O ex-ministro da Educação Tarso Genro criticou duramente o ex-deputado José Dirceu (PT-SP), a quem acusou de criar um “mito” de grande estrategista do governo e de recorrer a um discurso stalinista para justificar sua cassação. A crítica foi feita em artigo publicado em jornal interno do PT e reproduzido pelo site oficial do partido.
Em uma das passagens, Genro, que dirigiu o partido interinamente este ano, na passagem da antiga para a atual direção, chega dizer: "livrai-nos, Senhor, de um ‘grande estrategista’ (referência expressa a Dirceu) que tem a coragem de ainda dizer – depois de tudo isso – frases como as seguintes: ‘querem me tirar da chapa, querem me tirar da fotografia, querem me tirar da História, depois sou eu que sou stalinista…’ Ou seja, compara-se com os mártires do stalinismo, com um argumento stalinista".
Segundo o ex-ministro, Dirceu se pautou por "uma baixa capacidade de escuta" na articulação política do governo, atitude que foi a principal causa de seus erros na Casa Civil. "O principal deles (desses erros) foi tomar decisões importantíssimas, dispensando a mediação partidária transparente e considerando irrelevante a escuta de quadros com maior experiência de gestão e maior conhecimento da máquina pública", diz o texto. Genro ainda defende a reconstrução do PT e a retomada do debate sobre a "revolução social" do Brasil.
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Veja os principais trechos do artigo do ex-presidente do PT:
Direção centralizada
“Sou adversário das posições que conheço do ex-ministro José Dirceu, no que refere à métodos de direção, à forma isolada e centralizada (pouco democrática) com que ele geriu as políticas de governo na Casa Civil e mesmo com que coordenou as políticas no PT, enquanto era presidente.”
Erros graves
“Acho que o ex-Ministro José Dirceu cometeu erros graves, de natureza política, em vários momentos. O principal deles foi tomar decisões importantíssimas, dispensando a mediação partidária transparente e considerando irrelevante a escuta de quadros com maior experiência de gestão e maior conhecimento da máquina pública. Experiência e conhecimento que ele carecia.”
Baixa capacidade de escuta
“Esta deficiência sua foi clara, na sua passagem pela Casa Civil. Os quadros a que me refiro, poderiam ter colaborado para uma qualificação das ações da Casa Civil e poderiam ser encontrados inclusive dentro da própria ‘Articulação’ – corrente do ex-Ministro – que é um bom manancial de gestores experimentados. O ex-ministro, porém, agiu sempre de forma auto-referente e com baixa capacidade de escuta.”
Socialismo
“Não creio, porém, que os seus erros venham do fato de que ele ‘abandonou a revolução’, ou porque tenha ‘abandonado o socialismo’. Não sei, aliás, efetivamente, se isso ocorreu, nunca tive a oportunidade de fazer uma discussão profunda com ele sobre o assunto. Penso, aliás, que nunca esteve em jogo, no governo Lula, a questão do socialismo no Brasil. (…)
Não creio, todavia, que o PT seja um partido “revolucionário” ou mesmo “socialista”, dentro do que a tradição marxista-leninista entende como tal. O PT é, e sempre foi, um partido reformador, que centra sua estratégia num projeto de revolução democrática para o Brasil, nos marcos da democracia e da Constituição. É o que indica a nossa prática, a nossa história e o que recomenda – pelo menos provisoriamente – a própria falência das experiências marxistas-leninistas no mundo.”
Mito desfeito
“Se existe algum tipo de situação política, porém, que levou à cassação do ex-ministro José Dirceu, foi a criação do mito do ‘grande estrategista político’. E mais, um mito centrado na força de São Paulo, que detinha e ainda detém uma força demasiada, que é exercitada duramente sobre o conjunto do PT no país. (…) Talvez o ‘mito’ tenha sido criado no seu entorno e sem a sua percepção, engendrado de boa fé pelos seus seguidores mais acríticos. Ora, como esse ‘mito’ estava presente todos os dias na imprensa (e no próprio governo), a direita viu nele o alvo principal para o seu ataque, ‘pelo que ele fez e pelo que não fez’: atacando duramente o ‘mito’, atingiu o imaginário do PT como um todo e conseguiu nos atingir a todos. Falo em ‘mito’ porque, na verdade, ainda desconheço, nas instâncias de direção do PT, um ‘grande estrategista’”.
Conspiração inventada
“Quem tinha por hábito inventar conspirações para preparar movimentos ofensivos era o velho e conhecido georgiano (Stalin). É aquele método de debate que imputa posições a outros, caricaturizando-os, para depois atacá-los, mesmo sabendo que as posições ‘atacadas’ não correspondem às posições da vítima.”
Dirigentes omissos
“Creio que é bom deixar claro que não foram somente os erros do ex-Ministro José Dirceu ou de Delúbio Soares (ou de alguns dos nossos dirigentes), que nos levaram à atual crise, mas também a omissão geral dos nossos quadros e de dirigentes de várias posições, já que indistintamente nos movimentamos, no último período, não para ‘supervalorizar as eleições’ como querem alguns, mas para eleger, pelas formas tradicionais, os preferidos de cada tendência ou grupo de influência. (…)
Os acusadores radicais dos métodos ‘eleitoreiros’ só apareceram quando os erros tornaram-se públicos, já que o PT, como um todo, estava se tornando um partido tradicional, quase na base de ‘cada mandato, uma corrente’ (eleitoral). (…)
“Não estou dizendo com isso que todos os dirigentes tenham o mesmo grau de responsabilidade ou mesmo que tenham algum tipo de ‘responsabilidade objetiva’. Mas, é claro que situações como esta não se criam sem uma certa cultura política, sem um certo clima de mínima conivência política ou mesmo indiferença de todos, ou pelo menos de uma boa parte dos que têm influência no partido.”
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