O governo vai tentar mudar o texto-base da Proposta de Emenda à Constituição 511/06, que altera o trâmite das medidas provisórias no Congresso. Um destaque apresentado pela base permite que o Executivo continue com a permissão de editar uma MP revogando outra já publicada. De acordo com a proposta aprovada na semana passada pelos deputados, isso não é possível (
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Na teoria, a PEC trará mais autonomia ao Parlamento, uma vez que ela permite a inversão da pauta de votações após o vencimento de uma medida provisória. Para isso, seria necessário que 257 deputados (maioria absoluta) apoiassem a inversão de pauta. Atualmente, uma MP tem prioridade após 45 dias. Ou seja, nenhuma outra matéria pode ser apreciada antes dela.
O destaque foi apresentado pelo vice-líder do Bloquinho Miro Teixeira (PDT-RJ). No entanto, é repudiado e desconhecido pelos colegas do próprio do Bloquinho, inclusive o líder. Já a oposição diz que, se aprovado, o destaque “enfraquece o Parlamento”.
Ao
Congresso em Foco, Miro Teixeira disse que o governo tem o “
direito ao arrependimento”, que sabe que esse tema não tem consenso no Bloquinho e que essa é sua opinião particular sobre o tema. O governo já se valeu do expediente de retirar medidas provisórias conforme sua conveniência para apressar outras votações, como a CPMF, no ano passado.
Incoerência
“Não tem coerência. Minha decisão pessoal é de não aprovar isso”, afirmou o líder do Bloquinho, Mário Heringer (PDT-MG).
A líder do PCdoB, outra sigla do Bloquinho, foi surpreendida com o teor do destaque. “É pouco explicável. Acho até estranho”, argumenta Jô Moraes (MG). Segundo ela, o debate sobre o trâmite de medidas provisórias no Congresso é um “mecanismo pedagógico” para o próprio governo.
“O governo tem que entender que o trabalho é de intensificar o diálogo com a Casa”, explica Jô. Ela também acrescenta que medida provisória é um instrumento que “deve ser usado de forma parcimoniosa”.
Contudo, Jô Moraes ressalta que, apesar de ser pessoalmente contra, votará de acordo com a orientação do bloco.
Por sua vez, o líder do PDT, Vieira da Cunha (RS), ressalta que é preciso apreciar “com cuidado” o destaque apresentado por seu partido. “Essa iniciativa pode acabar se voltando contra nossos interesses”, avalia o gaúcho.
Posição oficial
Oficialmente, o destaque de Miro é a posição do Bloquinho, apesar de ele dizer que é sua opinião particular. Segundo a Secretaria Geral da Mesa, apesar das divergências e ponderações de Heringer, Vieira da Cunha e Jô, qualquer vice-líder pode, regimentalmente, apresentar um destaque sem consulta prévia aos líderes, o que é feito em nome de todo o bloco parlamentar ou partido.
O PT também apresentou um destaque com o mesmo teor do Bloquinho, mas ele ficou prejudicado. O Congresso em Foco não localizou o líder do PSB, Márcio França (SP), outro partido do bloco parlamentar.
O deputado José Carlos Aleluia (BA), vice-líder do DEM, aproveitou para dar um conselho aos líderes surpreendidos: “Eles podem dizer que foram enganados”. De acordo com o democrata, a intenção do governo com esse destaque é “aumentar o poder do Executivo”. Para o parlamentar baiano, a PEC em si “enfraquece o Parlamento”. “Deputado não vai valer nada”, destaca.
Exemplo da CPMF
O expediente de editar uma medida provisória para revogar outra que já existe não é nenhuma novidade. Um dos exemplos dessa manobra ocorreu no ano passado, durante a votação na Câmara da proposta que prorrogava a cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).
Com a pauta obstruída por MPs, e com pressa em votar a CPMF, o governo editou medidas provisórias anulando as que trancavam as votações no plenário.
Pauta
Conforme explicou o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), “nada vai alterar” o fato de que os destaques à PEC que altera a tramitação das medidas provisórias serão analisados logo após a votação das MP 440/08 e 44108.
Atualmente essas MPs, que reajustam o salários de servidores públicos, trancam a pauta da Casa.
O ponto principal dessa proposta de emenda à Constituição é o fim do trancamento obrigatório da pauta pelas MPs. Atualmente, se uma medida provisória não for analisada após 45 dias de sua edição, ela passa necessariamente a ter prioridade no plenário da Câmara. Ou seja, nenhuma matéria é votada antes dela.
De acordo com o texto aprovado na semana passada, após 15 dias a MP passará a ser o primeiro item da pauta. Contudo, a maioria absoluta dos deputados (257 parlamentares) poderá alterar a ordem quando uma medida provisória passar a trancar os trabalhos em plenário. Dessa forma, a Casa fica liberada, caso a maioria assim o deseje, para apreciar outras proposições.
Além disso, caberá à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara e do Senado analisar se as MPs enviadas ao Congresso cumprem os preceitos constitucionais de relevância e urgência para a utilização desse instrumento. Somente após o aval do colegiado, a MP será apreciada pelos parlamentares no plenário.
(Rodolfo Torres e Fábio Góis)
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