VEJA
Carona popular
As primeiras sondagens sobre as eleições presidenciais de 2010 mostram que, se nada de extraordinário ocorrer até lá, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva exercerá um papel importante na própria sucessão. Personagem principal das últimas cinco eleições, ele não estará entre os candidatos. Em entrevistas recentes, Lula disse que pretende se empenhar na campanha de seu sucessor usando, para isso, um capital hoje muito expressivo: sua popularidade. Uma pesquisa divulgada na semana passada pelo instituto Sensus mostra que o presidente é um cabo eleitoral poderoso. Somente 27% dos entrevistados disseram que não votariam em um candidato apoiado por Lula. O restante admite a possibilidade de seguir a orientação do presidente. Isso, porém, não quer dizer que o escolhido por Lula possa começar a pensar na faixa presidencial. De acordo com a pesquisa, 10% votariam cegamente no sucessor indicado por Lula, independentemente de quem seja, 25% admitem a possibilidade e 32% tomariam a decisão apenas depois de conhecer o candidato. Ou seja: o fato de o presidente ser popular não significa necessariamente que ele consiga – ou queira – transferir esse patrimônio para um aliado. Essa será a principal incógnita dos próximos três anos. "A transferência de votos não será fácil. O eleitor de Lula identifica-se com ele, com a sua trajetória sofrida e com a origem pobre do presidente. Não há um candidato com perfil semelhante", explica o diretor do Datafolha, Mauro Paulino.
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O morto-vivo
O Senado funcionou na semana passada com uma eficiência que não se via desde o início da crise envolvendo o presidente licenciado, Renan Calheiros. Com seu afastamento, a pauta foi destrancada e projetos cruciais, como a ampliação da licença-maternidade e a criação de regras para a fidelidade partidária, foram aprovados. Até a discussão da polêmica recriação da CPMF, que gera um legítimo embate entre governo e oposição, produziu resultados. Identificado como o responsável pela paralisação do Congresso, Renan Calheiros desapareceu. Ele sumiu do Senado, não deu entrevistas, não saiu de casa. Na quarta-feira, chegou a agendar um almoço com a bancada do PMDB, mas foi aconselhado a evitar aparições públicas. Renan, agora, finge-se de morto para tentar sobreviver. Sitiado por cinco processos de quebra do decoro parlamentar, o senador sabe que não tem mais condições de voltar a presidir o Congresso, cargo interinamente ocupado pelo vice Tião Viana. Sua estratégia é submergir o tempo necessário para tentar salvar o mandato, uma tarefa improvável.Na segunda-feira passada, a Mesa Diretora do Senado autorizou a abertura no Conselho de Ética de um novo processo para apurar a tentativa de espionagem de um assessor de Renan contra dois senadores da oposição. Na quinta-feira, o PSOL entrou com outra representação contra o peemedebista, baseada em reportagem do jornal O Estado de S. Paulo revelando que Renan apresentou uma emenda orçamentária para uma empresa-fantasma, de propriedade de um ex-assessor, para supostamente realizar obras em Murici, cidade administrada por seu filho, Renanzinho. Além disso, os senadores marcaram a data para o encerramento de dois outros processos em que o senador é acusado de irregularidades – usar laranjas para comprar emissoras de rádio e ter feito lobby em favor de uma cervejaria. Com o cerco crescendo, Renan usa suas últimas fichas.
Fraude de 500 milhões de reais
A investigação que levou à cadeia o empreiteiro Zuleido Veras, dono da construtora Gautama, mostrou que não existe negócio melhor no Brasil do que uma boa e, se possível, gigantesca obra pública. Com alguns amigos no governo, um lobista eficiente no Congresso e um estoque de malas e envelopes de apoio, os lucros são vultosos para quem se habilita no ramo. A CPI do Apagão Aéreo, que termina nesta semana no Senado, mostra mais uma vez que a praga da corrupção está na raiz de praticamente tudo o que existe de errado na administração pública. Para tentar entender os motivos que levaram o país a enfrentar uma crise aérea sem precedentes, os parlamentares resolveram investigar a Infraero, empresa responsável pela administração dos aeroportos brasileiros. Descobriram aquilo que se suspeitava. Em apenas quatro anos, 500 milhões de reais foram desviados das obras dos principais aeroportos do país. É dinheiro de impostos que deveria estar amenizando a situação de penúria dos passageiros que viajam de avião, mas que acabou rateado entre empresários, funcionários públicos e corruptos de todos os matizes. A comissão investigou os gastos com a construção e reforma de dez aeroportos. Todas as obras apresentaram irregularidades que vão de direcionamento de licitações a superfaturamento. A CPI pediu o indiciamento de 21 pessoas e listou catorze empreiteiras como responsáveis pelos desvios milionários na Infraero.
ISTO É
A receita do doutor Viana
Aos 46 anos, o presidente interino do Senado, Tião Viana (PTAC), é um homem acostumado a enfrentar grandes desafios. Ele despertou para a política na esteira de seu irmão Jorge Viana, duas vezes governador do Acre. Durante o primeiro governo do irmão no Estado (1999-2002), Tião, médico infectologista, criou um programa de saúde itinerante, que levava profissionais de saúde às regiões distantes, dentro da floresta. Hoje, seu desafio é pacificar o Senado depois da crise que, há duas semanas, levou Renan Calheiros (PMDB-AL) a pedir licença da presidência da Casa para tentar conter a onda de representações que se abateu sobre ele desde a denúncia – até hoje não comprovada – de que o lobista de uma empreiteira pagava as contas da filha que teve numa relação extraconjugal com a jornalista Mônica Veloso. A julgar pela avaliação de seus pares, Tião Viana vem se saindo muito bem. O senador Jefferson Péres (PDTAM), um dos poucos parlamentares que preservam hoje no Congresso uma imagem de respeito à ética e moralidade política, subiu à tribuna na quarta-feira 17 à tarde para fazer um rasgado elogio ao presidente interino da Casa. “O que eu vi hoje pela manhã no Senado foi política com P maiúsculo”, disse Péres, referindo-se a uma reunião que Viana patrocinara pela manhã, entre os senadores e o também presidente da República interino, José Alencar (que substituía Luiz Inácio Lula da Silva, em viagem à África, na semana passada), para negociar a aprovação da CPMF. “O que se vinha fazendo no Senado até então era um tipo de política menor, que me dá alergia, urticária”, completou. Na verdade, o objetivo de Péres era unir-se à banda que fustiga o senador Renan Calheiros. O elogio foi colhido com satisfação por Tião Viana. Será justamente a sua capacidade em conseguir conduzir o Senado de volta a uma situação de normalidade que poderá lhe dar a possibilidade de permanecer na presidência depois da licença de Renan. Nove entre dez senadores apostam que o alagoano não terá a menor condição política de retornar à presidência quando acabar a licença de 45 dias que pediu. Mas os mesmos nove senadores avaliam que as chances de Viana se efetivar no cargo são muito pequenas. Para reverter essa situação, o senador acreano aposta no seu talento de conciliação: se passar ileso pelo furacão, conseguindo aprovar a CPMF como quer o governo e sem ferir suscetibilidades na oposição, as chances de Viana podem virar.
Um novo modo de fazer política
Há algo de novo na atual geração de governadores do País. E não é exatamente a idade média, abaixo dos 50 anos. Ao conquistar pela segunda vez o governo do Amazonas, por exemplo, o engenheiro eletricista Eduardo Braga, 46 anos, deixou para trás dois grupos radicais que se digladiavam quanto à forma de convivência com a Floresta Amazônica. De um lado, ambientalistas que insistiam em manter a floresta intocada. De outro, os que chegavam a distribuir motosserras para as populações ribeirinhas. Encontrando a racionalidade no meio-termo, Braga estabeleceu uma forma de conciliar as tecnologias mais modernas das indústrias que abriga na Zona Franca de Manaus ao discurso do desenvolvimento sustentável da exploração da floresta. Com isso, vem agregando valor e conferindo mais eficiência a essas atividades extrativistas. É um exemplo do que parece haver de novo e comum na atual geração de governadores: no lugar das disputas ideológicas e partidárias mais radicais do passado, uma atuação mais pragmática, que visa a obter maior eficiência administrativa.
Serra não pede dinheiro a deputado
Há um impasse entre o governador José Serra e a bancada de parlamentares federais paulistas. O Congresso vive a temporada das emendas ao Orçamento de 2008. Há cerca de R$ 300 milhões reservados para obras da União em São Paulo. Por tradição, os governadores vão a Brasília, reúnem as bancadas e apontam as prioridades. Os deputados paulistas esperam que Serra peça a eles uma emenda coletiva pelo Rodoanel da capital. Mas Serra se recusa a marcar a reunião. O deputado Michel Temer, presidente do PMDB, tem uma proposta para o impasse: que se entregue toda a verba de São Paulo ao Ministério da Saúde para obras nos hospitais do Estado. E que Serra não seja convidado para as inaugurações.
Bandeira Ana Paula é a mais nova comunista
Nem toda nudez será castigada. Pelo menos se depender do ministro dos Esportes, Orlando Silva, que conseguiu “seduzir” a assistente de arbitragem Ana Paula de Oliveira para ser a mais nova comunista do Brasil. Afastada há quatro meses dos gramados, a bandeirinha que virou estrela pop depois de ter posado nua para uma revista masculina resolveu arriscar-se em mais um lance audacioso: ela quer entrar para a política. No início do mês, Ana Paula assinou sua ficha no Partido Comunista do Brasil (PCdoB), dias antes de encerrar o prazo de filiação para as eleições municipais de 2008. Segundo seu partido, ela pretende disputar uma cadeira na Câmara Municipal de São Paulo. Ainda é cedo para saber se ela terá votos. Mas no PCdoB, partido fundado em 1962 sob inspiração maoísta, ninguém duvida da “musculatura eleitoral” da moça para reerguer uma legenda que anda em baixa.
ÉPOCA
Os documentos de um golpe bilionário
A reportagem de ÉPOCA teve acesso a documento interno do Banco do Brasil enviado no ano passado à Polícia Federal com informações sobre as tentativas de saques bilionários. Uma das quadrilhas envolvidas no golpe foi desbaratada nesta sexta-feira pela Operação Alquimista, da PF. No documento, encaminhado também ao Banco Central, o BB informa que, no ano 2000, emitiu extratos referentes ao ano de 1999 com "valores incorretos e extremamente elevados". Os valores seriam referentes a aplicações em CDB e RDB (certificados de depósito bancário e recibos de depósito bancário). "Constatada a incorreção dos valores que constavam nos referidos demonstrativos, foi providenciado o envio de novos documentos, com os valores corretos e contendo, inclusive, ressalva quanto à substituição daqueles anteriormente emitidos". O documento do banco faz referência às ações do grupo preso hoje pela PF. Nesse caso, o extrato — ou informe de rendimentos financeiros, conforme relata o banco — foi expedido em nome de João Baptista da Silva Filho, cliente da agência do banco em Americana (SP). "Logo após a constatação do equívoco, o noticiante encaminhou ao cliente, via correio, novo informe de rendimentos, com orientação no sentido de que deveria ser desconsiderado o anterior", escreveram os advogados do banco no documento enviado à PF.O problema é que, apesar do aviso de que o extrato estava errado, começaram a ocorrer sucessivas tentativas de saque de valores vultosos da conta de João Baptista da Silva Filho. Numa delas, anterior à tentativa de saque de R$ 1 bilhão flagrada pela PF, a quadrilha tentou transferir R$ 20 milhões. À época, a pessoa que tentou efetuar a transação se dizia representação de dirigentes do Sindicato de Pequenas e Médias Empresas de São Paulo.
Procura-se um sucessor
O governo tenta achar um candidato à presidência do Senado. Um dos desafios é remover os escombros deixados por Renan Calheiros
Fidelidade para todos
A nova decisão do TSE muda o jogo da sucessão presidencial em 2010 e ameaça até governadores
Esta festa pode acabar
A fundação nacional da saúde (funasa), um órgão do ministério da Saúde com orçamento de R$ 4 bilhões para investimentos em saneamento básico nos próximos quatro anos, virou um dos principais alvos dos órgãos de fiscalização encarregados de combater a corrupção no governo federal. Em setembro, ÉPOCA revelou as investigações do Ministério Público Federal, da Corregedoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre contratos sem licitação ou superfaturados, serviços pagos sem ser prestados, entre outras irregularidades. Agora, o governo está dividido sobre o que fazer com esse ninho de problemas. Entre os ministros de Lula, começa a ganhar força uma corrente que defende a extinção da Funasa, com a transferência das obras de saneamento para o Ministério das Cidades e da missão de cuidar da saúde das comunidades indígenas para a Fundação Nacional do Índio (Funai), como a melhor solução. Essa não é a avaliação predominante no governo, mas, há dez dias, a insatisfação do Palácio do Planalto com a atuação da Funasa virou assunto público durante uma visita da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do ministro da Defesa, Nelson Jobim, à Amazônia. Ao lado do governador do Amazonas, Eduardo Braga (PMDB), eles criticaram abertamente a inoperância da Funasa. “Se quiser fazer o PAC da Funasa aqui, que faça com o Exército, não com a Funasa”, afirmou Eduardo Braga. “A Funasa não faz nem ao lado da casa dela, vai fazer aqui?”, disse Dilma, em concordância com o governador.
CARTA CAPITAL
O congresso comunista sacramenta uma nova estratégia para o capitalismo
Na China, como outrora na URSS, os congressos do Partido não tomam decisões reais, mas, ao sacramentar novas fórmulas e a ascensão de figurões ao comitê central do Politburo, permitem entrever tendências, preocupações e conflitos internos de burocracias que passam a maior parte do tempo encenando união monolítica e harmoniosa continuidade. Sinais importantes podem estar contidos no que, aos ouvidos do Ocidente, soa vazio ou enigmático. Como quando este 17º Congresso do PC chinês, além de garantir a reeleição do presidente Hu Jintao para o segundo e último mandato de cinco anos, consagrou na constituição (programa) do partido o seu lema de “Desenvolvimento pela Visão Científica”, junto com o marxismo-leninismo, o Pensamento de Mao, a Teoria de Deng Xiaoping e a tese das Três Representações consagrada pelo predecessor Jiang Zemin em 2002, acrescentando sua própria camada geológica para reduzir as políticas precedentes a meros fósseis, objetos de homenagens rituais e vazias. A prioridade das “forças produtivas” – junto com a abertura das fileiras do Partido aos empresários desde então incluídos na “esmagadora maioria” – significou, na prática, uma exacerbação do capitalismo autoritário para o qual a China se dirigia desde a virada iniciada por Deng em 1978. Isso diluiu as fronteiras entre público e privado, governo e empresas, multiplicando modalidades e oportunidades para a corrupção, enquanto o crescimento do PIB e a prosperidade do capital, articulado à “orientação” estrita da vida cultural, tornou-se o parâmetro único de Pequim.
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