Tarciso Nascimento
Além da resistência dos policiais, a obrigatoriedade de realização de exames toxicológicos pela categoria também esbarra em restrições de ordem econômica. A preços de mercado, a realização de exame de fluidos corporais (sangue, urina ou suor) para detectar a presença de drogas no organismo sai entre R$ 100 e R$ 200. Caso todos os 550 mil policiais fossem submetidos a esse tipo de teste, o poder público gastaria mais de R$ 50 milhões com a medida.
Os gastos poderão ser ainda maiores, na casa dos R$ 110 milhões, se as corporações optarem pela realização de exames com mostras de queratina (cabelo, pêlos e unhas) – os mais confiáveis para identificação de substâncias tóxicas no organismo. Nenhuma das propostas em tramitação no Congresso que tratam do assunto prevê de onde sairá o recurso para arcar com essas despesas. Os projetos tampouco estabelecem a receita a ser usada para o tratamento dos policiais flagrados no exame. Uma temporada em uma clínica particular sai em torno de R$ 8 mil mensais por pessoa.
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“O número de policiais envolvido com drogas não deve ser muito grande. O governo já investe muito nos usuários. Por que não investir no policial usuário de drogas? Esse projeto não é uma questão humilhante para eles, vem para preservar a saúde. É preocupante a quantidade de policiais que, em razão do contato direto com as substâncias, passam a fazer uso delas", diz o deputado Milton Cardias (PTB-RS), autor do Projeto de Lei 5999/05.
Com 40 anos de carreira, o presidente da Associação dos Policiais Militares do Brasil (Aspom), sargento Talvani Ribeiro, não aceita sequer discutir a proposta. “Temos tantos problemas sociais e vamos gastar dinheiro com exames e internação em clínicas? Esse dinheiro tem que ser empregado é na área social, com construção de escolas e hospitais”, afirma Talvani.
Problemas disciplinares
O diretor da Psychemedics Brasil, empresa que atua na detecção e controle de uso de entorpecentes, Marcello Santos, diz que estudos realizados no país apontam que um policial usuário de drogas tem de 8 a 11 vezes mais problemas disciplinares graves do que um policial não usuário. Segundo Santos, em apenas 25% dos casos o policial passa a usar substâncias ilícitas depois de entrar para a corporação.
“Há um consenso de que a principal barreira para coibir o uso de drogas nas corporações é realizar um exame toxicológico já na fase de seleção e recrutamento do candidato, mas isso não quer dizer, como provam diversas pesquisas, que não existem policiais que adquiriram o vício dentro da corporação. Por isso a importância dos testes periódicos entre os policiais”, afirma Santos.
O diretor da Casa de Recuperação El Shadai, em Brasília, Pastor Manoel Canuto, estima que 90% dos policiais têm algum problema com drogas, seja álcool, cigarro ou maconha. Segundo ele, a resistência em se livrar da dependência é maior entre os policiais do que entre usuários comuns.
“O policial não admite que uma pessoa que não tem a patente superior à dele lhe dê conselhos. Ele não concorda com a sua opinião, nem quer participar da terapia ocupacional. A maioria dos policiais dá mais problemas do que o usuário comum. Ele acha que larga a hora que quer”, afirma Canuto, que, nos 13 anos de funcionamento da Casa de Recuperação, diz já ter atendido a mais de 800 policiais envolvidos com drogas ilícitas.
Experiência pioneira
A Guarda Municipal de São Bernardo do Campo, que hoje conta com um efetivo de 630 integrantes, foi a primeira instituição ligada à segurança pública na América do Sul a realizar exames toxicológicos no processo de admissão, em 2000. Há dois anos, a corporação também realiza testes randômicos (nos quais os pesquisados são escolhidos aleatoriamente), em que de 2% a 3% do efetivo policial faz o exame mensalmente.
O balanço dos testes, segundo o comandante da Guarda Municipal, Antônio Branco, é altamente positivo e estreitou a relação da comunidade com os guardas. “Nós recebemos um apoio muito grande da população. Eles se sentem mais seguros. Os guardas também sentem mais credibilidade um para com o outro, confiam mais no parceiro”, considera.
Desde que o programa de exames periódicos foi colocado em prática, apenas uma pessoa foi pega no doping, conta o comandante. “O exame disse que ela (a guarda) tinha feito uso de cocaína”. Branco não só defende a extensão dos exames a outras categorias da segurança pública como refuta a crítica de que a medida viola o direito da individualidade.
Na avaliação dele, o princípio do interesse público se sobrepõe ao individual. “Quem não deve não teme. Se você exerce uma atividade pública, isso é um problema da população. Como você vai confiar no policial? Quando o policial faz testes periodicamente dá mais credibilidade para a instituição. Você tem que ter transparência naquilo que faz”, diz.
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