Rudolfo Lago
Ela não é uma lei de iniciativa do Congresso Nacional. Não é obra de nenhum deputado federal ou senador. Na verdade, o provável é que a grande maioria dos políticos brasileiros torça o nariz para ela. Um deles, o deputado Jader Barbalho (PMDB-PA), que hoje está com a candidatura barrada graças a ela, classificou a lei que tem por iniciativa evitar a eleição de pessoas que têm condenação na Justiça como “algo pior que o AI-5”.
O AI-5, ato da ditadura militar, cassava pessoas sem qualquer justificativa, por mera perseguição política, sem direito a julgamento. A Lei da Ficha Limpa, que Jader considerou “pior que o AI-5”, torna inelegíveis aqueles que têm condenação por pelo menos um órgão colegiado da Justiça (ou seja, é necessário que um conjunto de juízes concorde que a pessoa é culpada), e o cidadão ainda pode recorrer até o Supremo Tribunal Federal (questionando sua inconstitucionalidade). Também aqueles que renunciaram no passado para evitar uma punição que seria exatamente a inelegibilidade. Caso do próprio Jader. Pior que o AI-5?
Por grande margem de votos, os jornalistas que cobrem o Congresso Nacional escolheram a Lei da Ficha Limpa como a principal iniciativa legislativa do ano de 2010. A partir de segunda-feira, ela estará, juntamente com outros projetos discutidos ou aprovados este ano pelo Congresso – caso, por exemplo, da Política Nacional de Resíduos Sólidos, da PEC da Maternidade e da PEC do Divórcio – na lista de votação no site para a confirmação dos internautas, no início da segunda etapa do Prêmio Congresso em Foco.
Na primeira etapa do Prêmio Congresso em Foco, 183 jornalistas envolvidos com o acompanhamento das atividades do Congresso Nacional votaram em dez deputados e cinco senadores que, na opinião deles, se destacaram este ano na defesa dos interesses da população. Os 31 deputados e os dez senadores mais lembrados pelos jornalistas farão parte da lista que, a partir de segunda-feira, estará à disposição dos internautas para votação na página do Congresso em Foco na internet. Essa votação dos leitores acarretará na escolha do melhor senador e do melhor deputado de 2010. A cerimônia de premiação será no dia 22 de novembro.
Os jornalistas também escolheram os parlamentares que mais se destacaram em categorias especiais (defesa da democracia; combate à corrupção; defesa da saúde, da educação e do meio ambiente). E elegeram também as principais iniciativas do Legislativo este ano. Também essas listas a partir de segunda estarão à disposição dos leitores/internautas para a confirmação final.
“Mudança impactante”
Presidente da Associação dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe) e um dos idealizadores do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), autor inicial do projeto que criou a Lei da Ficha Limpa, o juiz Márlon Reis diz que a escolha dos jornalistas “não supreende”.
“A Lei da Ficha Limpa é imensamente impactante na cultura política brasileira”, diz ele. “A melhor prova da correção da sua elaboração é que ela acabou mesmo se dirigindo contra aqueles políticos que notoriamente tinham seus nomes vinculados a práticas antiéticas”, considera. Para Márlon Reis, os efeitos da lei, mesmo ainda não esgotados todos os prazos de recurso dos candidatos que estão com suas candidaturas barradas, já foram produzidos.
Ele, porém, elimina a possibilidade que alguns receiam de que o Supremo Tribunal Federal (STF) venha a reformar a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de que a lei, em todos os seus efeitos, já vale para as eleições deste ano. “Não conto com essa hipótese. Uma revisão como essa não desmoralizaria apenas as instituições que se vincularam à Lei da Ficha Limpa, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Desmoralizaria o próprio TSE. Não creio que o STF deseje isso”, conclui Márlon Reis.
Outras iniciativas
Além da Lei da Ficha Limpa, os jornalistas destacaram outras iniciativas. As cinco mais citadas serão agora submetidas à apreciação dos internautas. Conhecida como PEC do Divórcio, a emenda constitucional que agiliza os processos de divórcio consensual é uma delas. Pelo texto, os casais que queiram se divorciar ficam livres da obrigação que havia antes de já estarem separados por mais de dois anos. A PEC é iniciativa do deputado Sérgio Barradas Carneiro (PT-BA) e do ex-deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ).
Veja a íntegra da PEC do Divórcio
Outra iniciativa lembrada pelos parlamentares é a PEC da Maternidade. Essa emenda, de autoria da senadora Rosalba Ciarlini (DEM-RN), amplia de quatro para seis meses o período de licença-maternidade, e o estende também para mães adotivas.
Veja a íntegra da PEC da Maternidade
Uma lei que levou quase 20 anos de tramitação para ser aprovada é mais uma das iniciativas eleitas pelos jornalistas. Trata-se da Política Nacional dos Resíduos Sólidos. A lei extingue, em médio prazo, os lixões e obriga as empresas a criarem programas de manejo e reciclagem de lixo, entre outras determinações.
Leia a íntegra da Política Nacional de Resíduos Sólidos
A polêmica proposta que distribui nacionalmente os recursos de royalties pela exploração de petróleo também faz parte das iniciativas lembradas. O projeto provocou ruidosos protestos das autoridades do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, estados que recebem a maior parte dos recursos dos royalties. No Rio, o governador Sergio Cabral chegou a fazer uma passeata contra a medida. O projeto define que os recursos de pagamento de royalties pela exploração do petróleo do pré-sal, em vez de ficarem concentrados apenas nos estados produtores, sejam distribuídos nacionalmente. A autoria do projeto é dos deputados Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), Humberto Souto (DEM-MG), com modificação feita pelo senador Pedro Simon (PMDB-RS).
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