A presidente Dilma Rousseff recorreu a um parecer do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para contestar a denúncia do ex-líder do governo no Senado Delcídio do Amaral (PT-MS) de que tinha conhecimento de ilegalidades na compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. O negócio, aprovado pelo Conselho de Administração da Petrobras, à época presidido por Dilma, gerou prejuízo bilionário à estatal.
Na segunda nota à imprensa divulgada nesta quinta-feira (3), Dilma recorreu ao parecer do PGR, de julho de 2014, que determinou o arquivamento de apuração aberta para averiguar se houve irregularidade na aprovação da compra da refinaria por parte do conselho.
A investigação foi pedida, em março daquele ano, por um grupo de senadores. Em seu parecer, reproduzido por Dilma hoje, o procurador afirma que não é possível “imputar o cometimento de delito de nenhuma espécie” aos integrantes do conselho.
No comunicado, a presidente fez uma defesa técnica da atuação do colegiado e destaca que os seus argumentos foram aceitos pelo procurador-geral da República.
“Rodrigo Janot disse que as informações prestadas pela Presidência ‘afastam a acusação de conduta dolosa ou culposa que possa ser atribuída ao Conselho de Administração da Petrobras de ter dado causa aos prejuízos advindos da referida operação, sendo desnecessário o prosseguimento da instrução’”, diz a nota.
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Em outro trecho de seu parecer, também citado por Dilma, Janot diz que “ainda que esteja diante de uma avença mal sucedida e que importou, aparentemente, em prejuízos à companhia, não é possível imputar o cometimento de delito de nenhuma espécie aos membros do Conselho de Administração, mormente quando comprovado que todas as etapas e procedimentos referentes ao perfazimento do negócio foram seguidos”.
No início da noite, Dilma havia divulgado outra nota à imprensa em que criticava o “vazamento apócrifo e seletivo” de delação premiada ainda não homologada pela Justiça – caso, segundo a revista IstoÉ, do acordo de Delcídio.
Veja a íntegra da segunda nota de Dilma:
“Nota à Imprensa
Esclarecimentos sobre a Refinaria de Pasadena
Por meio do Ofício nº 527 do Gabinete da PGR de 8 de abril de 2014, o Procurador-Geral da República, Senhor Rodrigo Janot Monteiro de Barros, solicitou informações à Senhora Presidenta da República sobre o alegado na Notícia de Fato nº 1.00.000.004878/2014-72. Tratava-se de esclarecimentos sobre a aquisição de participações pela Petrobrás na Refinaria de Pasadena.
Sintetizamos abaixo as principais informações contidas na informação encaminhada à PGR pela Casa Civil da Presidência da República.
AQUISIÇÃO DA PARTICIPAÇÃO INICIAL (50%) NA REFINARIA DE PASADENA APROVADA PELO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA PETROBRAS
- A proposta de realização de uma parceria entre a Petrobras e a empresa belga Astra Oil, por meio da aquisição da participação de 50% das ações da Refinaria de Pasadena, foi levada ao Conselho de Administração da Petrobras na reunião de 03.02.2006 (Ata da reunião n. 1.268 do Conselho de Administração).
- O tema foi submetido ao Conselho de Administração por meio de um Resumo Executivo do negócio e da apresentação “Aquisição da Refinaria de Pasadena”, realizada pelo Diretor Internacional da empresa, Nestor Cuñat Cerveró. Segundo o Resumo Executivo, o objetivo do negócio era:
“Expandir os negócios da Área Internacional nos EUA e agregar valor ao excedente de petróleo Marlim exportado pela Companhia, em alinhamento com os objetivos fixados no Planejamento Estratégico Petrobras 2005-2015.”
- De acordo com o Resumo Executivo e a apresentação “Aquisição da Refinaria de Pasadena”, foram acordadas as seguintes condições de pagamento, para a aquisição da participação na PRSI e na PRSI Trading Company, conforme Resumo Executivo anexo:
Forma de Pagamento | ||
Objeto | Data | Valor (US$) |
50% ações da PRSI | Data do fechamento (2006) | 189.000.000,00 |
Parcela 1 da Trading | 1 ano após fechamento (2007) | 85.142.857,15 |
Parcela 2 da Trading | 2 anos após fechamento (2008) | 85.142.857,15 |
Preço Total | 359.285.714,40 |
- Ainda, segundo o Resumo Executivo:
“Desta forma os pagamentos a serem efetuados, para a citada aquisição, trazidos a Valor Presente @ 6,9% a.a., resultam em um valor total de US$ 343.153.468,17.
Por razões tributárias, ficou acordado que os pagamentos para aquisição dos 50% da Trading Company serão efetuados através de cessão, pela Petrobras, de parte da receita bruta dessa empresa para a ASTRA. A adoção desta forma de pagamento resultará em um ganho tributário de, aproximadamente, US$ 21 milhões.”
- O Resumo Executivo evidencia, ainda, que:
“O processo de negociação e ‘due diligence’ contou com a participação das áreas corporativas da Companhia (Jurídico, Tributário, SMS, Contabilidade).
A estrutura de negociação, incluindo o preço, também foi analisada pelo CITIGROUP que avaliou satisfatoriamente as condições da transação proposta através de uma ‘Fairness Opinion’.”
- O Conselho de Administração da Petrobras decidiu, por unanimidade, autorizar a realização da parceria, “nos termos do Resumo Executivo”, conforme se depreende da Ata da reunião nº 1.268 do Conselho de Administração:
“O Conselho de Administração autorizou a Petrobras, nos termos do Resumo Executivo relativo à matéria, a: a) adquirir, por intermédio da Petrobras America Inc. – PAI, 50% dos bens e direitos da Pasadena Refining System Inc. – PRSI; e b) participar, através da PAI, com 50% na PRSI Trading Company, LP, empresa a ser constituída.”
- À época, o Conselho de Administração era composto pelos seguintes membros: Dilma Vana Rousseff, Antonio Palocci Filho, Cláudio Luiz da Silva Haddad, Gleuber Vieira, Fabio Colletti Barbosa, José Sérgio Gabrielli Azevedo, Arthur Antonio Sendas, Jaques Wagner e Jorge Gerdau Johannpeter, sendo que os últimos três não estavam presentes à referida reunião de 03.02.2006, mas acompanharam o desenrolar do processo de aquisição ao longo do período de seu mandato no Conselho.
- Conforme se percebe, dentre os membros do Conselho estavam renomados economistas e empresários, com amplo prestígio e experiência no mercado, sem qualquer vinculação com o Governo federal. São os casos de Fábio Colletti Barbosa, ex-presidente Executivo da Abril SA e ex-presidente do Grupo Santander Brasil, do Banco Real e da Federação Brasileira dos Bancos; de Cláudio Luiz da Silva Haddad, atual presidente do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, membro do Conselho de Administração do Grupo Abril, do Conselho de Administração da BM&F Bovespa, da Ideal Invest S.A., do Instituto Unibanco; e de Jorge Gerdau Johannpeter, empresário e presidente do Grupo Gerdau. Além de votarem pela autorização do negócio na reunião do Conselho de Administração, esses experimentados homens de negócio reafirmaram recentemente seu entendimento de que a operação estava alinhada com a estratégia geral da Petrobras naquele momento.
- Verifica-se, portanto, que a decisão de autorização da compra da Refinaria da Pasadena foi tomada por unanimidade no Conselho de Administração – incluindo a participação de membros com amplo conhecimento de mercado e habituados a grandes investimentos. A decisão do Conselho estava alinhada com o Plano Estratégico Petrobras 2015 e seguiu os procedimentos regulares previstos no Estatuto Social da empresa.
AQUISIÇÃO DAS AÇÕES REMANESCENTES DA REFINARIA PASADENA
- Em 03.03.2008, a Diretoria Executiva da Petrobrás submeteu ao Conselho de Administração a proposta de aquisição dos 50% remanescentes das ações da Refinaria de Pasadena. Conforme a Ata da reunião n. 1.301, o “Conselho de Administração resolveu determinar a reapresentação da matéria com informações complementares do projeto em tela.”
- O tema volta à pauta na reunião de 12.05.2008 e, segundo a Ata da reunião n. 1.303, o “Conselho resolveu transferir a decisão para a próxima reunião”.
- Novamente, em 20.06.2008, a questão da aquisição dos 50% restantes das Ações da Refinaria de Pasadena volta ao Conselho de Administração da Petrobras. Nesta reunião, a Diretoria Executiva informou ao Conselho que:
“em 2006, quando da submissão ao Conselho de Administração da compra da participação na Refinaria de Pasadena, não constou do resumo executivo apresentado a informação sobre a Cláusula de Marlim, de garantia de rentabilidade da refinaria em favor da ASTRA, condição que foi oferecida na negociação como contrapartida para que fosse aceito pela Astra que a refinaria, após o ‘revamp’, passasse a processar setenta por cento de seu óleo processado por óleo fornecido pela Petrobras. O teor da ‘Cláusula Marlim’ não foi objeto de aprovação pelo Conselho de Administração quando da sua análise com vistas à aprovação da compra de participação na Refinaria de Pasadena.” (Ata da reunião n. 1304 )
- É de se registrar que, em verdade, o referido Resumo Executivo não fazia qualquer referência a duas importantes cláusulas do contrato que formalizou a parceria entre a Petrobras e a Astra Oil: a cláusula Marlim e a cláusula put option.
- Em decorrência disso, a própria Diretoria Executiva na mesma reunião informa ao Conselho que apuraria os impactos dessa omissão e eventuais responsabilidades, nos seguintes termos:
“por outro lado, considerando essa ausência de pronunciamento do Conselho sobre o tema (compra dos 50% das ações remanescentes), a Diretoria Executiva comunicou sua intenção de identificar se os termos de tal cláusula entraram efetivamente em vigor, se foram aplicados em algum momento e também avaliar os eventuais impactos, prejuízos e responsabilidades dela decorrentes.” (Ata da reunião n. 1304)
- A cláusula Marlim, que não havia sido informada ao Conselho de Administração da empresa, assegurava uma rentabilidade mínima de 6,9% à Pasadena Refining System Inc. – PRSI, desde que fosse realizada a adaptação da refinaria para processar o óleo pesado brasileiro.
- A cláusula put option foi inserida em favor da Astra Oil, para a saída do negócio, sem o conhecimento do Conselho de adminitração. Assim, no caso de impasse insuperável entre os sócios, a Astra Oil poderia, exercendo a cláusula put option, sair da sociedade, em condições não informadas ao Conselho.
- A existência da cláusula de “put option” em si não é fato inédito em negócios do gênero, mas suas condições e impactos são específicos a cada contrato, devendo ser analisadas caso a caso. A relevância da cláusula put option implicaria que esta fosse devidamente informada ao Conselho de Administração, por meio do Resumo Executivo, o que não ocorreu na espécie.
- Em síntese, como se evidencia pelo acima exposto, o Conselho de Administração não teve conhecimento sobre as referidas cláusulas e não autorizou a aquisição voluntária da participação dos 50% restantes das ações da Refinaria de Pasadena.
O PROCESSO DE ARBITRAGEM
- Nesta mesma reunião de 20.06.2008, a Diretoria Executiva informou ao Conselho que:
“instruiu seus advogados nos Estados Unidos a dar entrada em processo arbitral, o que já foi feito, com base nas regras da American Arbitration Association, contra as empresas do grupo Astra, tendo em vista o comportamento que vem sendo adotado por aquelas empresas no sentido de não manterem o cumprimento de suas obrigações como acionistas, se escusando de suportar a atuação da Refinaria de Pasadena e a atividade de comercialização correspondente.” (Ata da reunião n. 1304)
- Em 30.07.2009, segundo a ata da reunião n. 1.320, após decisão final da Câmara de Arbitragem, a Diretoria Executiva apenas levou ao conhecimento do Conselho de Administração sua decisão de:
“dar prosseguimento aos processos em curso do contencioso Pasadena contra o grupo ASTRA, sob as seguintes condições: a) o cumprimento do laudo arbitral ficará sujeito à determinação judicial ou à assinatura de termo de acordo que assegure a transferência dos 50% de ações remanescentes, com o devido resguardo dos interesses da Petrobras America Inc. – PAI e demais empresas do Sistema Petrobras, com a plena quitação quanto a esse negócio; e b) sujeitar quaisquer outros pagamentos a decisões judiciais irrecorríveis.”
CONCLUSÕES
1 – Fica demonstrado que a decisão adotada pelo Conselho de Administração de compra de 50% das ações foi baseada nas informações do resumo executivo, conforme demonstram as atas.
2 – A aquisição da participação acionária inicial foi em 2006 e a proposta de aquisição das ações remanescentes ocorreu em 2008.
3 – O Conselho de Administração somente no ano de 2008 foi informado pela diretoria executiva que todas as informações necessárias não tinham sido devidamente fornecidas quando da decisão em 2006.
4 – O Conselho de Administração era integrado por empresários e experts de mercado assim como ministros do Governo.
5 – Fica claro que o Conselho de Administração não tinha como ter conhecimento dos fatos e, portanto, agiu inteiramente dentro da legalidade.
POSIÇÃO DA PROCURADORIA
O Procurador reconheceu na resposta que o Conselho “não foi adequadamente informado acerca do conteúdo do contrato, pois os mencionados documentos indicavam a regularidade da instrução do feito, inclusive no tocante ao preço, justificado na análise satisfatória de renomada empresa do mercado financeiro”.
“Ainda que esteja diante de uma avença mal sucedida e que importou, aparentemente, em prejuízos à companhia, não é possível imputar o cometimento de delito de nenhuma espécie aos membros do Conselho de Administração, mormente quando comprovado que todas as etapas e procedimentos referentes ao perfazimento do negócio foram seguidos”, avaliou Janot.
Rodrigo Janot disse que as informações prestadas pela Presidência “afastam a acusação de conduta dolosa ou culposa que possa ser atribuída ao Conselho de Administração da Petrobras de ter dado causa aos prejuízos advindos da referida operação, sendo desnecessário o prosseguimento da instrução”.
O Procurador destacou, no entanto, que “salta aos olhos que as mencionadas cláusulas contratuais, que impunham obrigações de grande monta para a Petrobrás tenham sido omitidas do Resumo Executivo e da apresentação realizada para o Conselho de Administração” e que o caso seguirá sob apuração nos “órgãos de controle competentes”.
Secretaria de Imprensa
Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República”
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