantio e a distribuição de alimentos transgênicos. Aí o Parlamento coloca dentro dessa lei um artigo sobre pesquisa de células-tronco embrionárias com fins terapêuticos. Não tem nada a ver. O legislador foi infeliz ao colocar essa matéria no artigo fora do conjunto da obra. Esse artigo está fora do contexto, é óbvio.
Por que, para o senhor, a pesquisa com células-tronco embrionárias é inconstitucional?
Porque, para mim e para muita gente, a vida começa na fecundação. A partir da fecundação, o zigoto, por ele próprio, já no segundo dia, se transforma em duas células; no terceiro dia, quatro, e dessa forma vão se criando todos os sistemas.
O artigo 5º da Lei de Biossegurança, se for julgado inconstitucional pelo Supremo, não acaba com a esperança de milhares de pessoas que têm doenças degenerativas e que aguardam uma possível cura graças ao uso das células-tronco embrionárias?
A resposta é não! Porque a minha ação, se julgada procedente, vai impedir uma única linha de pesquisa que é com embrião humano. Há dez anos são realizadas pesquisas com embriões no mundo e quais são os sucessos que já tiveram com esse tipo de pesquisa? Zero, não tem nenhum! Onde você tem sucessos no mundo? Na medicina regenerativa, no uso da célula-tronco adulta. Os resultados não são absolutos, mas já se tem sucesso. E outra, a medicina evolui numa rapidez enorme para mostrar que não impede nem frustra expectativas. Além disso, hoje já existem grandes vertentes consolidadas. A primeira é o uso do líquido amniótico, uma fonte de pesquisa de células pluripotentes que pode regenerar praticamente 80% do organismo. Outra opção são as células-tronco adultas no cordão umbilical, que também são fonte de pluripotência.
Existem outras alternativas, então?
No entanto, há uma grave omissão do Ministério da Saúde. Se o governo realmente quer realizar uma política solidária e popular, por que não cria centros em cada uma das unidades da federação, de coleta e preservação de cordão umbilical de cada brasileiro que esteja nascendo? Isso seria uma alternativa fundamental, porque pessoa com dois ou com três anos de idade que esteja na cadeira de rodas em razão de uma doença degenerativa, tem ali a fonte de recuperação. Cadê o governo fazendo isso, meu Deus do céu? Para todas essas pessoas, tem um enorme leque aberto de alternativas. Por que nossos cientistas não mergulham para achar outras variáveis? Num quadro de cem variáveis, eu só estou tirando uma e dizendo o seguinte: olha, esquece essa aqui porque ela está matando, e não é justo matar para curar.
Mas consta da lei que apenas os embriões considerados inviáveis e com mais de três anos podem ser usados para fins de pesquisas e terapia. O senhor não está sendo radical?
Não concordo com isso. Mostramos em audiências públicas que nós temos aqui no Brasil uma brasileira vivendo que é resultado de embrião que ficou congelado mais de cinco anos. Ela está aí, vivendo. Outro exemplo, nos EUA você tem vivendo, como nós, embriões que ficaram congelados por sete, nove, doze anos.
Então, o que fazer com os milhares de embriões que estão congelados em clínicas especializadas, caso a pesquisa com células-tronco embrionárias passe a ser inconstitucional?
Assim como acontece nos EUA, nós podemos fazer uma campanha para as pessoas que realmente não possam ter filhos adotarem esses embriões.
O senhor adotaria?
Claro. Mas há também uma outra questão que é fazer uma coisa limitada. O grande problema que está por trás é o seguinte: por que você tem que fecundar muitos embriões como normalmente acontece hoje? A razão disso é econômica, o comércio. Acho que há interesse comercial, isso é inequívoco. Os laboratórios investem em cima disso.
Como deveria ser feito o controle?
Mais uma omissão que quero apontar. Nós estamos nesse debate h&aacut
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