Daniela Lima
Os senadores usaram mais de R$ 2,2 milhões de verba indenizatória nos três primeiros meses de 2009. Esse número exclui os gastos de 21 parlamentares ainda não publicados no site do Senado. O dinheiro deve ser usado exclusivamente para despesas relacionadas ao exercício do mandato.
Cada parlamentar tem direito a R$ 15 mil mensais de verba indenizatória, ressarcidos mediante a apresentação de notas fiscais. Na prestação de contas divulgada no site do Senado, os gastos aparecem divididos nas rubricas escritório político, locomoção/alimentação e combustível, material de expediente, consultorias e divulgação.
Veja quanto cada senador gastou este ano
No Senado e na Câmara, os congressistas debatem a incorporação da verba indenizatória aos salários. Os parlamentares teriam liberdade para gastar o dinheiro sem prestação de contas.
Falta de transparência
Segundo levantamento do Congresso em Foco, a rubrica predileta dos parlamentares no primeiro trimestre deste ano foi a que reembolsa despesas com locomoção, alimentação, hospedagem, combustíveis e lubrificantes.
Para se ter uma idéia, em janeiro, mês em que eles estavam de recesso, R$ 360,6 mil foram ressarcidos aos parlamentares por conta dessas despesas (veja quanto cada senador gastou em janeiro, fevereiro e março).
As prestações de contas dos 62 senadores que pediram ressarcimento em março apontam para uma economia de R$ 170.285,63 mil quando comparadas aos gastos que os mesmos apresentaram em fevereiro, mês das primeiras denúncias sobre o uso indevido do dinheiro destinado às atividades do mandato.
À época, surgiram as revelações de que o deputado Edmar Moreira (sem partido-MG), havia usado toda a verba indenizatória dos anos de 2007 e 2008, um montante de R$ 236 mil, para pagar as próprias empresas de segurança. No início daquele mês o Congresso em Foco revelou com exclusividade que o deputado mineiro foi o campeão de gastos com segurança particular entre os 513 deputados, nos dois primeiros anos da legislatura.
A denúncia repercutiu no Senado, e, vários senadores passaram a defender uma regulamentação mais clara para o uso da verba.
Mas na contramão da transparência, a Casa, ao acumular na mesma rubrica locomoção, hospedagem, alimentação, combustíveis e lubrificantes na divulgação dos dados, impede que o contribuinte saiba exatamente quanto foi gasto para abastecer os carros dos senadores, e quanto foi usado, por exemplo, para hospedagem em hotéis. Na Câmara, o público tem acesso aos valores das despesas e ao registro das empresas em que os gastos foram feitos, separadamente.
Assim como em janeiro, em fevereiro e março, locomoção, hospedagem, alimentação, combustíveis e lubrificantes foi a rubrica em que mais dinheiro foi gasto. Os senadores foram ressarcidos, nesses dois meses, em R$ 374,5 mil e R$ 187,3 mil, respectivamente. Somados, no trimestre, esses gastos chegaram a R$ 923 mil.
A segunda rubrica mais usada pelos parlamentares para pedir ressarcimento de gastos é a que trata de aluguel de imóveis para escritórios políticos e “despesas concernentes a eles”, que seriam gastos com telefone, água e luz, por exemplo. Nesse quesito, os parlamentares gastaram, no primeiro trimestre, R$ 608,1 mil. A curiosidade fica, novamente, com os gastos no mês de janeiro, que foram maiores que nos meses seguintes: R$ 235 mil.
Incorporação ao salário
A principal argumentação para a incorporação da verba indenizatória ao salário dos parlamenares é a a equiparação aos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF): R$ 24,5 mil. Essa proposta encontra apoio tanto entre parlamentares que fazem uso da verba quanto nos que abriram mão do benefício.
O senador Demóstenes Torres (DEM-GO), por exemplo, usou os R$ 45 mil a que tinha direito – R$ 15 mil mensais – e defende a equiparação com os salários dos ministros do STF como condicionante para a extinção da verba.
“Eu acho que todos esses benefícios, que costumo chamar de penduricalhos, deveriam acabar. Me refiro à verba indenizatória, ao auxílio-moradia e outros tantos. O senador ganha o que ganha porque tem os penduricalhos. Agora, enquanto houver essa possibilidade (de usar os benefícios) vamos usar”, argumentou.
Demóstenes justificou o gasto da verba com o aluguel de seus escritórios políticos e outras despesas “relativas ao mandato”. “O momento de se fazer um debate franco e aberto sobre esse assunto é agora. Se você somar tudo o que o parlamentar tem direito, vai ver que mais de R$ 31 mil por mês são gastos, contando com os penduricalhos”, acredita.
Mesmo os que optaram por não usar mais a verba indenizatória acreditam que a incorporação ao salário seria uma solução para o parlamento. O líder dos tucanos, senador Arthur Virgílio (PSDB-AM), que no início de fevereiro formalizou pedido à Mesa abrindo mão do benefício, também defende a incorporação do benefício ao salário. “Eu abri mão porque passei a não me sentir à vontade para usar. Por conta da falta de regulamentação, era tudo muito vago. Eu me questionava: posso pedir o ressarcimento dos gastos em um jantar com prefeitos?” narrou.
“Por isso, acho que o mais justo, no momento, é a incorporação, porque se faz parte do meu salário, uso como quiser. Estava inibido, não me sentia à vontade para usar a verba”, justificou Virgílio.
Verba é verba, salário é salário
Mas a incorporação ainda não é uma unanimidade na Casa. Os senadores do PT, Ideli Salvatti (SC) e Delcídio Amaral (MS), por exemplo, são contra a medida. Ambos usaram toda a verba a que tinham direito no trimestre, e são a favor de sua manutenção. “Eu uso a verba sim, mas é para custeio do mandato. Não sou a favor da incorporação, sou a favor da transparência total. Que as notas com os gastos sejam tornadas públicas, para que o povo fiscalize como esse dinheiro é gasto”, argumentou Delcídio.
Ideli defende a mesma posição e acrescenta. “Salário não é para pagar a execução do meu mandato. E outra questão, ainda mais preocupante, é a do efeito cascata. Os nossos salários servem de base para o cálculo dos vencimentos dos deputados estaduais e dos vereadores. Imagina o impacto que esse aumento teria nos cofres públicos?”, questiona. “Nós podemos justificar isso (o aumento) com a extinção da verba aqui (no Senado), mas eles vão extinguir nos estados e nos municípios em que a indenizatória também existe?”, provoca a senadora.
Mesmo contrária à medida, Ideli admite que a movimentação em prol da incorporação do benefício aos salários ganha corpo no Senado. “Quando vivemos sob um volume de denúncias tão grande, é claro que uma proposta como essa acaba ganhando força, por conta de uma parcela de parlamentares que quer ficar livre da fiscalização”, sustentou.
Deixe um comentário