Rodolfo Torres
O presidente Lula sancionou nesta terça-feira (3) a nova Lei Nacional de Adoção, que cria cadastros (nacional e estaduais) de crianças e adolescentes em condições de adoção, e de pessoas habilitadas a adotá-los. Um terceiro cadastro, dessa vez de pessoas que moram fora do país, também será instituído. Contudo, as pessoas com residência no Brasil terão prioridade.
A lei também determina a redução para dois anos do tempo máximo de permanência de crianças nos abrigos; anistia para a adoção informal; a audição entre o menor e a Justiça após ele ser entregue à família adotiva; e a determinação de que crianças indígenas e quilombolas devem ser adotadas dentro de suas comunidades.
Atualmente, o cadastro nacional de pais adotantes conta com 22 mil interessados. Por sua vez, duas mil crianças esperam formalmente pela adoção no país. De acordo com o presidente, a nova lei vai “evitar a burocracia excessiva” no processo de adoção.
Na ocasião, o petista aproveitou para elogiar o trabalho de parlamentares envolvidos diretamente na aprovação do projeto.
“Eu digo sempre que se a gente for colocar em uma balança as coisas boas e as coisas más que foram acontecer no Congresso, as coisas boas são infinitamente superiores”, afirmou Lula durante discurso.
Confira a íntegra do discurso de Lula
Mais do que uma lei de adoção, tenho a felicidade de sancionar hoje uma legislação que garante a crianças e adolescentes o direito a uma convivência familiar e comunitária.
Uma legislação que inova ao ampliar o conceito de família extensa, formada por parentes próximos, com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.
Que mantém unidos os irmãos, ao reconhecer que eles já constituem um grupo familiar e que, por isso, devem ser adotados em conjunto.
Que, entre outros avanços, garante atenção jurídica a gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para a adoção, evitando o abandono de crianças em espaços públicos logo após o nascimento.
Uma legislação criada para evitar a burocracia excessiva, que hoje dificulta o final feliz para crianças e adolescentes que necessitam de uma nova família, e adultos que travam uma luta, muitas vezes inglória, para adotá-los.
Amigos e amigas,
Não estamos partindo do zero. O Brasil é reconhecido como um dos paises mais avançados neste tema, motivo pelo qual lidera, desde 2006, o debate de um novo documento internacional das Nações Unidas sobre crianças e adolescentes privados de cuidados dos seus familiares.
Esse documento foi aprovado este ano, no âmbito do Conselho dos Direitos Humanos da ONU, e deverá ir à votação já no ano de 2010, na Assembléia-Geral das Nações Unidas.
Muitas de suas diretrizes, aliás, já foram incorporadas nesta lei que estamos sancionando hoje, o que coloca o Brasil mais uma vez na vanguarda, ao estabelecer um novo marco legal para a adoção.
A nova Lei de Adoção já estava sinalizada no Plano Nacional do Direito à Convivência Familiar e Comunitária, aprovado pelo Conanda em 2006. Além disso, o projeto “No caminho pra casa”, da Agenda Social Criança e Adolescente, prevê várias ações neste sentido, como o reordenamento dos abrigos, o apoio financeiro para famílias que tenham filhos abrigados por motivo de pobreza e a criação de moradias coletivas para adolescentes e jovens ex-abrigados.
Finalmente, as ações de adoção internacional – quando famílias estrangeiras estão interessadas em crianças brasileiras – coordenadas pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos, já estão em consonância com a nova legislação.
Deve ser lembrado o papel fundamental do Congresso Nacional na formulação da nova Lei de Adoção. O projeto foi amplamente debatido e contou com o engajamento de diversos deputados e senadores, entre os quais se destacam as senadoras Patrícia Saboya (PDT-Ceará) e Fátima Cleide (PT-Roraima), o senador Aloízio Mercadante (PT-SP), o deputado João Matos (PMDB-SC) e as deputadas Sandra Rosado (PSB-RN), Teté Bezerra (PMDB-MT) e Maria do Rosário (PT-RS).
Merece destaque também a contribuição da Associação Brasileira dos Magistrados e Promotores da Infância e da Juventude, da AMB – Associação dos Magistrados Brasileiros, e também do Conselho Nacional de Justiça, associações de conselheiros tutelares e outras organizações da sociedade civil que, com suas opiniões, baseadas na experiência do dia-a-dia, contribuíram muito para que a lei fosse aprimorada.
Não poderia encerrar sem fazer uma homenagem a um pequeno brasileiro chamado Cleber Matos. Cleber veio ao mundo negro e pobre, e foi acolhido pelo deputado João Matos. Infelizmente, Cleber não pôde ver o que está acontecendo aqui hoje, porque faleceu precocemente em 2001, aos 15 anos de idade. Me parece que o Cleber sofreu um acidente e, depois do acidente, me parece que outras coisas aconteceram e o Cleber morreu com 15 anos de idade.
Esse exemplo de solidariedade, assim como o de tantos outros brasileiros e brasileiras serviu de inspiração para a Lei que sancionamos no dia de hoje. Não é todo dia que um presidente da República tem a felicidade de sancionar uma lei que nasceu do sentimento mais nobre que existe: o amor entre os seres humanos. Esse é mais um passo para o resgate da cidadania infantojuvenil do Brasil.
Eu queria… na verdade, eu poderia até prestar uma homenagem ao Gilberto Carvalho, que todo mundo sabe, é o mais novo pai aqui, que há poucos dias adotou. Ele agora vai voltar a saber o quanto é duro ser pai de duas crianças em idade de peraltice total e absoluta. O “bichinho” já está chegando atrasado no trabalho aqui, e está querendo ir embora mais cedo toda noite, aqui.
Mas eu queria agradecer a todos. Eu acho que uma lei como esta, além de colocar o Brasil em uma situação de destaque no cenário mundial, vai provando aos tempos que este país que, durante tanto tempo foi tratado como país de terceiro mundo, como país subdesenvolvido, como país pobre, é com esses avanços que a nossa sociedade constrói, porque isso aqui é um passo extraordinário de construção da sociedade, de pessoas como o nosso deputado, de outros milhares de brasileiros que vão, muitas vezes sem que a gente saiba que eles existem, fazendo um sacrifício enorme para adotar uma criança, ou para evitar que uma criança caia no abandono.
Eu acho que é uma dádiva para o Brasil. Isso aqui também mostra a todo mundo que todas as críticas que se faz ao Congresso Nacional, todo santo dia… eu digo sempre que se a gente for colocar em uma balança as coisas boas e as coisas más que foram acontecer no Congresso, as coisas boas são infinitamente superiores, mas muitas vezes as coisas boas não têm o destaque que a gente gostaria que tivessem.
Portanto, parabéns a cada deputado, a cada senador e senadora aqui e, sobretudo, a vocês, cidadãos, eu diria, anônimos, que são os responsáveis por esta conquista extraordinária. Eu espero que a partir da Lei a gente crie as condições para que não tenha mais criança abandonada. Que a Lei… Agora, o nosso magistrado estava dizendo que, agora, quem for adotar vai ter que passar por um processo de preparação, o que eu acho extremamente extraordinário isso estar previsto na Lei. Porque nós ainda temos um problema no Brasil que não está resolvido, que é o problema da desagregação da estrutura social da família. Tem algo que nós ainda não aprofundamos, eu acho que muitas vezes, mais grave do que a situação econômica de uma família é a estrutura de desagregação das teias sociais de uma família.
Nós temos muita coisa para fazer. Certamente, nenhum de nós, sozinho, tem a sabedoria de saber como resolver. Mas se a família não estiver junta, unida… Quando a gente vê a notícia de que mais duas crianças foram abandonadas no Rio de Janeiro hoje… muitas vezes, é porque uma menina fica grávida, tem medo do pai, tem medo da mãe, não quer contar… às vezes vai ter um filho em situação totalmente anômala e, depois, é melhor abandonar. Não é o primeiro caso, não será o último.
Eu espero que a Lei facilite. Primeiro, que os pais tenham compreensão, quando uma filha fica grávida, de fazer com que a criança nasça dentro do seio da família. O que não deveria ter acontecido aconteceu, que foi ela ficar grávida, e é preciso cuidar da criança até ela nascer. E depois, se quiser adotar, a Lei agora vai dar condições extraordinárias para que a adoção seja mais fácil, menos burocrática e que as pessoas que adotem sejam menos [mais] preparadas.
Eu tenho a convicção de que vocês deram mais um passo importante para enaltecer ainda mais os direitos conquistados pela sociedade brasileira.
Parabéns a todos vocês.
Leia também
Deixe um comentário