Certa vez Abraham Lincoln cunhou frase certeira: “Se quiser pôr à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder”. O poder existe na família, na sociedade e no mercado. E as relações entre as pessoas são sempre assimétricas. Mas aí estamos falando do mundo privado. O poder institucionalizado se materializa no Estado. O organismo governamental nasceu como resposta às necessidades sociais cada vez mais complexas. A ordem pública, a defesa nacional, a garantia do poder da moeda, a vigência das leis, a tributação foram conformando o perfil do Estado no espaço e no tempo. Da democracia grega até a sua configuração contemporânea, passando por monarquias absolutas ou constitucionais e autoritarismos de todos os matizes, a organização do poder se metamorfoseou conforme as condições concretas de cada situação histórica específica.
O historiador inglês Lord Acton achava que “o poder tende a corromper e o poder absoluto corrompe absolutamente”. Já o timoneiro da redemocratização brasileira, Ulysses Guimarães, não concordava, dizia “o poder não corrompe o homem, é o homem que corrompe o poder”. E acrescentou na promulgação da Constituição de 1988: “A moral é o cerne da Pátria. A corrupção é o cupim da República… Não roubar, não deixar roubar, pôr na cadeia quem roube, eis o primeiro mandamento da moral pública”. Seu parceiro na construção da democracia no Brasil, Tancredo Neves, completava sobre o germe da corrupção: “O que existe de ruim é que ele começa desfigurando as instituições e acaba desfigurando o caráter do cidadão”.
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Hoje o Brasil envolvido em clima contraditório combinando indignação, perplexidade, revolta, desânimo, saturação, assiste aos desdobramentos da Operação Lava Jato e de outras tantas revelando um grau de corrupção sistêmico, institucionalizado, generalizado e insuportável. A corrupção não nasceu aqui, nem agora. Desde o Império Romano e do Estado Colonial português, assistimos a denúncias de corrupção. No mundo inteiro ocorrem escândalos. E não têm cor ideológica. O que varia é o grau de impunidade.
Para que a atual crise ética brasileira gere frutos para as gerações futuras temos que rediscutir o tamanho do Estado e sua burocracia, modernizar e simplificar nossas leis, punir corruptos e corruptores, difundir os valores republicanos, ampliar a transparência, avançarmos os controles sociais e institucionais, rever as relações entre as esferas pública e privada, alimentar a intolerância com a corrupção. Mudar a atitude, a cultura coletiva e fortalecer as instituições.
A Lava Jato se tornou um patrimônio da sociedade. Ninguém irá controla-la. Respeitados os princípios do Estado de Direito: o ônus da prova para quem acusa, o direito à ampla defesa e a presunção da inocência, temos que ir fundo e passar o país a limpo.
Só não podemos dar razão à triste constatação de Simone de Beauvoir: “O mais escandaloso nos escândalos é que nos habituamos a eles”.
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