Ricardo Ramos
O governo Lula manteve o cofre fechado durante quase todo o ano e quando o abriu foi para beneficiar deputados e senadores da base aliada com a liberação de emendas individuais. Dados da execução orçamentária do governo examinados pelo Congresso em Foco mostram que os recursos liberados pelo Executivo apenas para a bancada do PT no Congresso superam os repasses já pagos este ano a todos os partidos da oposição.
De R$ 1,1 bilhão que deveria ter sido liberado em emendas individuais em 2005, apenas R$ 11,9 milhões haviam sido pagos até o último dia 11. Desse total, 72,3% foram para atender às reivindicações dos governistas. Para as emendas dos 82 deputados e 12 senadores petistas, o Tesouro liberou R$ 3,29 milhões – 27,7% de todo o montante. Já os parlamentares do PSDB, do PFL, do PPS, do PDT e de outras legendas de oposição foram contemplados com apenas R$ 2,55 milhões (21,9%).
Os demais aliados – PSB, PCdoB, PTB, PP, PL e PMDB – foram atendidos com a liberação de R$ 6,06 milhões (50,9%). Em outras palavras, de R$ 5 liberados pelo Executivo, R$ 4 foram para atender a pedidos dos governistas.
Leia também
Aos aliados, empenho
Caso o governo gaste, de fato, R$ 1,1 bilhão em emendas parlamentares, como anunciou dias atrás o ministro Jaques Wagner (Relações Institucionais), os partidos da base novamente devem ser os principais destinatários desses recursos. Assim como tem ocorrido com os pagamentos feitos pelo Executivo, o empenho das emendas individuais, principal etapa antes da realização dos pagamentos, é maior entre os aliados do governo. O empenho é a autorização para pagar uma despesa orçamentária.
Até o último dia 11, o Tesouro havia empenhado R$ 591,8 milhões em emendas individuais, o que representa 53,26% do previsto para 2005. Os empenhos garantidos ao PT, ao PMDB, ao PP e ao PL superam a casa dos 60% dos recursos incluídos no orçamento pelos parlamentares desses partidos. Para o PFL e o PSDB, os percentuais giram em torno de 30%. Para que as emendas sejam executadas, contudo, o governo terá de correr contra o tempo. Ou deve fazer os pagamentos até o último dia do ano ou, como costuma acontecer, precisa inclui-las nos “restos a pagar” de 2005 para elas serem executadas em 2006.
Reservado para a base
Após os petistas, os dois senadores e os 29 deputados do PSB foram os mais bem atendidos pelo Executivo, com a liberação de R$ 2,9 milhões. Mesmo com a baixíssima execução orçamentária – o governo só pagou 1,07% do previsto para 2005 –, as emendas dos parlamentares socialistas foram as que, proporcionalmente, mais receberam recursos: 6,5%. A título de comparação, o PFL, com 61 deputados e 16 senadores, só foi atendido com 0,56% do que estava previsto (modestos R$ 800 mil).
PMDB em baixa
Com a maior bancada do Senado e a segunda da Câmara, o PMDB é o partido da base do governo mais prejudicado com a liberação de emendas. Seus 21 senadores e 81 deputados só receberam R$ 530 mil das emendas individuais. Isso representa 0,31% dos R$ 103 milhões apresentados pela bancada peemedebista.
Oposição condena
“O presidente age de forma odiosa. Isso, em qualquer lugar do mundo, chama-se indecência. É despreparo total para conduzir o governo”, ataca o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). “É deplorável que o governo use o orçamento como barganha”, critica o deputado Pauderney Avelino (AM), vice-líder do PFL na Câmara. “A execução orçamentária tem que seguir o princípio da impessoalidade”, completa.
Segundo o deputado Luiz Couto (PT-PB), o governo repassa mais recursos para a os partidos da base porque sofre maior pressão dos aliados. “É lícito que os parlamentares que dão sustentação política ao governo possam ter uma participação maior (no recebimento de recursos)”, defende o ex-vice-líder petista.
Mais difíceis de serem liberadas do que as emendas de bancada, as emendas individuais são aquelas propostas exclusivamente por um único parlamentar ao orçamento. Servem para a realização de pequenas obras, como a construção de escolas e postos de saúde, nos redutos eleitorais dos congressistas. Para este ano, cada parlamentar teve o direito a apresentar até 20 emendas individuais, no valor total de R$ 3,5 milhões. A proposta orçamentária de 2006 prevê a elevação desse teto para R$ 5 milhões.
Moeda de troca
Para o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, o uso político das emendas parlamentares – especialmente as individuais – não começou no governo Lula. A prática, afirma, vem desde a promulgação da Constituição de 1988. “Como o orçamento não é impositivo, o Executivo faz o que quer”, avalia.
Ziulkoski, Luiz Couto e Pauderney concordam em um ponto: as emendas parlamentares deveriam ser eliminadas. “O critério para esses repasses poderia ser igual ao do Fundo de Participação de Município”, sugere o presidente da CNM, ao lembrar que os repasses do FPM baseiam-se no tamanho da população da cidade.
Todos os anos, afirma Ziulkoski, a confederação apresenta um projeto para acabar com esse tipo de emenda à Comissão Mista de Orçamento. Mas falta vontade política para essa mudança. “O que aparece é muito discurso político”, diz Luiz Couto. “É conveniente para quem bate agora no governo e também para quem defende”, reconhece o petista.
Deixe um comentário