Reportagem publicada nesta quarta-feira (16) pelo site da revista Época traz documentos sobre uma conta em paraíso fiscal atribuída ao senador Aécio Neves (PSDB-MG) pelo ex-líder do governo no Senado Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) em sua delação premiada. De acordo com a matéria, uma operação da Polícia Federal descobriu, em 2007, a existência de uma conta criada no LGT Bank em nome de uma fundação criada pela mãe do presidente do PSDB no principado de Liechtenstein, na Europa. A conta foi registrada em nome da fundação Bogart e Taylor em 2001, quando Aécio era presidente da Câmara dos Deputados.
Citada por Delcídio, a conta é investigada pela Procuradoria-Geral da República na Operação Lava Jato, segundo o jornalista Diego Escosteguy, autor da reportagem. Em 2007, o Ministério Público arquivou o caso sem apurá-lo, alegando dificuldade de ter acesso a informações em Liechtenstein, considerado um dos paraísos fiscais mais fechados do mundo.
Responsável pela abertura da conta e alvo da investigação inicial do MP, Norbert Muller e sua mulher, Cristine Puschmann, foram acusados de comandar uma das mais secretas e rentáveis “centrais bancárias e clandestinas” do país, relata Época. O nome da mãe do senador, Inês Maria, estava na lista dos 75 clientes identificados em pasta apreendida na casa de Muller, no Rio, durante a operação da PF. O doleiro já faleceu.
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Delcídio e Janene
Em sua delação, Delcídio conta aos procuradores que foi informado pelo ex-deputado José Janene (PP-PR), morto em 2010, de que Aécio “era beneficiário de uma fundação sediada em um paraíso fiscal, da qual ele seria dono ou controlador de fato; que essa fundação seria sediada em Liechtenstein”. Janene é considerado um dos principais operadores do mensalão e do petrolão. O ex-líder do governo no Senado disse não saber se há relação entre essa fundação e as acusações que fez ao tucano, como a de ser beneficiário de propinas em Furnas e de ter agido para interferir nas investigações da CPI dos Correios, da qual o petista foi presidente, em 2006.
Segundo a reportagem, foi a primeira vez que um delator da Lava Jato citou em público o que os investigadores da Procuradoria-Geral da República investigam sigilosamente. De acordo com Época, os procuradores da equipe de Rodrigo Janot pediram colaboração internacional, junto às autoridades de paraísos fiscais, para averiguar se contas como a associada ao senador em Liechtenstein foram usadas para o recebimento de propinas.
Os documentos apreendidos pela PF em 2007 mostram que a conta criada pela mãe do senador poderia ser movimentada por ela e por Andréa Neves, irmã de Aécio. Embora não estivesse autorizado a movimentar a conta da fundação, o tucano aparecia como seu beneficiário no caso de falecimento da mãe.
“Sem consentimento”
Ainda segundo a matéria, a investigação da PF concluiu que nem Inês Maria, nem Andréa nem Aécio haviam declarado à Receita Federal ou ao Banco Central, à época, a conta aberta em 2001. De acordo com a revista, o senador e sua mãe não quiseram dar entrevista. Por meio de advogado da família, eles informaram que a fundação foi criada por Inês Maria sem conhecimento dos filhos para destinar recursos à educação de seus netos. “Em 2001, assessorada pelo seu marido, o banqueiro Gilberto Faria, a Sra. Ines Maria pensou em criar uma fundação no exterior para prover os estudos dos netos. Foram feitos contatos com o representante de uma instituição financeira, no Brasil, e a Sra. Ines Maria encaminhou ao representante as primeiras documentações. Em função da doença de seu marido (Gilberto Faria morreria em outubro de 2008), os procedimentos foram interrompidos, e a fundação não chegou a ser integralmente constituída. A Sra. Ines Maria nunca assinou qualquer documento autorizando a abertura de conta bancária e nunca realizou remessa financeira para a mesma”, diz nota enviada pelos advogados da família.
A reportagem, no entanto, questiona a versão da família Neves. “Os papéis contradizem a versão de que a conta foi aberta ‘sem conhecimento da família’ de Aécio e que permaneceu aberta ‘à revelia’ dela. A pasta amarela guardava toda a papelada usada para abrir a conta. Havia cópia do passaporte de Inês Maria, assinaturas dela nos contratos com o LGT e procurações a Muller. Havia também páginas de extrato da conta. Em 2007, havia US$ 32 mil de saldo. Como são poucos os extratos apreendidos, não há como saber quanto dinheiro foi movimentado – nem quem fez depósitos ou saques. Na pasta, havia ainda numerosos faxes trocados entre Muller e um grupo de advogados ligados ao LGT, sediados em Vaduz, capital de Liechtenstein, com quem Muller mantinha parceria para facilitar contatos com o banco. Havia, por fim, os documentos de criação da fundação Bogart & Taylor, titular da conta no LGT. A criação da fundação, um tipo de entidade jurídica destinada a administrar patrimônios, estabelece uma camada extra de anonimato ao cliente. Uma coisa (a conta) não existe sem a outra (a fundação). Trata-se de uma precaução comum em Liechtenstein, também seguida por outros clientes de Muller”, diz a Época.
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