O relatório do sub-relator da CPI do Tráfico de Armas, Raul Jungmann (PPS-PE), apresentado hoje (27), é o principal contraponto produzido até agora contra o lobby da indústria brasileira de armamento e a chamada "bancada da bala" no Congresso Nacional. O resultado do trabalho de mais de um ano mostra que os maiores desvios de armas para o crime são feitos por lojas legalmente autorizadas.
No total de 10.549 armas rastreadas pela comissão parlamentar, 55% foram vendidas legalmente antes de cair na mão de criminosos e serem apreendidas pelas polícias. O texto do relatório diz que "destroí-se o mito de que as armas vendidas a cidadãos de bem nada têm a ver com as armas dos criminosos" (leia mais).
Com essa informação, Jungmann contesta o referendo vencido pela frente parlamentar contrária à proibição da comercialização de armas no país sob a alegação de que o direito de comprar uma arma não poderia ser revogado. "As armas do cidadão de bem vão armar os braços dos homens do mal", resumiu o parlamentar.
Considerando que 68% das armas ilegais foram vendidas no mercado civil interno, a comissão fez um cruzamento entre as armas rastreadas pelos fabricantes (10.549 armas), com as armas rastreadas pelo Sistema Nacional de Armas (Sinarm) (8.422 armas).
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O levantamento conclui com a identificação de 3.601 armas coincidentes, apreendidas no estado do Rio de Janeiro com o seguinte destino: 74% foram vendidas para pessoas físicas; 25% foram vendidas para empresas de segurança; privada, transportadoras de valores e departamentos de segurança de empresas privadas; 0,6% foram vendidas para órgãos do Estado; 0,3% foram vendidas para outras pessoas jurídicas.
Ainda segundo o relatório, 86% das armas apreendidas em situação ilegal no Brasil e rastreadas foram desviadas em território brasileiro. E deste total, 11% foram anteriormente exportadas e contrabandeadas via Paraguai, saindo e voltando do território brasileiro, como um “efeito bumerangue”.
"Estamos preocupados com as fronteiras e contrabando de armas pesadas, que existe, enquanto o problema é descontrole interno e falta de fiscalização do comércio de armas", explica o parlamentar do PPS. O texto do relatório mostra que as informações sobre o "efeito bumerangue" coincidem com o depoimento em novembro de 2005, de Ricardo Castilho Herrera, preso em São Paulo acusado de vender munição para o Primeiro Comando do Capital (PCC):
“O que vem de contrabando é muito pouco, é picuinha. O volume de armas curtas, revólveres e pistolas, é alimentado e realimentado aqui dentro mesmo, num círculo vicioso: a arma é roubada do policial, ou do civil, ou de empresa de vigilância, ou vem pelo Paraguai", descreveu Herrera à CPI.
O coordenador do ONG Viva Rio, Antônio Rangel, disse ao Congresso em Foco, que ainda existe no governo federal um lobby da indústria nacional de armamento para que seja retirada a alíquota de 150% para exportações de armas para os países da América do Sul e do Caribe. A medida é considerada polêmica e defendida pelo Ministério da Defesa, mas condenada pelo Ministério da Justiça.
Mesmo sem consenso, o aumento das exportações para os países vizinhos, segundo a ONG, pode aumentar o "efeito bumerangue" de armas brasileiras contrabandeadas de volta para o Brasil. "Há cerca de dois meses o ministro Valdir Pires disse que a alíquota só deveria permanecer para armas de uso restrito como pistolas 9mm. Como não sabemos quem será o próximo ministro da Justiça, a dúvida permanece", explica Rangel.
Oficialmente, o Ministério da Defesa diz que a medida poderia seria adotada apenas para armas de uso permitido, ou seja, do calibre .22 até o calibre .38. "Mas o relatório mostra justamente que esse tipo de arma é o mais usado em crimes. Se as exportações para o Paraguai, por exemplo, aumentam será mais barato e mais fácil comprar, considerando o Estatuto do Desarmamento, por lá e entrar no Brasil ilegalmente com a arma", reclama Rangel. (Lúcio Lambranho)
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