Uma radiografia da liberação de recursos das emendas dos parlamentares ao Orçamento da União nos últimos sete anos mostra que o governo Fernando Henrique Cardoso pagou 130% a mais do que a administração do presidente Lula. Em valores corrigidos, foram R$ 12 bilhões na gestão tucana, contra apenas R$ 4 bilhões no mandato petista. A média anual foi de R$ 3 bilhões (em quatro anos) na era FHC, contra R$ 1,3 bilhão (em três anos) no atual governo.
O levantamento, feito pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e publicado pelo Correio Braziliense, revela que nas duas administrações fica evidente o favorecimento dos partidos governistas. PSDB e PFL reinaram no governo tucano, enquanto agora o PT é privilegiado.
O baixo percentual de execução das emendas é reconhecido e criticado pelo líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). “Foi um erro do governo. Foi uma das dificuldades que tive como líder. Quando o governo não empenha (reserva dinheiro do Orçamento), é um desespero para os parlamentares que têm perfil regional”. Para o líder da oposição no Senado, Alvaro Dias (PSDB-PR), a execução orçamentária no governo petista “é um desastre sob todos os pontos de vista: não tem prioridades definidas, é discriminatória e demonstra a incapacidade do governo de aplicar os recursos disponíveis”.
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Chinaglia também admite que houve favorecimento aos partidos governistas. “Há uma lógica no parlamento, uma ética entre aspas, que faz com que os partidos da base aliada não suportem que a oposição tenha um atendimento igual ou maior do que os governistas. Quando na oposição, o PT dizia que isso era um absurdo. Na situação, exige um melhor atendimento. Isso é cultural, não tem saída”. Ele acrescenta que, em 2003, primeiro ano do governo Lula, os parlamentares do PSDB tiveram empenhos maiores. “Aquilo causou irritação na bancada do PT”, lembra.
O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, critica “o uso político dos recursos orçamentários” e defende a distribuição das verbas de acordo com critérios técnicos.
No governo FHC, cada parlamentar da base aliada (PSDB, PFL, PMDB, PPB e PTB) assegurou R$ 2,6 milhões para o atendimento de suas emendas individuais, enquanto os petistas ficaram com a metade: R$ 1,3 milhão. A situação foi invertida nos últimos anos. Enquanto os parlamentares do PT tiveram um aproveitamento médio de R$ 1,4 milhão, deputados e senadores do PSDB e do PFL conseguiram liberar, em média, pouco mais de R$ 800 mil. O PMDB, o PTB e o PP – partidos com vocação governista, não importa em qual governo – continuaram sendo bem tratados, com liberações médias entre R$ 1,2 milhão e R$ 1,3 milhão.
De acordo com a reportagem de Lúcio Vaz, o repasse de recursos federais por meio de liberação de emendas parlamentares mostra um amplo favorecimento a governos estaduais do PT. Com 0,4% da população do país, o estado do Acre, governado pelo petista Jorge Viana, recebeu um total R$ 161 milhões na era Lula. Isso corresponde a 18% do total das verbas distribuídas aos governos estaduais. Em terceiro lugar aparece o Piauí, administrado pelo petista Wellington Dias, com R$ 107 milhões. Com 1,6% da população do país, o estado recebeu 12,2% do total de recursos repassados.
O governo de São Paulo, com 22% da população do país, ficou com 3,5% dos recursos (R$ 30 milhões). O estado foi administrado por Geraldo Alckmin, candidato do PSDB a presidente da República, principal adversário de Lula na disputa. Com uma linha de oposição mais amena, o governador tucano Aécio Neves ficou com 7,5% dos recursos (R$ 66 milhões) – um número próximo do percentual da população: 10,4%.
Considerando os repasses diretos aos municípios, as distorções são menores, porque os tucanos administram grandes estados, com um número muito maior de prefeituras. Os municípios de São Paulo receberam R$ 161 milhões, enquanto que os mineiros ficaram com R$ 111 milhões. Mesmo assim, grandes cidades com administrações petistas foram privilegiadas. A prefeitura de São Paulo, administrada pela prefeita Marta Suplicy, recebeu R$ 22 milhões a partir de emendas de parlamentares. O prefeito do Recife, João Paulo (PT), recebeu mais 18 milhões. Fernando Pimentel (PT), prefeito de Belo Horizonte, teve um reforço de R$ 12 milhões. Marcelo Déda (PT), de Aracaju, ficou com R$ 11,6 milhões.
A Confederação Nacional de Municípios destaca que o dinheiro repassado diretamente às prefeituras de 2003 a 2005 (R$ 1,5 bilhão) é menor do que o 1% de aumento reivindicado no Fundo de Participação dos Municípios (FPM). “São visíveis as distorções que ocorrem na liberação de emendas, em benefício de determinadas unidades da federação”, diz o estudo. O levantamento mostra que cinco estados (Acre, Amapá, Rondônia, Roraima e Tocantins), com apenas 2,4% da população do país, receberam 20,7% dos recursos das emendas parlamentares. Por tudo isso, o presidente da confederação, Paulo Ziulkoski, defende “o fim dessa prática de personalização das emendas”.
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