Reportagem publicada na edição desse domingo da Folha de S. Paulo sustenta que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), candidato à presidência da República, direcionou recursos da Nossa Caixa para favorecer jornais, revistas e programas de rádio e televisão mantidos ou indicados por deputados da base aliada na Assembléia Legislativa.
Segundo a matéria, assinada por Frederico Vasconcelos, documentos confirmam que o Palácio dos Bandeirantes interferiu para beneficiar com anúncios e patrocínios os deputados estaduais Wagner Salustiano (PSDB), Geraldo “Bispo Gê” Tenuta (PTB), Afanázio Jazadji (PFL), Vaz de Lima (PSDB) e Edson Ferrarini (PTB).
O Palácio dos Bandeirantes teria pressionado o banco oficial a patrocinar eventos da Rede Vida e da Rede Aleluia de Rádio e autorizado a veiculação de anúncios mensais na revista Primeira Leitura. O criador da publicação, Luiz Carlos Mendonça de Barros, ministro das Comunicações no governo Fernando Henrique Cardoso, é dono da Quest Investimentos, empresa escolhida para gerir um novo fundo da Nossa Caixa. A revista nega ter sido favorecida.
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Uma auditoria na área de publicidade da Nossa Caixa, segundo a Folha, revela o descontrole nas contas da instituição. O Ministério Público estadual também teria detectado o uso político-partidário do banco oficial.
Alckmin disse ontem que não pretende investigar o caso, que, segundo avalia, “não tem a menor veracidade”. O governador ressaltou que as investigações foram feitas pelo próprio banco, o que dispensaria novas apurações.
“Não (vou investigar). A investigação foi feita pela Nossa Caixa. Ela fez a sindicância, concluiu, encaminhou ao Ministério Público e ao Ministério Público. Há 500 veículos de comunicação e nós estamos falando de cinco casos. Agora, concluir que tenha ingerência política em 500 veículos? É totalmente pulverizada a estratégia de comunicação”, disse o pré-candidato. Segundo o governador, ninguém mais será punido pelo caso: “Pessoas terceirizadas de agência não falam em nome do governo”.
Entre setembro de 2003 e julho de 2005, as agências de propaganda Full Jazz Comunicação e Propaganda Ltda. e Colucci Propaganda Ltda. continuaram prestando serviços sem amparo legal, pois o banco não renovara os contratos. O caso está sendo apurado pelo promotor de Justiça da Cidadania Sérgio Turra Sobrane.
De acordo com a reportagem, a auditoria interna apontou irregularidades em 255 (91,73%) dos 278 pagamentos feitos às duas agências no período em que operaram sem contrato. Não foram localizados documentos autorizando pagamentos que somavam R$ 5,1 milhões. Em 35% dos casos, não havia comprovantes da realização dos serviços. Em 62,23%, os pagamentos não respeitaram o prazo mínimo legal de 30 dias. O patrocínio de campanhas de marketing direto era autorizado verbalmente.
A responsabilidade por esses pagamentos é atribuída ao ex-gerente de marketing Jaime de Castro Júnior, ex-auditor do banco, com 28 anos de casa. Ele admitiu ter liberado pagamentos em valores acima dos limites que podia autorizar e, a partir de 2002, sem ter procuração para tal. “Reafirmo que assumi a responsabilidade pela liberação dos pagamentos, dados sua urgência e os interesses da instituição”, afirmou à comissão de sindicância.
Ele foi demitido por justa causa, em dezembro, pelo presidente do banco, Carlos Eduardo Monteiro, sob a acusação de “mau procedimento”, “desídia” e “indisciplina”. O ex-presidente do banco Valdery Frota de Albuquerque também foi responsabilizado.
Por entender que a comissão de sindicância poupou outros envolvidos, inclusive o presidente do banco, o ex-gerente preparou um relatório de 42 páginas em que revela outras irregularidades e as pressões que recebeu do Palácio dos Bandeirantes, conta a reportagem. “Houve atendimentos a solicitações de patrocínio e mídia, de deputados estaduais da base aliada, nas ocasiões de votação de projetos importantes para o governo do Estado”, afirma Castro Júnior nessa peça.
O direcionamento da publicidade pelo Palácio dos Bandeirantes veio à tona com a quebra de sigilo da correspondência (e-mails) de Castro Júnior, autorizada pela direção do banco nas investigações. Essa troca de mensagens indica que as determinações para a veiculação de interesse dos tucanos partiram do assessor especial de Comunicação do governo do Estado, jornalista Roger Ferreira.
Procurado pela Folha, Roger negou com veemência qualquer irregularidade. “É absolutamente falso que os gastos em comunicação do Governo do Estado de São Paulo obedeçam a quaisquer critérios que não sejam os técnicos”, afirmou. “O dinheiro é pouco e é usado tecnicamente.”
Segundo ele, o banco “possui autonomia para realizar a sua comunicação da maneira que considerar mais adequada”, e o governo “não faz interferências nessas ações e não interfere nas ações de comunicação de outras estatais”.
O secretário disse que a sindicância concluiu “não haver despesas não-justificadas nem acima dos padrões nos serviços de comunicação”. Sobre a contratação dele pelo banco, disse que “o porte da instituição justifica a contratação de uma assessoria de imprensa profissional, feita de forma inteiramente legal”.
A Nossa Caixa informou a Ferreira que os veículos citados pela Folha receberam apenas 1% do total de gastos de comunicação do banco, que no período fez veiculações em mais de 500 veículos.
O presidente da Nossa Caixa, Carlos Eduardo Monteiro, disse que não consegue “ver direcionamento político na veiculação de anúncios de R$ 200 mil e poucos”, diante dos R$ 18 milhões que o banco gastou em publicidade no período sob investigação. “Dizer que é direcionamento político é de uma pobreza enorme.”
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