Mensalão: entenda o que está em julgamento
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A disputa entre Barbosa e Lewandowski chegou ao ápice ontem (16), quando o relator anunciou que apresentaria seu voto em oito itens. Ao fim de cada, os ministros votariam pela absolvição ou pela culpa dos envolvidos em cada um desses blocos. No fim, após a coleta de todos os votos, eles decidiriam o método e a pena de cada um. “Se primeiro ler as minhas 1,2 mil páginas, depois as 1,2 mil páginas do revisor… É uma aposta no caos”, argumentou Barbosa durante a sessão.
Lewandowski não gostou da proposta. Disse que o relator estava prejudicando o julgamento desta forma. Para ele, Barbosa deveria ler a íntegra do seu voto. Ele adiantou que, ao contrário do revisor, fez o seu voto individualizando a conduta de cada réu. “Estou diante de uma enorme dificuldade. A metodologia é completamente distante da minha”, afirmou o revisor em plenário.
Durante a discussão, Barbosa pressionou os colegas. Disse que era capaz de o “julgamento terminar sem relator”. Fazendo referência ao seu estado de saúde – tem problemas no quadril e nas costas –, o relator queria convencer os outros ministros de que a melhor forma de votar seria a fatiada, por itens. A lógica do voto dele, do que foi revelado até agora, parte de como as agências de Marcos Valério se aproximaram do governo federal para chegar até à quadrilha supostamente chefiada por José Dirceu.
Diante do impasse, o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, sugeriu que cada ministro adotasse no seu voto a metodologia que achasse melhor. No entanto, a polêmica voltou à tona no fim. Após pedir a condenação do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) e dos três sócios das agências SMP&B e DNA, Barbosa abriu para o voto. Lewandowski mostrou novamente sua preocupação com a postura. Se Lewandowski votasse na ação como um todo, sem o fatiamento, ele anteciparia votos sobre réus ainda não mencionados pelo ministro relator, subvertendo toda a ordem do processo. Comungam da mesma opinião Marco Aurélio Mello, Celso de Mello, Cármen Lúcia e José Dias Toffoli.
Para não prolongar uma nova briga, o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, encerrou a sessão. Imediatamente, ele, Marco Aurélio e Celso de Mello puxaram Lewandowski em um canto do plenário. “[A conversa foi] para chegarmos a um consenso. É um apelo que eu fiz. O que está em jogo é a instituição, que ficará manchada se nós não formos capazes de chegar a esse consenso”, relatou Marco Aurélio.
Talvez resultado da conversa, Lewandowski acabou cedendo. Ontem à noite, em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, o ministro revisor disse que aceitar a metodologia proposta por Joaquim Barbosa o trará uma “dificuldade enorme”. Mas que, como seu ponto de vista foi vencido, vai aderir à posição do relator. O recuo de Lewandowski, porém, não encerra todo o problema. Há outros ministros que também acham que não é conveniente o fatiamento proposto por Joaquim Barbosa. Assim, o mais provável é que, na segunda-feira (20), quando o julgamento retornar, o tema seja posto novamente em discussão. “Não cabe a apreciação de forma homeopática, escolher a quem vai julgar em primeiro lugar e quais as imputações”, considera Marco Aurélio.
Peluso
O problema maior é que, a cada impasse como o de ontem (15), torna-se ainda mais lento o andar de um processo já em si complexo, com seus 37 réus agora, e 96 mil páginas. Ontem (15), os ministros já consideravam que vai ficando cada vez mais remota a possibilidade de o ministro Cezar Peluso dar o seu voto. Ele se aposenta compulsoriamente em 3 de setembro, quando completa 70 anos. Dos 96 votos que Joaquim Barbosa deverá emitir até o fim do julgamento, somente quatro ocorreram no primeiro dia do seu voto. Inicialmente, havia a expectativa de a leitura ocorrer em três sessões. Porém, até mesmo pelas condições físicas do ministro, isso hoje parece improvável. Joaquim deverá levar mais tempo.
Ministros temem risco de empates no mensalão
Questionado ontem, Marco Aurélio, o único ministro da corte a conversar com os jornalistas após a sessão, respondeu laconicamente sobre a probabilidade cada vez maior de Peluso não conseguir votar: “É, é”.
O risco maior acontece agora se seguida a forma sugerida por Barbosa. Peluso pode votar nos primeiros casos e acabar não votando nos outros. “Corremos o risco de termos aí um acórdão capenga”, analisou Marco Aurélio Mello.
A crise
A disputa entre Barbosa e Lewandowski começou em junho, quando em sessão administrativa da corte definiu o cronograma do julgamento do mensalão. Com a iniciativa do relator, apoiado pelo presidente, uma proposta, feita por Celso de Mello, foi à votação. O revisor da ação penal não ficou sabendo da reunião. Tanto que não participou do encontro. Em plenário, chegou a dizer que tem obedecido o cronograma “definido à sua revelia”.
Com o recesso forense, imaginou-se que o clima ficasse mais tranquilo na corte. Porém, em 2 de agosto, primeiro dia de julgamento, Barbosa acusou Lewandowski de “desonestidade”. Isso porque o revisor resolveu acolher uma preliminar apresentada por Márcio Thomaz Bastos, advogado do ex-diretor do Banco Rural José Roberto Salgado, pedindo o desmembramento do processo. O clima esquentou, os ministros trocaram farpas e os colegas agiram para que a situação não piorasse.
Pessoas próximas a Joaquim relatam que, até então, ele não tinha motivos para reclamar da postura de Lewandowski. O que ele se queixa agora é que, durante o período de instrução do processo, Lewandowski nunca conversou com ele a respeito da Ação Penal 470. Para Joaquim Barbosa, se tais conversas tivessem ocorrido, as questões de método que estão surgindo agora poderiam ter sido esclarecidas entre os dois.
Na verdade, essa falta de diálogo entre relator e revisor acontece desde o início no caso do mensalão. No início, o ministro revisor era Eros Grau – Lewandowski só assumiu essa condição após a aposentadoria de Eros Grau, em agosto de 2010. Segundo assessores, Joaquim Barbosa e Eros Grau, da mesma forma, também nunca conversaram sobre o processo.
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