Neste dia 20 de setembro, durante diálogo com a relatora especial da ONU sobre Direitos dos Povos Indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, Voninho Benites Guarani Kaiowá, representante da Grande Assembleia – Aty Guasu, do povo Guarani Kaiowá de Mato Grosso do Sul, cobrou medidas urgentes diante da “crise humanitária” que seu povo enfrenta naquele estado.
Em março de 2016 a Relatora esteve em visitas aos acampamentos dos Guarani Kaiowá, onde pode presenciar a situação de penúria e ameaças que vivem os indígenas. O vídeo “Guarani-Kaiowá: leaving the pigsty”, que documenta parte da visita de Victoria, evidenciou o que é o cotidiano daquele povo. Em seu relatório divulgado posteriormente, Victoria chamou a atenção para os despejos de indígenas das terras reivindicadas e para “a violência, assassinatos e intimidações contra os povos indígenas perpetuados pela impunidade”.
Voninho lembrou de outra denúncia apresentada à época da visita da Relatora, conhecido como massacre de Caarapó, ocorrido em junho de 2016 no município homônimo, e que resultou no assassinato do indígena Guarani Kaiowá, Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza. Clodiodi, agente de saúde, foi morto quando buscava ajudar feridos durante o ataque que durou treze horas e resultou seis pessoas feridas por disparos de armas de fogo. Entre estas uma criança.
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A vulnerabilização dos povos indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais está no mesmo contexto de um processo por meio do qual são violentados os direitos fundamentais dos trabalhadores, dos aposentados, e estudantes, com as pseudo-reformas que, na verdade, são a destruição dos poucos avanços conquistados na ainda adolescente democracia brasileira.
Há, nas esferas políticas do país, a deliberação irresponsável de se promover, o que estão denominando de reformas, que nada mais são do que medidas políticas e jurídicas de exceção para retirar da população – especialmente aquela porção que mais contribui com Estado através de seu trabalho, dos tributos e impostos – direitos, benefícios e garantias constitucionais.
No caso específico dos direitos dos povos indígenas, especialmente às suas terras tradicionais, conquistados duramente a menos de trinta anos, os ataques são cada vez mais intensos no âmbito dos três Poderes do Estado brasileiro.
Do Poder Executivo está em curso um processo de abandono da política e serviços essenciais, deixando-se de investir em ações que asseguram assistência às pessoas e à promoção das demarcações das terras. Com profunda preocupação observamos a desestruturação dos órgãos de Estado que prestam, mesmo que precariamente, assistência às populações indígenas, quilombolas, camponeses e que promovem a fiscalização e proteção do meio ambiente.
É grave o fato de a Fundação Nacional do Índio (Funai) estar sem recursos financeiros para realizar os serviços básicos junto aos povos indígenas e, ao mesmo tempo, sendo instrumentalizada pelo governo federal para atender interesses que estrangulam a vida dos povos indígenas, seja por setores religiosos fundamentalistas, integracionistas ou vinculados ao agronegócio e mineração.
Para uma ideia do como isso se expressa na prática, conforme o Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento do governo federal, até o mês de agosto de 2017 a Funai liquidou apenas 22% da dotação atual destinada à Demarcação e Fiscalização de Terras Indígenas e Proteção dos Povos Isolados.
Faltando pouco mais de três meses para o encerramento do ano e do total de R$ 18.723.448,00 o órgão indigenista utilizou apenas R$ 4.199.586,00. Parte destes recursos se destinam a manutenção dos trabalhos das 11 (onze) Frentes de Proteção Etnoambientais que buscam assegurar a proteção de indígenas em situação de isolamento e risco. Coincidência ou não, neste período o Ministério Público Federal do Amazonas divulgou a investigação de um massacre de indígenas isolados na região do Vale do Javari (AM) onde está uma das Frentes de Proteção. De acordo com a Funai, nesta região há pelo menos 14 indicações da presença de indígenas isolados.
A fragilização da política indigenista, resultado das trocas entre o governo Temer e a bancada ruralista – uma das bancadas no Congresso que vem assegurando que os processos contra Temer caiam na vala comum da impunidade – foi evidenciada na carta dos servidores e servidoras da Coordenação-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato e das Frentes de Proteção Etnoambiental da Funai.
Na carta direcionada ao presidente da Funai e à diretora de Proteção Territorial do órgão, divulgada no dia 12 de setembro, os servidores tecem críticas e expressam preocupação quanto às indicações políticas para postos importantes dentro da Funai e frente ao sucateamento do trabalho em campo. Se antes alguns interessados nas terras indígenas agiam de fora buscando a morte do órgão indigenista oficial, agora causam uma hemorragia até que este não se sustente mais.
Seja no que se refere às demarcações das terras indígenas, proteção destes territórios e seus povos, as alianças entre o governo Temer e setores anti-indígenas apontam para o aprofundamento da violência e violações de direitos que, por certo, clamam por cobranças dos organismos internacionais e por ações daqueles que ainda creem que democracia só será verdadeira se tiver por base a inclusão de todas pessoas, povos e diversidades.
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