Roseann Kennedy
O cenário é nebuloso na corrida eleitoral deste ano frente às interpretações diferentes na aplicação da Lei da Ficha Limpa. Os casos vão ganhar recurso e podem se arrastar até depois do resultado das urnas. Isso causa insegurança jurídica sobre quais serão de fato os próximos gestores.
Basta observar a situação que ocorreu esta semana. O Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal barrou a candidatura do ex-governador Joaquim Roriz (PSC). Um caso emblemático. Ele foi acusado de desvio de dinheiro público, renunciou ao mandato de senador para manter os direitos políticos e agora teve o pedido de candidatura negado com base na exigência da Ficha Limpa.
O TRE do Pará, no entanto, aplicou a lei de forma diferente e confirmou as candidaturas do deputado Jader Barbalho (PMDB) e do ex-deputado Paulo Rocha (PT). Ambos também renunciaram aos mandatos para manter os direitos políticos. (Jader renunciou em 2001 em meio à denúncia de desvio de dinheiro da Sudam e Paulo Rocha em 2005, durante o escândalo do mensalão.)
O choque de interpretação não para por aí. Na Paraíba, o ex-governador Cássio Cunha Lima, que quer disputar o Senado, não conseguiu o registro de candidatura porque teve o mandato de governador cassado. No Maranhão, porém, o ex-governador Jackson Lago obteve o registro, embora tenha tido o mandato de governador cassado.
O que faz a lei valer para uns e não para outros em situações semelhantes? É só reflexo da falta de consenso sobre a norma ou as forças políticas locais fazem diferença nas decisões?
De toda forma, os recursos vão agora para o Tribunal Superior Eleitoral. É de se esperar que este mantenha a coerência e vete as candidaturas que não estão dentro das exigências feitas pela Ficha Limpa, já que foi do próprio TSE o entendimento de que a lei valeria para este ano e para os condenados antes da norma.
Os políticos prejudiciados fazem constestações constitucionais, de que a punição fere o princípio de que uma lei não pode retroagir para prejudicar. Assim, como a questão não será apenas eleitoral, cabe um recurso final ao Supremo Tribunal Federal. O perfil neste júri costuma ser muito mais conservador. A discussão sobre a constitucionalidade da retroatividade da lei deve ser muito mais incisiva, principalmente na questão da inelegibilidade de candidatos que renunciaram, porque quando fizeram essa opção para manter os direitos políticos estavam baseados em outra legislação.
Mas, sinceramente, nunca deveria ter existido esse direito de um parlamentar renunciar para manter os direitos políticos. Uma permissividade vergonhosa.
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