|
O procurador da República em Blumenau (SC), João Marques Brandão Néto, não tem dúvidas a respeito da conexão entre o caso Banestado e o esquema batizado de “tele-lavagem”. O segundo teria sido montado para fugir do cerco promovido pela Receita e a Polícia Federal às chamadas contas CC-5, rastreadas pela CPI da evasão de divisas. Segundo Brandão, os donos das duas casas de câmbio (Roweder e Quest) investigadas utilizavam o sistema contábil de débito e crédito em suas contas e na de clientes, distribuídas por outros seis países e no Brasil. As movimentações eram feitas por telefone, fax e internet, o que dificultava o rastreamento da evasão de divisas pela Polícia Federal. As primeiras suspeitas surgiram após o cruzamento de informações da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) com os valores declarados à Receita Federal. Interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça revelaram que, entre maio e agosto de 2002, as operadoras movimentaram juntas R$ 18 milhões, entre remessas e recebimento de valores para o exterior. Enquanto a Roweder concentrava suas operações em uma conta na Alemanha, a Quest movimentava dinheiro nos Estados Unidos. Leia também Ao todo, 163 pessoas estão na mira do Ministério Público, que já abriu inquérito contra 60 delas. Entre os possíveis envolvidos, aparecem empresários, advogados e médicos, sobretudo do sul do país. Mas há também envolvidos de São Paulo, Mato Grosso e até uma empresa de Brasília. Relação de confiança O procurador explica que o esquema se baseava numa relação de confiança entre o doleiro e o cliente. O segundo depositava dólares na conta do primeiro no exterior e sacava na conta do doleiro no Brasil em reais, por meio de “laranjas”. “É difícil rastrear porque o dinheiro não sai fisicamente do país e as contas do Brasil e do exterior não se comunicam, a não ser por ordens de crédito e débito por fax e telefone”, explica Brandão. No caso Banestado, o dinheiro sai de uma conta corrente e cai na CC-5 como moeda estrangeira antes de ser enviado para o exterior, conta o procurador. O procedimento, segundo ele, também foi utilizado pelos mesmos empresários entre 1995 e 1997 na movimentação de cerca de US$ 90 milhões. Por fora Ainda segundo o Ministério Público, os doleiros alimentavam suas contas no exterior por meio do sistema de compensação de créditos, repatriando dinheiro de clientes “por fora” e exportando mercadorias por um valor superior ao que era declarado ao fisco brasileiro. Também mediante a compensação de créditos, eram alimentadas as contas dos clientes no exterior e pagas as importações que esses subfaturavam. A atividade básica dos doleiros era remeter dinheiro para fora e receber montante de seus clientes do exterior, à margem do sistema bancário oficial e sem o conhecimento do Banco Central e da Receita Federal. Com isso, por maior que fosse seu comércio com o exterior – seja importando e exportando por fora, seja mantendo contas bancárias –, os clientes conseguiam obter declarações do Banco Central e da Receita Federal atestando que nunca tinham remetido dinheiro para fora do país. “Mandar dinheiro para o exterior através de casa de câmbio é ilegal. Se o dinheiro não era sujo, a partir da transferência ficou”, diz o procurador. As investigações renderam 3 mil páginas de relatórios de interceptação telefônica, 140 volumes (com 200 páginas cada) com relatórios de apreensão de outros materiais e 20 volumes (com 200 páginas cada) de extrato bancário, num total de 35 mil documentos. A demora no atendimento às autoridades alemãs preocupa Brandão. “A punição é mais lenta do que o negócio. Dá ao criminoso tempo de limpar a conta.” |
Deixe um comentário