Diego Moraes
No apagar das luzes da CPI dos Correios, a sub-relatoria de Contratos descobre uma bomba que pode jogar ainda mais suspeitas sobre os nebulosos contratos assinados entre a estatal e a Brazilian Express Transportes Aéreos (Beta). Os parlamentares descobriram que a companhia utilizou uma certidão negativa de débito falsa para validar, em 2000, a assinatura de um contrato de R$ 250 milhões com os Correios, sem licitação, para operar o serviço aéreo postal até 2005.
Antes da Beta, a Vasp era a empresa responsável pelo transporte aéreo dos Correios. Afogada em dívidas, a empresa foi obrigada a rescindir o contrato porque não conseguiu a certidão negativa de débito junto à Procuradoria da Fazenda Nacional, vinculada ao Ministério da Fazenda. O documento é pré-requisito fundamental para a assinatura de contratos com empresas públicas.
A procuradoria despachou o nada-consta da Beta no dia 18 de abril de 2000. A empresa tinha dívidas com a União na época e, por isso, a certidão foi expedida como “positiva”. Mas, no verso do documento, uma ressalva assinada pelo procurador da Fazenda Nacional Marlen Mattos Braga atestou o caráter negativo da certidão, sob o argumento de que o débito da empresa ainda estaria sob análise.
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“É comum se fazer isso (um procurador atestar o caráter negativo da certidão) quando há parcelamento de dívidas, mas como não era o caso, nos chamou a atenção”, disse o sub-relator de Contratos da CPI, deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP).
Com a certidão nas mãos, o parlamentar encaminhou, no último dia 07 de março, um ofício à procuradora-chefe da Fazenda Nacional, Alice Vitória de Oliveira, para checar a autenticidade da assinatura. O resultado do pedido, segundo o deputado, atestou a falsidade da assinatura. “O procurador cuja assinatura constava no verso da certidão disse nunca ter assinado aquele documento.”
Para Cardoso, o falso documento reforça as suspeitas de que a Beta pagava propina a diretores dos Correios para, em contrapartida, firmarem contratos com a estatal. “A certidão é tão grosseira que achamos estranho os diretores dos Correios não perceberem”, afirmou o sub-relator.
Indiciamento
A CPI deve pedir o indiciamento de vários suspeitos de envolvimento em fraudes nas licitações da estatal, entre eles Carlos Lima Sena, então diretor de operações dos Correios na época da assinatura do contrato da Beta. Em depoimento à sub-relatoria de Contratos no dia 14 de dezembro, o vigilante Lincoln Pereira Frade, ex-funcionário da GPT (grupo que controla a Beta), disse que entregou R$ 20 mil para Lima Sena, a pedido da Beta, em 27 de julho de 2002.
No dia seguinte, a estatal expediu uma dispensa de licitação à empresa de transportes aéreos que resultou na assinatura de um contrato superfaturado. “O contrato ficou em R$ 90 mil por linha. Os Correios estimaram o serviço inicialmente em R$ 76 mil e a CPI calculou em R$ 50 mil”, explicou Cardozo.
A reportagem tentou entrar em contato com a Beta para tratar do assunto, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.
Lobby
A descoberta de uma certidão negativa de débito falsa reforça dentro da CPI as suspeitas de que a Beta pagava propina para evitar fiscalizações e correr de multas e impostos. “Acho que temos vários indícios de que talvez a Beta pagasse propina para fiscais”, enfatizou Cardozo.
A sub-relatoria de Contratos apura o envolvimento de Pedro Vieira Souza nas irregularidades da Beta. “Ninguém sabe exatamente o que ele fazia na empresa”, disse Cardozo. Em depoimento à CPI na semana passada, Pedro disse que foi contratado pela GPT em 2000, no mesmo ano em que a falsa certidão foi expedida.
O depoente afirmou que foi contratado, por R$ 540 mil, para levantar e renegociar dívidas das empresas do grupo. Porém, quando perguntado sobre questões tributárias, não demonstrou conhecimento profundo sobre o assunto, justificando que era pago apenas para enfrentar filas e recepcionar fiscais que apareciam nas empresas do grupo.
Os pagamentos da GPT a Pedro Vieira eram feitos de forma irregular, sem recibos ou notas fiscais, por um mecanismo que ficou apelidado como “cheque-frete”. A empresa creditava o pagamento como se fosse para empresas de transportes, mas repassava o dinheiro a Pedro.
No dia do depoimento, o sub-relator apresentou uma planilha de gastos da Promodal, uma das empresas do grupo GPT, na qual constam alegados pagamentos semanais de PIS e Cofins, de R$ 15 mil a R$ 20 mil, possivelmente feitos em 2002.
O deputado afirmou desconfiar que os valores, na verdade, eram propinas devidas por perdão ou redução de dívidas com essas contribuições. Agora, a CPI começa a suspeitar que Pedro Vieira pudesse ser uma espécie de lobista, para fazer a ponte entre a GPT e fiscais. “Ninguém recebe tanto dinheiro para servir café para fiscal. Ele (Pedro) passa a ser investigado agora”, afirmou o sub-relator.
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