O Ministério das Cidades liberou suas obras feitas a partir de emendas parlamentares sem fazer análise técnica preliminar dos pedidos feitos por deputados e senadores, abrindo a porta para irregularidades como superfaturamento e desvios, segundo auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU).
De acordo com a reportagem de Marta Salomon, na edição de hoje (21) da Folha de S. Paulo, essas obras somam 90% dos contratos assinados entre 2003 e outubro de 2006 e totalizam R$ 2,4 bilhões. As conclusões já foram aprovadas pelos ministros do TCU.
Conforme a auditoria, os repasses de dinheiro público no Ministério das Cidades seguem duas regras: com ou sem análise técnica preliminar, antes da assinatura dos contratos. Esse último caminho é reservado às emendas. As mesmas que possibilitaram desvio de mais de R$ 1 bilhão na compra superfaturadas de ambulâncias no esquema dos sanguessugas.
Cerca de 90% das obras contratadas pelo ministério para a área de infra-estrutura urbana, saneamento e habitação são originárias de emendas parlamentares. "Obras ligadas a emendas parlamentares são contratadas sem qualquer verificação preliminar do ministério", diz o texto. "Não existe qualquer avaliação por parte do ministério antes de se proceder a assinatura do contrato de repasse", prossegue o TCU.
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Critérios técnicos
Foram objeto de seleção e análise prévia, durante a auditoria, apenas R$ 148 milhões, justamente o valor destinado às obras que não foram solicitadas por parlamentares. “Tais percentuais evidenciam que o processo de seleção de obras com base em critérios técnicos ganha ínfima importância com relação ao planejamento global da infra-estrutura urbana do país", criticam os auditores.
Ainda segundo a Folha, o TCU determinou mudança nas regras dos contratos, cuja administração é delegada à Caixa Econômica Federal. "O resultado deste modelo ineficiente traz as mais diversas situações usualmente apontadas por esta Corte de Contas: superfaturamento, obras inacabadas, atraso na disponibilização das obras à população beneficiária, destinação de recursos a intervenções desnecessárias ou não prioritárias, entre outros", diz o relatório do ministro Ubiratan Aguiar.
O TCU argumenta que a Lei 4.320/64 determina que só seja feita dotação para uma obra após a análise do órgão competente, no caso, o ministério. A pasta alega que já faz a análise numa fase intermediária – após a assinatura do contrato e antes do início das obras. O TCU cobra, no entanto, uma avaliação da oportunidade e conveniência técnica das obras propostas por emendas antes da assinatura dos contratos, alegando que a análise atual é falha.
Regra mudou, diz ministério
Procurado pela Folha, o Ministério das Cidades informou que mudou o sistema de contratação de obras em 2005 e, desde então, não libera dinheiro público antes de concluir a análise técnica dos empreendimentos.
"Em julho de 2005, quando assumiu o Ministério das Cidades, Márcio Fortes constituiu grupo de trabalho para analisar cerca de 300 projetos que estavam represados, a maioria relativos a emendas. Hoje, a análise é rotina das áreas técnicas", afirmou a assessoria.
O TCU reclama a análise dos projetos antes das assinaturas dos contratos. De acordo com o tribunal, a apreciação da Síntese de Projeto Aprovado (SPA) – documento da Caixa Econômica Federal e sem a qual nenhuma obra poderia mais ser iniciada – ocorre depois de feitos os contratos.
"Persiste a incoerência de se optar por executar intervenções ligadas a determinada emenda antes que se tenha qualquer apreciação ou mesmo conhecimento a respeito de suas características”, diz o relatório. O Ministério das Cidades informa que ainda analisa decisão do TCU: "O ministério reconhece o trabalho do Tribunal de Contas da União como órgão fiscalizador e está analisando o acórdão recebido ontem".
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