Congresso em Foco – O senhor tem alguma contra, pessoal, profissional ou institucionalmente, a ministra Eliana Calmon?
Gabriel Wedy – Temos uma postura impessoal em relação à Corregedoria Nacional de Justiça. Nossa ação é institucional. Nós defendemos as ações da corregedoria, desde que observado o devido processo legal. Nossa postura é absolutamente institucional e impessoal. Não importa quem é a pessoa do corregedor. Para nós, o que importante é que o CNJ sempre observe o devido processo legal, que é uma garantia de todo e qualquer cidadão brasileiro. Não temos nada contra nenhum conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, tampouco quanto à Corregedoria Nacional de Justiça como instituição ou quanto à pessoa da ministra.
O Plenário do Supremo já confirmou a constitucionalidade das atribuições do CNJ, à luz da Emenda 45/2004, que promoveu a chamada reforma do Judiciário. O único opositor foi o ministro Marco Aurélio, voto vencido por dez magistrados do STF. Mesmo assim, as principais entidades da magistratura querem restringir a ação do órgão…
Nós questionamos o descumprimento, por parte da Corregedoria, de um dispositivo do Regimento Interno do CNJ, que determina que certas ações devem ser comunicadas ao Plenário do Conselho Nacional de Justiça, não podem ser tomadas individualmente. E mais: nós defendemos também o sigilo de dados para os magistrados, que é um direito garantido a todo e qualquer cidadão brasileiro. É uma posição institucional clara – e recebemos uma liminar do STF respaldando a nossa posição, que é no sentido de garantir duas coisas: o respeito ao devido processo legal e o direito ao sigilo de dados. São duas garantias que não é o juiz que possui, mas todo cidadão brasileiro.
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Na experiência de juiz da 3ª Vara de Execuções Fiscais de Porto Alegre, o senhor lidou com valores, cobranças, prestação de contas por vezes vultosos. O que acha das movimentações financeiras atípicas detectadas pelo CNJ em tribunais Brasil afora, muitas delas milionárias? Isso não depõe contra a magistratura?
A Ajufe é uma entidade que sempre defendeu o CNJ, e continua defendendo hoje, e ainda mais. O Conselho deve agir de forma firme sempre que encontrar alguma ilegalidade. Os números da Justiça Federal, inclusive, são transparentes, o juiz federal apresenta declaração de imposto de renda, todos os anos, aos respectivos TRFs [tribunais regionais]. Todos os anos. Tanto é verdade que, desses 62 nomes que estão sendo investigados pelo CNJ, por possível variação ou aumento patrimonial, nenhum deles é juiz federal. Temos muito cuidado, e entendemos que o CNJ faz bem para o Brasil, que é importante para dar transparência. Agora, todas as ações da Corregedoria, do CNJ, devem ser pautadas pela observância do devido processo legal e das regras constitucionais.
A ministra diz não ter acesso às informações sigilosas, e que isso fica restrito aos técnicos do Coaf. Não é contraditório que entidades representativas da magistratura a interpelem judicialmente, sob acusa de desrespeito ao sigilo, e ao mesmo tempo defendam o papel fiscalizatório do CNJ? Não há uma tentativa de cerceamento das funções da corregedora?
Essa questão, na realidade, está judicializada. Entendemos que o ato da Corregedoria violou o devido processo legal. Resolvemos impugnar essa questão, que está judicializada e vai ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal.
O senhor está esperançoso de que o Supremo vai manter a decisão preliminar de restringir as investigações do CNJ?
O Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição. Então, nós entendemos que ele deve garantir o direito ao devido processo legal e garantir também o sigilo de dados – aos magistrados e a todo cidadão brasileiro. O sigilo de dados pode sim, e deve, ser quebrado. Mas em processos criminais, para instrução criminal, e por decisão judicial. Sigilo de dados não pode ser quebrado por decisão administrativa, a Constituição Federal não permite isso. A posição da Ajufe, nesse ponto, é muito institucional, serena, técnica. A proteção do sigilo de dados é garantida por toda e qualquer Constituição de países ocidentais democráticos. E também a garantia do processo legal, ou seja, os procedimentos previstos – mesmo dentro do CNJ, pelo regimento interno – devem ser observados. A requisição de informações deve sempre ser participada ao Plenário do Conselho Nacional de Justiça, não pode ser feita individualmente.
Mas esse trâmite burocrático não permitiria que autores de fraudes financeiras se movimentassem a tempo de atrapalhar as investigações?
Nossa preocupação é com a garantia do devido processo legal e com o sigilo de dados. É uma posição técnica. São regras da Constituição que precisam ser respeitadas. Mas nossa posição é um pouco… nós entendemos que não se pode esvaziar o poder de investigação do CNJ. Entendemos que, quando as corregedorias locais se omitem, a Corregedoria Nacional de Justiça pode avocar esse processo.
Mas não é o que está acontecendo agora?
Agora ocorreram questões diferentes, como foram esses pedidos de informação ao Coaf e ao Banco Central, sem que houvesse a comunicação ao Plenário do CNJ. E também sem uma ordem judicial. O corregedor nacional não é um juiz – ele está em uma função administrativa, e não agindo como um magistrado. Isso é uma garantia da Constituição, que é o pilar da democracia, do regime republicano. Então, nós precisamos garantir o respeito a ela. Agora, a Ajufe tem uma posição muito ética em relação à questão da impunidade. Quando aqui chega um caso – e são ínfimos – de magistrados estão sendo processados pelo CNJ, antes nós fazemos com que esses casos tramitem na comissão de direitos e prerrogativas do juiz [Comissão Permanente de Defesa e Prerrogativas – CPDP], que é uma comissão interna da Ajufe, para ver se nós vamos fazer a defesa desse magistrado no CNJ ou não. Se nós observarmos que há, realmente, uma prova de prática de ilícito penal ou administrativo, a Ajufe não patrocina defesa. Temos uma certa distinção nessas questões. Somos favoráveis ao CNJ e à Corregedoria Nacional de Justiça, desde que observadas as garantias constitucionais.
E a opinião pública? Imaginemos um pedreiro, que sua para ganhar um salário mínimo, e não entende essas questões técnicas. Para o cidadão leigo, não soa estranho o fato de juízes quererem impedir que o CNJ investigue colegas e servidores responsáveis por transações milionárias suspeitas? O alegado corporativismo, nesse caso, não mancha a imagem da magistratura?
O pedreiro tem os mesmos direitos que o juiz. Ele tem o direito de defesa, o direito ao devido processo legal. O trabalhador brasileiro tem o direito ao sigilo dos seus dados – que não é absoluto, e pode e deve ser quebrado se houver indício de crime. Na realidade, quando a Ajufe defende o sigilo de dados e o devido processo legal, está defendendo o povo brasileiro. Se processos inconstitucionais contra juízes forem abertos, daqui a pouco vão ser abertos processos que desrespeitam a Constituição contra outros setores da sociedade. Imagina se começarem a quebrar o sigilo de dados de jornalistas… Vamos deixar que os jornalistas, o cidadão, o trabalhador brasileiro tenha seu direito ao devido processo legal, seu direito de defesa, seu direito ao contraditório. Não podem ser quebradas as garantias constitucionais – e não interessa se a pessoa é um juiz, um médico, um empresário, um jornalista. O direito ao devido processo legal não pode ser violado contra ninguém. Acho que a Ajufe foi a única entidade que defendeu a criação do CNJ, em 2005. O CNJ faz muito bem para o país e não pode ter seu poder esvaziado. Agora, nós temos que separar o CNJ de um ato específico da Corregedoria Nacional de Justiça, bem como separar esse ato da pessoa da ministra. São três coisas diferentes. O ato violou a Constituição, e o ministro Ricardo Lewandowski reconheceu isso em liminar.
Mas essa liminar não pode ter sua legitimidade questionada, uma vez que o ministro teve movimentação atípica apontada pelo CNJ. Foram valores registrados em nome do ministro e do presidente do STF, Cezar Peluso, de até R$ 700 mil, recebidos como auxílio-moradia do Tribunal de Justiça de São Paulo…
Ele [Lewandowski] recebeu legalmente a PAE [Parcela Autônoma de Equivalência, espécie de vencimento complementar], e a ministra Eliana Calmon também recebeu [a ministra recebeu R$ 421 mil, a título de auxílio-moradia]. Ambos receberam legalmente. A PAE foi paga em decorrência de lei, de decisão judicial. Foi uma ação ganha pelas associações da magistratura, anos atrás, e ela garante a equiparação entre os juízes e os parlamentares durante determinado período. Isso foi decidido por decisões administrativas e judiciais, na forma da lei. Eles foram pagos corretamente, ambos tinham o direito de ter recebido, como receberam.
A ministra Eliana recebeu muitas críticas quando disse que há bandidos por trás das togas…
Imagina: são 30 mil juízes, 62 acusados de evolução patrimonial anormal, e nenhum desses é juiz federal. Não podemos nunca generalizar questões que envolvem a honestidade, a ética e a moralidade das pessoas. Isso é muito importante, e devemos ter esse cuidado sempre, em qualquer setor da sociedade.
Mas vejamos o caso juiz Nicolau dos Santos, condenado a 26 anos de cadeia, em 2006, pelo desvio de quase R$ 170 milhões da verba destinada à construção de um tribunal em São Paulo. No caso, houve omissão das corregedorias da Justiça paulistana, assim como aconteceu em outros estados. Essa não foi a razão do desabafo da ministra? AMB, Ajufe e Anamatra, ao se posicionar contra a ação do CNJ, não ficam mal aos olhos da opinião pública?
Há uma diferença entre as posições das entidades. Nós da Ajufe entendemos que, quando há omissão das corregedorias locais, o CNJ pode agir. Já a posição da AMB é que não pode haver competência originária, enquanto nós entendemos que ela pode ser avocada no processo em casos de omissão. Tanto é que nós não somos autores, com a AMB, naquela outra ação que a AMB protocolou no Supremo [para retirar do CNJ a prerrogativa de investigação até então conferida às corregedorias]. É importante grifar essas dessemelhanças, porque são questões importantes. Nos termos da Constituição, o CNJ avoca o processo, mas a corregedoria do CNJ não pode fazer investigações indiscriminadas, antes que as corregedorias locais façam, se não houver pelo menos um indício mínimo de omissão de uma corregedoria local.
Mas o senhor acha mesmo que as corregedorias são confiáveis? São tantos casos de omissão…
Na Justiça Federal, tivemos juízes presos a partir de ações iniciadas nas corregedorias dos tribunais regionais federais. As corregedorias dos TRFs são muito positivas, são de altíssimo nível. São corregedorias transparentes, que atuam com profundo rigor e transparência. Você vê que, desses 62 juízes que com evolução patrimonial anormal, nenhum deles era juiz federal. Eu, por exemplo, todos anos, em minha declaração de renda, assino documento e entrego nas mãos do presidente do meu tribunal. Todos os anos.
O senhor não vai ter problemas com o CNJ, então…
Todos os anos nós fazemos isso. E nós somos favoráveis ao controle externo do Judiciário. Naquela época [durante a reforma do Judiciário, em 2004], várias entidades da magistratura nos atacaram muito. Mas era importante o controle externo. Entendemos apenas que a correição deve ser feita de forma rigorosa, mas com serenidade. A palavra que resume tudo isso é sensatez.
Na última reunião de 2011 da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, o senador Demóstenes Torres fez duras críticas à postura de entidades contra o CNJ, e reclamou do adiamento da votação da chamada PEC do CNJ, que enfatiza e reforça os poderes do órgão. Como diretor de Assuntos Legislativos da Ajufe desde 2005, como o senhor vê essa reação, apoiada por outros senadores com origem no Judiciário?
A Ajufe não quer o enfraquecimento do CNJ, tanto que nós não entramos como essa ação no Supremo. Entramos com duas ações: primeiro, para garantir o respeito ao sigilo de dados. A outra ação foi contra ato especifico do CNJ, que violou o sigilo e o devido processo legal. A Ajufe não entrou com nenhuma medida para enfraquecer o pode do CNJ. Há duas semanas escrevi um artigo defendendo o fortalecimento do Conselho, porque ele é positivo e dá transparência para o país. Nós lutamos justamente para criar o CNJ em 2005. Nós temos cuidado inclusive nos casos em que defendemos colegas processados no CNJ, eles passam antes por uma análise do caso concreto aqui dentro da Ajufe. Se nós entendermos que cabe a defesa, vamos para a defesa. Se não, não fazemos.
Voltando à questão parlamentar…
Evidentemente que a Ajufe defende os direitos e prerrogativas dos juízes, mas com responsabilidade. Apesar de sermos uma entidade privada, nós temos uma obrigação muito grande para com a sociedade brasileira. Tanto que estamos lutando para que haja uma legislação de lavagem de dinheiro mais rigorosa no Brasil. Estamos lutando para que seja aprovada a PEC dos Recursos, para que, depois da condenação em segundo grau, aquele que cometer crime vá para a cadeia; e estamos também no movimento “Agora chega de corrupção”, o senador Pedro Simon nos convidou; somos contra aquele projeto de cidadania fiscal, do senador Delcídio Amaral, que permite que o dinheiro objeto da corrupção e do crime seja repatriado ao Brasil pagando uma alíquota de 5%. Entendemos que isso incentiva o crime. Estamos trabalhando, entregando notas para os parlamentares para que não se aprove esse projeto. Nós queremos que todo o dinheiro objeto da corrupção volte para os cofres públicos, e não só 5%.
Como o senhor vai lidar com senadores que fazem essa defesa tão acirrada do CNJ?
A Ajufe impugnou um dispositivo do regimento interno do CNJ que permite a quebra do sigilo de dados sem ordem judicial. Então, nossa posição não é destoante da posição do senador Demóstenes, nem da posição do senador Pedro Taques [membros do Ministério Público e da CCJ do Senado], em tese.
Essa briga não pode ameaçar a harmonia entre os poderes?
Temos uma identidade de ação muito grande com esses dois senadores.
O senhor defende medidas impopulares, como férias de 60 dias para juízes. Com esse atrito com o CNJ, não teve a reação da opinião pública?
Mas aí é que está… A Ajufe é a extremamente favor de que o CNJ cumpra suas atribuições constitucionais. Nossa posição é destoante da AMB, é diferente nesse ponto. Entendemos que pode haver investigação do CNJ em caso de omissão de corregedorias locais, e que o CNJ faz bem para o Brasil. Mas desde que com respeito à Constituição e ao devido processo legal. Quando defendemos a Constituição, estamos defendendo a população brasileira. A Ajufe não pode defender a quebra de sigilo de dados das pessoas, sem ordem judicial. Não pode defender que a pessoa não tenha direito de defesa no processo, ou defender prazos reduzidos de defesa, que a pessoa não tenha direito a recorrer. Como é que a Ajufe vai defender isso?
Mas a Ajufe vê, nesse imbróglio, a oportunidade de acabar com a ideia segundo a qual o Judiciário é uma caixa-preta?
Nós estamos falando muito com a imprensa. Eu costumo dizer que o Judiciário federal tem uma transparência muito grande. Todos os anos nós disponibilizamos para a presidência dos tribunais nossa declaração de renda. Entendo que nós temos defendido uma transparência muito grande. A Ajufe defendeu a criação do CNJ em manifestos públicos, em artigos, e continua defendendo o CNJ depois de sete anos [da criação do órgão], não firmamos ação contra competência de investigação, apenas entendemos que o CNJ deve agir de forma supletiva, quando está comprovada a omissão da corregedoria local. Ao contrário da AMB, nós impugnamos atos específicos da Corregedoria Nacional de Justiça. Nas pequenas diferentes estão as grandes questões.
Com tudo isso que vem acontecendo em torno do CNJ, a Emenda 45, que promoveu a reforma do Judiciário, não corre o risco de virar letra morta?
De forma alguma, porque o CNJ vai continuar atuando, como sempre atuou. O CNJ sempre atuou, e atuou bem. Agora vai ser garantido que exista um respeito ao devido processo legal e ao sigilo de dados. Nesse caso, [técnicos] tiveram acesso a informações que não eram de juízes, mas de parentes. Nossa posição não é emotiva, é serena, é necessário que se mantenha a sensatez.
Ou seja, é necessário também que a corregedora nacional se enquadre?
A corregedora deve agir sempre com rigor, mas sempre respeitando o contraditório.
Mas e os casos de movimentação atípica?
Todos os casos em que houver indício de crimes, o sigilo pode ser quebrado, por decisão judicial. O que o CNJ fez foi uma medida administrativa.
Mudando de assunto, porque o Judiciário ainda é tão lento?
Os poderes Executivo e Legislativo têm que colaborar. A responsável pela morosidade do Judiciário é a falta de interesse do governo federal em criar novos tribunais federais, e nós estamos precisando. O poder Legislativo não aprova a PEC 544, que cria quatro novos tribunais no Brasil. Enquanto isso, os tribunais estão congestionados, e o próprio CNJ aponta que existe esse congestionamento no segundo grau. Essa PEC tramita há dez anos no Congresso e não é aprovada. Aqui na primeira região, por exemplo, são 14 estados, o advogado entra com uma apelação no Oiapoque e vem acompanhar o julgamento aqui no Distrito Federal, são milhares de quilômetros. Onde é que está o acesso à Justiça para a população? Nós precisamos aprovar um Código de Processo Civil que permita que a lei ande rápido. Os juízes trabalham demais, e temos que desmitificar isso [que a magistratura trabalha pouco], mas as leis são atrasadas, antigas. Em parceria com Conselho da Justiça Federal, ajudamos a criar o processo eletrônico no Brasil, por isso costumamos dizer que a Justiça Federal está aberta 24 horas – um advogado pode entrar com uma petição de madrugada, vários colegas meus trabalham de noite, de madrugada, inclusive nas férias. Falta o Executivo liberar recursos para a estrutura de trabalho dos juízes. E o poder Legislativo, muitas vezes por questões corporativas, não aprova as questões que não são importantes para o poder Judiciário, mas para a população brasileira, em ter o seu processo julgado mais rapidamente.
O Executivo diz não ter dinheiro sequer para reajustar o salário dos servidores do Judiciário…
O Supremo apresentou ao governo um orçamento envolvendo estrutura, salário etc, de R$ 7,7 bilhões. Pois bem: pela primeira vez na história, a presidente da República não encaminha o orçamento, como a Constituição manda, para o Congresso. Ela mandou uma mensagem dizendo não haver recursos – não existe paralelo em toda história republicana no Brasil de ter havido uma coisa neste sentido. Como não há recursos, se a “Justiça em números”, do CNJ, que faz uma radiografia dos dados no Brasil, revelou que em 2009 o Judiciário arrecadou R$ 11,6 bilhões? Ano passado, foram R$ 9,6 bilhões. A média de arrecadação do Judiciário é de R$ 10 bilhões por ano, só no Judiciário federal, por causa do trabalho dos juízes federais nas varas de execução fiscal. Se fossem criados novos tribunais, a arrecadação do país iria aumentar. E esses recursos, que vertem para os cofres da União, poderiam muito bem ser aplicados na construção de escolas e hospitais, por exemplo, além de pagar a estrutura do Judiciário, com uma Justiça mais rápida para a população.
Aos 38 anos, o senhor se considera um juiz moderno ou sente o peso da toga, que costuma colocar os juízes em uma espécie de Olimpo?
Eu me considero um juiz cidadão, do povo. Um juiz que quer um país melhor e mais justo. Com uma Justiça mais rápida para a população. E, em especial, um país que não admita a impunidade e a corrupção. Eu me vejo como um juiz defensor desses novos tempos que vivemos, tempos de transparência, de defesa da moralidade.
Então essa história de Olimpo é mera mitologia?
O juiz é uma pessoa do povo que cumpre uma função estatal. Queremos um país mais justo, mais igualitário, transparente, que tenha uma Justiça mais rápida, que não admita a impunidade e a corrupção. Se você for observar na imprensa as nossas manifestações, elas são sempre nesse sentido. Tenho participado de inúmeras audiências públicas, temos sido chamados ao Congresso. Participamos da Enccla [Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, grupo criado no Ministério da Justiça] desde a sua criação. Lá, fazemos proposições para combater a lavagem de dinheiro e a corrupção que se transformam, inclusive, em projetos de lei no Congresso.
O juiz de hoje em dia está sintonizado com o cidadão comum?
Publiquei recentemente um artigo no jornal O Globo defendendo a liberdade de imprensa [intitulado “Risco para a liberdade”, o texto foi publicado na edição de 14 de dezembro]. Nós somos contra o controle social e popular, entre aspas, da mídia. Não vamos ter uma mídia como a do Equador, da Bolívia, da Venezuela. Queremos uma imprensa livre, que possa criticar, fiscalizar. Pretendemos participar da Rio +20, porque os juízes federais têm, por meio de decisões, muitas vezes impedido licenciamentos ambientais que causam danos à água, ao solo, ao ar, às florestas. Em tempos de aquecimento global, temos a obrigação da responsabilidade social. Vamos participar ativamente para que o Brasil tenha uma posição de protagonismo na Rio + 20, principalmente na regulação dos poluidores e nas regras ambiciosas para combater o desmatamento. Acho que o [projeto de atualização do] Código Florestal foi muito acanhado no combate ao desmatamento. Temos a Amazônia, que é o pulmão da humanidade, que precisa ser preservada.Temos essas bandeiras e as divulgamos, mas elas não têm a mesma ressonância de outros assuntos que são debatidos.